quinta-feira, 23 de julho de 2015

Pontes culturais entre países irmãos

Há pouco mais de uma semana Coimbra pôde assistir a dois momentos culturais, numa rara simultaneidade que proporcionou ainda a feliz comemoração de um importante acontecimento político.
A autarquia de Coimbra atribuiu o importante prémio literário Miguel Torga ao escritor cabo-verdiano Mário Lúcio de Sousa que acontece ser o actual ministro da Cultura do seu país. De referir que Mário Lúcio foi o primeiro autor não português a ganhar este prémio, tendo concorrido com o romance inédito "Biografia do lingua". O prémio foi-lhe entregue no salão Nobre da Câmara no passado dia 12, tendo assistido à cerimónia o primeiro Ministro de Cabo Verde e participado o secretário de Estado da Cultura do Governo português. Após a cerimónia, houve um concerto no Pavilhão Centro de Portugal pela Orquestra Clássica do Centro dirigida pelo Maestro António Sérgio Ferreira.
O concerto foi integralmente dedicado à música cabo-verdiana, com composições do músico cabo-verdiano Vasco Martins incluindo ainda a interpretação por Mário Lúcio da sua canção "Morna e cítara" com arranjo também de Vasco Martins. Esta composição lindissima, e que suscitou grande entusiasmo por parte do público, "é a única morna que se conhece com dois acordes, em que o compositor, além da temática da mestiçagem (crioulo), também pensou na Índia e no ‘tampura’, instrumento tradicional indiano".
O concerto abriu com a obra “Quatro notas na cidade”, inspirada nos pregões das peixeiras da cidade do Mindelo tendo, em alguns dos temas que se seguiram, intervido o próprio compositor como interprete. Vasco Martins é um compositor multifacetado e consagrado em várias áreas da música, sendo mesmo um dos raros compositores africanos de musica erudita. A sua musica tem sido interpretada por grandes orquestras e maestros reconhecidos, fazendo parte do reportório da Orquestra Clássica do Centro há mais de uma dezena de anos.
O concerto inseriu-se nos “Encontros com a Cultura Caboverdiana", que decorreram entre os dias 3 e 15 de Julho, em que a OCC e algumas associações cabo-verdianas como o Núcleo de Coimbra da Associação Maense em Portugal e o Grupo de Apoio aos Doentes Evacuados em Coimbra promoveram a comemoração dos 40 anos da independência de Cabo Verde.
Incluida nestas actividades, assistiu-se ainda à apresentação de um interessante livro sobre a cantora Cesaria Évora da autoria de Vasco Martins e do pintor Tchalé, editado pela OCC com o apoio da PLURAL. Houve a rara oportunidade de poder ouvir um dos autores, Vasco Martins, a falar sobre a vida da artista que levou a canção cabo-verdiana a todos os cantos do mundo, partilhando emocionadamente com a assistência aspectos da sua convivência pessoal com a cantora.
Assistir à actuação ao vivo de Vasco Martins ao piano é uma experiência que fica na memória. É visível a relação amorosa e mística do compositor com a sua obra e o instrumento. O pianista, ora toca delicadamente nas teclas, ora praticamente se estende ao longo do teclado tocando com violência, ora se levanta como quem quer ir-se embora, sem nunca deixar de fazer fluir a música intensa.
Dias inesquecíveis, que provaram como a Cultura pode contribuir para unir povos e ultrapassar separações artificiais, criando em seu lugar fraternidade, confiança e amizade.



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