segunda-feira, 3 de novembro de 2008

O nosso grande problema



As questões da vida quotidiana, particularmente em épocas de dificuldades económicas acrescidas como a que atravessamos, fazem muitas vezes que os problemas de fundo passem despercebidos, por mais graves que sejam. Claro que essa espécie de cegueira vem mais tarde a pagar-se com juros elevados.
A evolução demográfica que está em curso no nosso país desde há três décadas é de tal forma grave que deveria estar no centro das decisões políticas e sociais dos responsáveis aos diversos níveis.
De facto, o Instituto Nacional de Estatística (INE) tem vindo a publicar dados e relatórios que deveriam merecer muito mais atenção do que as habituais tomadas de posição decorrentes da celebração anual do “Dia da População”
Desses dados mais recentes ressalta que no ano de 2007, pela primeira vez desde o ano em que começaram as primeiras séries cronológicas do INE (1900), morreram mais pessoas no nosso país do que as que nasceram, isto sem haver guerra, assinale-se.
É um momento altamente significativo da evolução demográfica que deve ser conhecido de todos nós, para que tomemos plena consciência do que se passa.
O INE já havia avisado em 2006 que o índice sintético de fecundidade em Portugal (que traduz o número médio de crianças, nascidas vivas, por mulher em idade fecunda, isto é, dos 15 aos 49 anos de idade) passara a ser de 1,36 crianças por mulher.
Dizem as estatísticas que para haver renovação das gerações este índice de fecundidade deve ter o valor mínimo de 2,1 filhos por mulher.
Esta evolução trágica do índice de fecundidade resulta de que as mulheres residentes em Portugal têm agora menos filhos e mais tarde.
Existem razões objectivas para esta evolução que são culturais, sociais e económicas e resultam directamente da organização social que tem sido adoptada em Portugal nas últimas décadas. Claro que esta tendência é comum aos restantes países europeus, só que entre nós a evolução é muito mais grave porque partiu do valor mais alto em toda a Europa do índice de fecundidade nos anos 70, para o valor mais baixo na actualidade.
Por outro lado, e felizmente, a longevidade da população portuguesa tem vindo a aumentar, fruto da melhoria das condições de vida e dos extraordinários avanços da medicina das últimas décadas. A esperança média de vida à nascença dos portugueses era em 1988 de 73,8 anos. Esse valor subiu para 78,5 anos em 2006 isto é, aumentou em quase 5% em escassos oito anos.
O problema demográfico é a situação decorrente da conjugação destas duas evoluções que é uma verdadeira bomba relógio social.
Na realidade, o índice de envelhecimento da população atingiu em 2006 o valor de 112 idosos por cada 100 jovens, quando era de 56 idosos por cada 100 jovens em 1987.
Não é preciso ser um grande matemático para perceber onde vai acabar esta tendência suicida dentro de 20 ou 30 anos, se não houver imediatas alterações profundas na organização da nossa sociedade que valorizem a maternidade e permitam inverter a evolução do índice de fecundidade.

Publicado no Diário de Coimbra em 3 de Novembro de 2008

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