segunda-feira, 29 de agosto de 2016

Trump: You are fired (?)




Apesar das sondagens darem actualmente Donald Trump oito pontos abaixo de Hillary Clinton, não se pode dar como adquirida a vitória desta última nas eleições presidenciais americanas que terão lugar já daqui a menos de noventa dias, pelo que a resposta ao título só será dada em 8 de Novembro.
O interesse suscitado em todo o mundo pelas presidenciais americanas é sempre inteiramente justificado, dada a importância política, social e económica dos EUA. Interesse ainda maior nestas eleições, atendendo aos candidatos em presença, mas sobretudo por o representante republicano ser Donald Trump. Talvez um dia se conheçam as verdadeiras razões desta candidatura mas a realidade é que ela está aí e, apesar de tudo, pode vir a ser ganhadora. As sondagens têm variado o suficiente durante os últimos meses para que seja certo que a actual margem vantajosa para a candidata democrata se mantenha até ao fim. Até porque Hillary Clinton tem sido confrontada com questões de alguma gravidade, que colocam em causa a sua credibilidade para ser presidente, nomeadamente problemas com a sua actuação como Secretária de Estado (ministra dos negócios estrangeiros). A campanha contra a sua candidatura tem tido aspectos escuros, suspeitando-se mesmo de intervenções secretas de potências estrangeiras. A Wikileaks também anunciou há poucos dias que se prepara para lançar para a comunicação social factos que, segundo Assange, destruirão definitivamente as hipóteses presidenciais de Clinton.
O que seria verdadeiramente uma tragédia porque, perdendo Clinton, venceria Trump.

A frase que melhor define Donald Trump é “estás despedido” – “you are fired”, que ele utilizava sistematicamente e com evidente gosto no programa televisivo em que entrava e que o tornou famoso. Trump assume um discurso agressivo, atacando tudo aquilo que ele designa como “o sistema” e que é básicamente toda a construção democrática americana. Donald Trump assume-se como o paradigma do empresário, mas na realidade é o herdeiro de uma enorme fortuna no imobiliário e, ao contrário do que pretende, já abraçou muitos negócios que se revelaram ruinosos e terá actualmente uma dívida gigantesca de muitas centenas de milhões de dólares.
Donald Trump é o representante americano da vaga de populismo que, desgraçadamente, varre todo o ocidente incluindo a nossa velha Europa. Não foi por acaso que, há poucos dias, Nigel Farage se lhe juntou num comício eleitoral com o objectivo de explicar o “brexit” de que foi campeão e um dos principais responsáveis, tendo usado e abusado da manipulação e mesmo mentira sistemática para atingir o seu objectivo. Farage foi mais uma vez igual a si próprio, não apelando ao voto em Donald Trump, mas dizendo, a uma assistência da qual pelo menos 80% não fazia ideia de quem ele era nem sequer em que consistiu o brexit, que não votaria em Hillary Clinton, nem que lhe pagassem. Quanto a este acontecimento, pode-se comentar apenas que os bons espíritos se costumam encontrar.
Sentindo o chão a fugir debaixo dos pés, o candidato republicano tem ultimamente alterado a sua estratégia, desdizendo o que afirmara no início da campanha, tentando corrigir erros óbvios e, pasme-se atendendo à sua personalidade, pedindo mesmo desculpa por anteriores afirmações suas. Tudo isto enquanto vai substituindo os responsáveis máximos da sua campanha, utilizando aqui o seu método clássico, isto é, chamando-os à sede e dizendo-lhes muito simplesmente: estás despedido.
Para quem definiu força e dureza como a sua imagem de marca para estas eleições, esta alteração de estratégia a poucos meses da eleição surge aos olhos dos observadores como a demonstração daquilo que ele próprio costuma afirmar sobre os políticos para quem, antes de tudo, interessa a estratégia, o posicionamento e a comunicação.
E Donald Trump tem muito por onde escolher para corrigir o seu tiro anterior contra o que chama “politicamente correcto”. Desde os ataques racistas manipulando números de homicídios cometidos por negros, aos ataques a imigrantes propondo a construção de um muro na fronteira com o México, ao miserável comentário sobre a heroicidade de John McCain, até mesmo à subliminar ameaça dos defensores da liberdade de livre posse de armas à sua rival Hillary Clinton ou ao comentário sobre os pais afegãos de um soldado americano morto ao serviço, a lista de asneiras ditas e reditas quase não tem fim.
Hilary Clinton pode não ser, e não é certamente, uma candidata perfeita para o cargo de Presidente dos Estados Unidos da América. Mas a perfeição não existe nunca, menos ainda em política, e Clinton tem muitas qualidades para compensar os seus defeitos. Ao contrário de Donald Trump, em quem será difícil encontrar alguma qualidade.

Publicado no Diário de Coimbra em 29 Agosto de 2016

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