terça-feira, 24 de junho de 2008

UNIÃO OU DESUNIÃO?



O resultado negativo do referendo irlandês à proposta do “Tratado de Lisboa” está a provocar ondas de choque de grande impacto no seio da Comissão e nos países de maior dimensão da União Europeia, para além de Portugal, mas esse compreende-se por causa da designação do Tratado.

As razões dos irlandeses para o seu voto maioritário são de ponderar, concordemos ou não com eles.

A ideia que alguns pretendem passar de que o não irlandês tem a ver com ignorância relativamente ao “Tratado” é simplesmente insuportável. Desde logo porque antidemocrática e arrogante. Depois porque raramente alguns eleitores terão sido tão bombardeados com informação exaustiva sobre aquilo que iam ou não aprovar: nenhum votante irlandês deixou de receber em casa montes de papeis enviados pelo seu Governo com toda a informação possível e apelando ao sim.

Também a posição de que os irlandeses não podiam votar contra o Tratado por terem beneficiado como nenhuns outros dos apoios da União devia ter ficado na gaveta porque estúpida e insultuosa para os irlandeses. Outros países receberam idêntico apoio e não conseguiram melhorar. Basta olhar para nós portugueses para perceber isso. Quem fez pela vida foram os irlandeses que aproveitaram os apoios da melhor maneira e beneficiaram a economia em vez de construírem auto-estradas ao lado umas das outras e TGVs. De certeza que não andam a planear enterrar comboios como agora se quer fazer em Lisboa à custa de todos nós e do progresso da economia nacional.

Já anteriormente os franceses e os holandeses rejeitaram a anterior “Constituição” em 2005 e ninguém pensou em obrigá-los a votar de novo sucessivamente até a aprovarem ou então em correr com eles da União. Não faz sentido pensar nestas hipóteses relativamente aos irlandeses.

Aliás, muito do nosso futuro na União joga-se agora. A forma como a União resolver esta questão com um país pequeno como a Irlanda dará indicações claras de como seremos nós próprios tratados no futuro, quando acharmos que a União não está a tratar devidamente dos nossos interesses.

A União precisa de facto de encontrar processos de funcionamento. No entanto, há muitos especialistas que provam que o caminho proposto não é o único e que, por mais estranho que possa parecer perante a barragem de propaganda da Comissão, a União até tem funcionado de forma bastante razoável a 27 sem existir o Tratado. Isto é tão verdade, que o Tratado até prevê que os novos processos de decisão só entrem em vigor lá apara 2014 e 2017. É claro que há aqui histórias muito mal contadas.

Aliás, os objectivos definidos na cimeira de Laeken há quase sete anos, notoriamente não são atingidos com o texto do “Tratado de Lisboa”. Além de ser difícil de compreender, não clarifica a distribuição de poderes e não simplifica as regras de forma a tornar a União mais transparente e trazê-la para mais perto dos cidadãos.

Em vez de pressionar ilegitimamente os irlandeses, a União deveria considerar o “Tratado de Lisboa” morto, enterrá-lo e seguir em frente, reformando sectorialmente o que precisa de ser reformado para funcionar e propondo uma reorganização geral mais simples e compreensível por todos os cidadãos europeus.

1 comentário:

Fernando disse...

Mais uma vez, caro João Paulo, os meus parabéns pela lucidez e, acima de tudo, pela sensatez. São necessárias mais vozes como a tua que digam muito claramente que cada Povo da União tem direito a dizer "NÃO". Se o sim se tornar obrigatório o melhor é deixarmo-nos de palhaçadas e não continuarmos a achar que a UE é o paladino da Democracia.
É que a nós pouco nos falta para a ditadura da Globalização e do Capital. Para não nos passarem coisas pela cabeça parecidas com as dos Irlandeses, nem sequer nos perguntam nada. Come e cala que para isso as mentes iluminadas foram eleitas.É que não vá o diabo tecê-las e repetir-se uma má experiência como aquela do 1º referendo da liberalização do aborto. Mas calma senhores da Europa, nada como insistir.Tantas vezes vai o cântaro à fonte ...