segunda-feira, 9 de junho de 2014

As eleições Europeias



Eu sei que não parece, mas convém lembrar que no passado dia 25 de Maio houve eleições europeias, isto é, para o Parlamento Europeu. Por isso é muito importante perceber as consequências dos resultados deste acto eleitoral para o futuro da União Europeia a que pertencemos, já que se reflectirá necessariamente no nosso próprio futuro.
Claro que as eleições europeias têm também uma importância política nacional em todos os países e isso está bem à vista nas repercussões que os resultados nacionais tiveram e estão a ter na nossa vida política. As perspectivas que as sucessivas sondagens foram criando e a subida da parada por parte de alguns chocaram de frente com os resultados concretos. Por isso mesmo o líder do partido Socialista foi de imediato confrontado com um desafio interno à sua liderança; percepcionou-se que a votação obtida foi resultado das suas próprias opções estratégicas para estas eleições, claramente mal acolhidas pelo eleitorado, ainda por cima ao fim de três anos de uma austeridade fortíssima levada a cabo pelo Governo na aplicação do PAEF assinado com a troika. Pelo seu lado, o Governo viu a coligação que o suporta ter uma votação abaixo dos 20%, resultado fraco que nem a reduzida margem face ao principal partido da oposição consegue fazer apagar. O Bloco de Esquerda reduziu a sua representação europeia em 2/3, elegendo apenas Catarina Martins, enquanto o Partido da Terra com Marinho Pinto como bandeira elegeu dois deputados de uma assentada, surpreendendo tudo e todos. O PCP, mais uma vez através da sua já clássica coligação conseguiu, certamente pela sua linguagem anti EU e anti Euro, absorver descontentamento e aumentar a sua representação no PE em um deputado. Não valerá muito a pena analisar transferências de votos entre formações partidárias, que servem sempre para justificar isto e o seu contrário. Importante é relevar a elevada abstenção de cerca de 2/3 do eleitorado. Seja para marcar uma posição “contra o sistema”, seja por alheamento face às questões europeias, este é um nº verdadeiramente significativo.
Mas eleições europeias merecem sobretudo uma análise a nível europeu. A maior alteração verificada na distribuição dos lugares no Parlamento Europeu consistiu numa diminuição do total de deputados dos grupos claramente pró-europeus que são o PPE (Partido Popular Europeu), S&D (Socialistas e Democratas), ALDE (Liberais) e Greens (Verdes) cuja percentagem em bloco desceu de 79% para 69%. Como se verifica, apesar de importante como eventual tendência para futuro, a mudança não está perto sequer de significar uma alteração profunda da situação, até porque os chamados euro-cépticos estão fraccionados numa série de pequenos agrupamentos com pouco ou mesmo nada de comum entre si além de serem contra a UE e o Euro. Claro que, apesar de reduzida dimensão europeia, esses agrupamentos incluem partidos nacionais que falam muito alto e fazem muito barulho como a Frente Nacional francesa, os gregos Syrisa (esquerdista) e Golden Dawn (neo-Nazi), o britânico UKIP ou o dinamarquês DPP. As expressivas votações obtidas por estes partidos constituem assim, mais um problema nacional para cada um dos seus países do que propriamente um problema europeu, embora seja previsível que as percentagens que agora alcançaram se devam em grande parte à elevada abstenção generalizada destas eleições. De qualquer forma, houve seis países em que a votação nos euro-cépticos foi muito relevante, isto é, entre os 20% e os 40%: Grécia, Grã-Bretanha, Itália, Dinamarca, França e Áustria.
Deve ser salientado que a tentativa de transformar estas eleições para o Parlamento Europeu numa espécie de eleição do futuro Presidente da Comissão como se fosse um primeiro-ministro falhou redondamente. A indicação de Jean Claude Juncker como futuro presidente da Comissão por parte do Partido Popular Europeu encalhou na oposição frontal do primeiro ministro britânico David Cameron e a própria chanceler alemã Ângela Merkel não garante o seu apoio ao luxemburguês.
Entre as competências do Parlamento Europeu não está a escolha da Comissão, mas pode de facto reprovar os nomes que o Conselho apresentar. E o Tratado de Lisboa obriga, pela primeira vez, a que a escolha do Conselho tenha em conta os resultados das eleições. Para bem de todos nós, façamos votos para que, ao menos desta vez, os responsáveis europeus tenham bem em conta os resultados destas eleições e correspondam aos sinais enviados pelos cidadãos europeus.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 9 de Junho de 2014


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