segunda-feira, 20 de abril de 2015

Construir a Paz



Há quem pense que a paz é a ausência de guerra. No entanto, pode-se estar num determinado momento a gozar a paz, enquanto alguém prepara afanosamente uma guerra inevitável, tal como o fim das guerras visíveis não significa que se entre em paz. Do conhecimento de que a realidade é mesmo assim, duas conclusões se costumam tirar. A primeira é que, se queremos a paz, temos que estar preparados para a guerra; mesmo quando adormecemos numa paz tranquilizadora que nos leva a diminuir os gastos militares, o melhor é ter aliados que nos garantam apoio, no caso de virmos a necessitar dele. A segunda é que, por mais que isso nos custe, a paz não surge normalmente por si mesma; para existir, é necessário construi-la, dedicar-lhe esforços e energia.
O “médio-oriente” tem sido fonte de graves conflitos com consequências humanitárias graves, como aliás sucede hoje em parte da Síria e do Iraque onde um bando de islamitas fanáticos tenta, com os meios do século XXI, implantar um regime puramente medieval a que chama “califado”.

Um dos países mais importantes da região é o Irão. Quer do ponto de vista de dimensão, de localização e até mesmo histórico, o Irão ou como era antes conhecido, a Pérsia, é um país incontornável no delicado e extremamente complicado xadrez do médio-oriente. Que se pode igualmente tornar muito perigoso. Após a instauração da República Islâmica em 1979 sob a liderança xiita do ayatollah Khomeini, o Irão fechou-se numa teocracia radical, alterando completamente o modo de vida dos iranianos até aí ocidentalizado. O Irão, que em 1968 havia subscrito o Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares, iniciou então um ambicioso programa nuclear, que muitos temeram ter como fim último, não a utilização pacífica da energia nuclear, mas a produção de armas nucleares. Alguns dos periclitantes equilíbrios do “médio-oriente”, tendo em conta a reduzida dimensão de Israel e o permanente conflito entre xiitas e sunitas, passam por o xiita Irão ser uma potência económica comparável aos seus vizinhos sunitas, designadamente a Arábia Saudita e por não surgirem novos países com capacidade militar nuclear. Por isso, a partir de 2002, quando os rumores sobre os esforços iranianos para conseguir a bomba atómica se tornaram em indícios sérios de que tal estava a suceder, o ocidente iniciou um programa de sanções económicas contra ao Irão que se reflectem hoje seriamente no modo de vida dos iranianos.
O actual presidente iraniano é Hassan Rohani, que participou nas antigas negociações nucleares e que foi eleito com promessas de compromissos sérios com a comunidade internacional, com o objectivo de acabar com o isolamento iraniano e com as sanções económicas de que os iranianos estão cansados. Pelo seu lado, o presidente Barack Obama decidiu juntar a comunidade internacional e aproveitar a nova situação interna no Irão, mais favorável a negociações.
Depois dos necessários contactos informais e secretos prévios, iniciaram-se as negociações oficiais entre o Irão e o chamado grupo P5+1 constituído pelos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança (EU América, França, Grã Bretanha, China e Rússia) mais a Alemanha que já fazia parte do grupo europeu que antes tinha conduzido negociações com o Irão.
O objectivo essencial do P5+1 era evitar que o Irão venha a desenvolver armamento atómico ou, pelo menos, que o desenvolva de forma clandestina nos próximos anos.
As negociações políticas, com as dificuldades que se podem adivinhar, chegaram a bom termo há cerca de uma semana. Restam pormenores técnicos, apesar de tudo ainda muito difíceis de acertar, até à data fixada de 1 de Julho para a assinatura do Acordo que, a ser atingido, será histórico e provará, uma vez mais que, se queremos a Paz, temos que trabalhar por ela.
Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 20 de Abril de 2015

Sem comentários: