segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

CONHECER A CRISE


A crise que presentemente assola as economias de todo o mundo apresenta-se com várias facetas que a tornam única, e muito difícil de enfrentar.
Desde logo, duas características a distinguem:
- a escassez de crédito financeiro e
- a retracção no consumo.
A escassez de crédito financeiro ocorreu como consequência directa da “loucura” que varreu a banca de investimento, criando uma bolha especulativa. Esta, ao esvaziar-se, deixou activos nos balanços dos bancos comerciais que não valem, nem de perto nem de longe, os valores por que foram comprados: são os chamados activos tóxicos. Em consequência, os bancos têm muita dificuldade em emprestar dinheiro entre si e em financiar-se para garantir dinheiro para novos projectos, seja de empresas, seja de particulares. Praticamente todos os países têm ensaiado soluções em resposta, que passam por prestar garantias do Estado aos bancos, ou mesmo por nacionalizações pontuais. Até agora, estas acções não têm conseguido os resultados pretendidos, porque os “activos tóxicos” permanecem nos balanços, continuando a contaminar as contas. Fala-se agora em criar “bancos negros” para depositar esses activos, e assim limpar os balanços dos bancos. Como é evidente, não se encontram interessados para pagar essa conta, que mais cedo ou mais tarde iria cair nos Estados, e desta forma ser indirectamente paga pelos impostos dos contribuintes.
O outro aspecto desta crise, que ocorre em simultâneo com o anterior, tem a ver com o retraimento do consumo, que se verifica em todo o mundo. Em parte pelo medo do desemprego, em parte por pura reacção face às más notícias, o consumo caiu a pique por todo o mundo. Muitas fábricas viram a sua procura diminuir drasticamente, sendo levadas à falência ou diminuição da produção. O efeito de bola de neve é óbvio: provocam subidas trágicas do desemprego, e este retrai ainda mais o consumo já diminuído. Para além de um acréscimo nas prestações sociais, os Estados vêem-se na necessidade de apoiar activamente o emprego, através de apoios às empresas e de planos de obras públicas. Não é fácil a decisão, porém: tudo isto tem de ser bem pensado, para evitar que essa despesa pública venha a ser um entrave à recuperação económica, quando a crise passar. Para usar a expressão inglesa, convém não deitar fora o bebé, juntamente com a água do banho.
Para além da sua globalidade, é a conjugação destes aspectos que dá à actual situação uma gravidade excepcional e atrasa a recuperação. É urgente que, perante estas dificuldades extremas, seja possível encontrar uma base mínima de entendimento entre os responsáveis que partilham os mesmos valores de sociedade. De facto, embora como sempre embrulhadas nas melhores intenções, já se perfilam no horizonte as “soluções mágicas” que a História do século XX mostrou serem a porta para as maiores desgraças da Humanidade.

Publicado no Diário de Coimbra em 16 de Fevereiro de 2009

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