segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

CHAVISMO



Esse auto-proclamado farol do socialismo (no caso, adjectivado de bolivariano) que se chama Hugo Chávez continua na sua senda de mostrar ao mundo “novos” caminhos de governação e de comunicação dessa governação.

A fim de garantir que o povo venezuelano conheça permanentemente aquilo que ele pensa e que está a fazer ou a preparar, criou uma nova estação de rádio para transmitir os seus discursos. Quando apresentou essa estação, informou o povo de que às primeiras notas deve prestar atenção, porque Chávez vai falar à nação, nem que tal aconteça às três da manhã!

Esta novidade é apenas a continuação do condicionamento informativo que, de forma obsessiva, Hugo Chávez tem construído para calar as vozes da oposição e obrigar os meios de comunicação social a transmitirem integralmente o que ele diz: assim, vai construindo uma verdade única que, na realidade, mantém grande parte do povo venezuelano na absoluta ignorância do que realmente se passa no seu país.

Foi desta forma que, nos finais do passado mês de Janeiro, a estação de televisão RCTV que operava por cabo foi finalmente fechada. E foi encerrada por motivos legais, que hoje em dia estas coisas não se fazem do pé para a mão: primeiro arranjam-se uns regulamentos, e depois obriga-se a cumprir. No caso concreto, a estação RCTV não cumpriu a obrigação de transmitir todos os discursos presidenciais em directo, na íntegra. Refira-se que esta estação de televisão já só tinha licença para transmitir por cabo, porque há três anos deixou de poder transmitir em sinal aberto por ser declaradamente oposicionista a Chávez. Lembro-me bem de nessa altura vários comentadores e políticos portugueses terem desculpado essa atitude do admirado Chávez argumentando com o tal incumprimento de regras legalmente estabelecidas.

Levando muito a sério o seu papel de continuador do socialismo, Chávez declarou-se finalmente marxista no início do ano. E desde logo proclamou que algumas minudências (certamente muito burguesas, acrescentarei eu) deixaram de fazer sentido na Venezuela, porque apenas enfraquecem o Estado, como logo esclareceu a Presidente do Supremo Tribunal. Entre essas minudências, conta-se a separação dos poderes legislativo, executivo e judicial.

Em conformidade com tudo isto, Chávez ensina agora ao povo que o lucro privado é a estrada de todos os demónios. E o seu partido, o Partido Socialista Unido, prepara-se para acabar com o poder local eleito, substituindo-o por “comunas”.

Claro que, como pano de fundo de tudo isto, avança o desmantelamento de toda a economia venezuelana, com o empobrecimento geral da população. Estamos a falar de um país que está praticamente sobre um lago de petróleo e que, mesmo assim, não consegue manter níveis mínimos de prosperidade.

Chegou-se mesmo, nos últimos dias, a ter que racionar a energia eléctrica de forma radical, ameaçando com penas pesadas quem não cumpra os regulamentos do racionamento. Isto num país que é dos maiores exportadores de energia do mundo.

As consequências dos disparates da governação de Chávez vão ao ponto de se ter visto obrigado a desvalorizar a moeda (bolívar) em cinquenta por cento, embora tenha chamado essa medida de “ajustamento da taxa de câmbio” tentando evitar a ida maciça aos armazéns. Claro que foi mesmo isso que sucedeu de forma instantânea em todas as lojas de aparelhos domésticos importados. Inventou ainda uma coisa esperta, que é uma dupla paridade do bolívar, através da qual determinados produtos de primeira necessidade são importados a uma cotação de 2,6 bolívares dor dólar e os outros produtos a 4,3 bolívares por dólar.

Tudo isto num esforço desesperado de aumentar o valor das exportações, isto é, do petróleo vendido ao exterior que, infelizmente para ele, está hoje em dia a uma cotação muitíssimo abaixo dos valores alcançados na fúria especulativa do início da actual crise internacional.

É por causa deste desgraçado quadro geral que Chávez mantém mão pesada na comunicação social, sabendo bem que no dia em que o povo venezuelano conhecer a situação concreta do país, terá o seu destino traçado - e não será certamente do seu agrado pessoal.

Publicado no Diário de Coimbra em 15 de Fevereiro de 2010

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