segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

(In)dependências

O facto de Portugal ser membro de pleno direito da União Europeia não nos deve fazer esquecer que somos igualmente um país com uma longa História de independência política, e que o primeiro dever dos nossos responsáveis é para com os portugueses.
As políticas comunitárias são, em teoria, boas para a Comunidade, o que não significa que sejam todas vantajosas para nós. Por isso mesmo, não podemos prescindir de duas coisas: em primeiro lugar, garantir que as políticas comunitárias sectoriais não nos prejudicam; em segundo lugar, evitar que as políticas internas não secundarizem o nosso próprio desenvolvimento económico relativamente à UE.
Olhando para os sectores agrícola e pecuário, é evidente que a taxa de cobertura das nossas necessidades é cada vez menor, contribuindo este sector de forma pesada para o défice das nossas contas externas. A diferença entre o que importamos e o que exportamos, em termos de alimentos e bebidas (incluindo carne, peixe, leite, ovos e mel), atingiu nos primeiros dez meses de 2008 o valor de 4.487 milhões de euros. No mesmo período, o défice total das nossas contas externas atingiu o montante de 13.900 milhões de euros; a parte referente aos alimentos absorve uma parcela de 32% daquele défice. Até nas pescas, sector em que tradicionalmente produzíamos o que necessitávamos e ainda conseguíamos exportar, se verificou naquele período um défice de 714 milhões de euros, o que diz bem das consequências do abate da nossa frota pesqueira, promovido e pago pela União.
Isto é, aquilo que todos vemos ao percorrer o país, o progressivo abandono do interior e das terras de agricultura, tem consequências terríveis em termos da nossa sustentabilidade económica. Claro que se olharmos para a Europa, só a Alemanha e a Polónia produzem o suficiente para alimentar todos os países da União. Compreende-se bem que estes países façam os possíveis para proteger a sua produção, baixando as quotas dos restantes. Nós é que não podemos deixar-nos ir nessa cantiga, devendo, isso sim, proteger o mais possível a nossa auto-sustentação em termos alimentares.
Acresce que o abandono das terras tem graves implicações na falta de equilíbrio da ocupação do território, com um crescimento exagerado das áreas metropolitanas, particularmente de Lisboa, e da desestruturação social inerente.
Está à vista de todos o resultado de mais de 20 anos de aceitação de subsídios europeus que se traduziram na destruição da nossa agricultura e da frota pesqueira. Tendo nós a maior ZEE da Europa, temos hoje em dia que importar a maior parte do peixe que consumimos, o que não deixa de ser espantoso.
Pugnar pela maior auto suficiência possível em termos alimentares, não é sinónimo de patriotismo serôdio ou de anti-europeísmo, mas de pura sensatez perante a possibilidade de crises como a que actualmente atravessamos.
Para além das discussões sobre a distribuição de verbas comunitárias, importa definir uma estratégia clara de recuperação da capacidade de produção agrícola e pecuária que nos permita obter um grau de independência mínimo.

Publicado no Diário de Coimbra em 9 de Fevereiro de 2009

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