segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

CONFIANÇA NOS POLÍTICOS


Estou certo que não chocarei ninguém ao afirmar que a política e os políticos sofrem de uma das maiores crises de confiança de que há memória, entre nós. Muitas razões contribuem para isso, algumas de fundo e outras que têm a ver com as características da vida actual. Já o humorista Rafael Bordalo Pinheiro representava a política como uma porca a amamentar muitos bácoros, o que mostra que a má ideia que os portugueses têm dos políticos não é dos dias de hoje. Haveremos no entanto de convir que já era tempo de essa situação se ter alterado, o que não é manifestamente o caso. Nos dias de hoje a internet com as suas redes sociais ajuda a manter essa má imagem, às vezes com razão, mas frequentemente sem nenhuma. O imediatismo das respostas, a superficialidade das análises e uma boa dose de anonimato mal-intencionado ajudam aos velhos comentários que não acrescentam nada às soluções para os problemas: “isto é uma vergonha”, “eles são todos iguais” e “eles andam todos ao mesmo”.
A sensação de separação entre a vida política e o resto do país vai-se ampliando e a organização política, bem como o funcionamento dos partidos (da esquerda à direita) não contribuem em nada para melhorar a situação.
Um exemplo: o leitor, que sei ser uma pessoa interessada e preocupada com os destinos do país, sabe quem são os deputados eleitos pelos partidos no seu círculo eleitoral, no caso, o de Coimbra? Atrevo-me a apostar que não sabe e, mais significativo, provavelmente não conseguirá sequer identificar com precisão os deputados do partido a que deu o seu voto. Claro que também não fará a mínima ideia dos critérios que ditaram a escolha dos nomes que integraram as listas e, pior, deverá desconhecer por completo o trabalho que têm ou não produzido na Assembleia da República desde que foram eleitos, pelo que em próximas eleições não terá quaisquer hipóteses de avaliar esse trabalho com consciência e seriedade.
Nos últimos dias, felizmente, têm vindo para a discussão pública algumas ideias sobre reformas da lei eleitoral, que em parte eu próprio já aqui defendi nestas linhas, por mais que uma vez. Uma das propostas contempla a criação de um círculo nacional que escolheria 100 deputados e 115 círculos uninominais, para além dos círculos da Madeira, dos Açores e da Emigração. O círculo nacional permitiria a entrada no Parlamento de representantes de partidos com pequena percentagem, o que não acontece hoje, com a vantagem de surgirem na Assembleia da República outras vozes e opiniões, assegurando uma melhor representação do sentir dos portugueses. Quanto aos círculos uninominais, seriam possíveis as candidaturas independentes, possibilitando a escolha de candidatos que valham por si próprios, que as populações conheçam e em quem tenham confiança.
Claro que os partidos maiores teriam a vida dificultada, em particular as distritais por onde passam hoje as escolhas dos candidatos a deputados, com negociações completamente estranhas aos interesses das populações e favorecendo os amiguismos e outras dependências, tantas vezes inconfessáveis. Ver-se-iam obrigados a escolher candidatos credíveis, que não tenham feito toda a carreira dentro das comissões políticas e nada dizendo ao cidadão comum para quem os seus representantes têm é que resolver os problemas da sociedade. Uma alternativa interessante será dar aos eleitores a possibilidade de ordenar os eleitos do seu círculo, de acordo com as suas preferências, sem ter que votar em listas fechadas.
Curiosamente, parece até que uma alteração às leis eleitorais deste tipo nem precisaria de uma Revisão Constitucional. Claro que não se vê os actuais detentores do poder dentro dos partidos a promoverem por si uma alteração destas. Resta-nos a nós, cidadãos comuns militantes ou não de partidos, mas com consciência da situação actual, fazer tudo para que essa alteração seja de alguma forma imposta pela sociedade aos partidos.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 13 de Janeiro de 2014

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