segunda-feira, 9 de setembro de 2013

A SÍRIA AQUI TÃO PERTO




A única arma de guerra que o mundo proibiu até hoje é a química. O sentimento de rejeição que provoca é tão grande que a “Convenção de Armas Químicas” que as Nações Unidas fizeram entrar em vigor em 1997 não só proíbe a sua utilização, como também a sua produção e comércio. A lembrança do horror sucedido na 1ª Guerra Mundial na sequência de Ypres perdura ainda na memória colectiva dos povos. Curiosamente, mesmo Hitler jamais utilizou o seu poderoso armamento químico em batalha, talvez por ele próprio ter sido gaseado na 1ª GG (embora o tenha amplamente utilizado nos campos de concentração). Desde então, a utilização desse tipo de armas tem sido extremamente rara: Os japoneses usaram-nas na China na 2ª GG e o Iraque contra o Irão e os Curdos na década de 80.

Talvez por estas razões o presidente americano Barack Obama avisou a Síria em Agosto de 2012 de que a utilização de armas químicas seria a passagem da linha vermelha que levaria a uma intervenção americana. Isso aconteceu agora, tudo levando a crer que o regime sírio utilizou armas químicas contra os rebeldes numa zona residencial nos arredores de Damasco, provocando a morte a mais de 1.000 moradores, incluindo muitas crianças.
A guerra civil na Síria já provocou mais de 100.000 vítimas e 2 milhões de refugiados que vivem actualmente em campos em países vizinhos. O mundo inteiro tem assistido a mais esta guerra civil, sem nada fazer para terminar com ela. Antes pelo contrário, a comunidade internacional tem-se dividido no apoio aos dois contendores. Enquanto o regime de Bashar al-Assad tem o apoio político e militar da Rússia e da China, os rebeldes têm o apoio de países árabes como a Arábia Saudita e o Qatar, para além da compreensão do Ocidente. Mas os rebeldes, que contavam com apoio directo ocidental, à semelhança do sucedido noutros casos da primavera árabe, não o têm tido, o que tem levado à sua crescente islamização e condução dos combates por extremistas. A autêntica selvajaria da actuação dos rebeldes amplamente documentada em fotografias e filmes indescritíveis virá muito daí, sendo evidente que um novo regime sírio saído duma sua hipotética vitória quase transformaria Bashar Assad num saudoso humanista.
Mas o presidente sírio cometeu de facto crimes de guerra e contra a Humanidade ao utilizar armas de destruição maciça e, se algum líder actual merece castigo severo da comunidade internacional, é certamente ele.

 Se a ONU não toma a decisão de constituir uma força militar com os países que a ela aderirem para solucionar pela força o problema sírio, só resta uma solução, que é a de julgar Bashar Assad no Tribunal Penal Internacional na Haia, que foi criado para isso mesmo. Na última intervenção internacional numa guerra civil, que ocorreu na Bósnia, as Nações Unidas mostraram-se também inoperantes e incapazes de resolver o problema; dessa vez, no coração da Europa, foi a NATO que resolveu militarmente o problema. Na Síria a questão é muito diferente e trata-se do Médio Oriente que traz sempre agregada a questão do petróleo. O envio de mísseis que certamente não atingirão directamente Bashar Assad, terá grandes probabilidades de desencadear a explosão de um conflito regional com possíveis consequências a nível mundial. Antes disso, Barack Obama deverá usar as suas palavras de há um ano como argumento forte à mesa do Conselho de Segurança para pressionar Rússia e China a participar numa solução para a Síria.
Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 9 de Setembro de 2013

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