segunda-feira, 19 de março de 2018

EUROPA: CAMINHOS INCERTOS




Ao fim de seis meses, Ângela Merkel conseguiu finalmente responder ao Presidente do Parlamento alemão Wolfgang Schäuble: “Sim Sr. Presidente, aceito o resultado da votação”, à tradicional pergunta deste sobre se aceitava a votação parlamentar que, por pequena margem, tinha aprovado a proposta do novo Governo alemão. Desde as eleições de Setembro último que o anterior governo alemão presidido por Ângela Merkel se mantinha em funções, enquanto as negociações para a formação de um novo decorriam de forma dura entre os dois principais partidos, a CDU que em conjunto com a CSU da Baviera tinha obtido 33% contra os 41,5% de quatro anos antes e o SPD que desceu de 25,7% para 20,5%. A queda dos dois partidos foi notória, tendo tido consequências mais sérias no SPD que, depois de diversas peripécias, substituiu o seu líder Martin Schultz por Andrea Nahles que é a primeira mulher a liderar o partido nos seus 154 anos de história. A aceitação por Schultz do posto de ministro dos Negócios Estrangeiros em troca de um acordo, quando na campanha tinha afirmado que nunca pertenceria a um governo liderado por Merkel foi-lhe fatal, já que os sociais-democratas não lhe perdoaram a atitude entendida como traição ao partido. A formação de uma nova grande coligação foi, assim, tremendamente difícil, tendo Merkel ficado à mercê da aprovação dos 646.000 membros do SPD. A votação de 13% conseguida pelo AfD que, tendo surgido há apenas 4 anos é o primeiro partido de extrema-direita a conseguir eleger deputados para o parlamento alemão desde os anos 50, era o sinal mais evidente do pano de fundo que, em conjunto com as quedas da CDU e do SPD, marca um cansaço do eleitorado alemão com as políticas dos últimos anos e, em particular, com a política de Merkel de acolhimento dos muitos milhares de refugiados de África e do Médio-Oriente. Ângela Merkel teve que aceitar ser Chanceler de um Governo que tem 6 ministros do SPD (com as pastas cruciais dos Estrangeiros, Finanças, Famílias, Trabalho e Assuntos Sociais, Ambiente e Justiça), 5 ministros da CDU e 3 ministros da CSU. Notoriamente, Ângela Merkel surge como uma pálida imagem da que era tida como a mulher mais importante da Europa e mesmo do Mundo.
Em Itália, os resultados das eleições do passado dia 4 de Março foram largamente inconclusivos. Do lado do Centro-Direita que elegeu 264 representantes para a Câmara de Deputados, a Liga do Norte de Matteo Salvini com 122 deputados surgiu como maioritária, relegando a Força Itália de Silvio Berlusconi para um lugar que lhe retira capacidade de decisão sobre a política italiana. No que respeita ao Centro-Esquerda, a eleição de apenas 113 deputados constituiu uma derrota desastrosa, principalmente para o Partido Democrático do ex Primeiro-Ministro Matteo Renzi que contou 104 deputados, o que provocou de imediato a renúncia do seu líder partidário. O Partido Democrático agregou ex-comunistas e ex-democratas cristãos progressistas, depois da hecatombe judicial que levou a estrutura política italiana do pós-guerra e coube-lhe a liderança dos três últimos governos italianos.

A surpresa veio do Movimento 5 Estrelas, fundado em 2009 pelo comediante Peppe Grilo e que surgiu liderado por Luigi di Maio que tem apenas 31 anos de idade. Só por si, o Movimento Cinco Estrelas conseguiu 227 lugares na Câmara de Deputados tendo-se convertido em partido charneira na política italiana, dele dependendo a futura solução governativa. Esta solução não será fácil de encontrar. O Partido Democrata tem afirmado recusar-se a ter negociações quer com o Movimento Cinco Estrelas, quer com a direita, preferindo ir para a oposição. Já o Movimento 5 Estrelas, afirma que a distinção esquerda/direita não faz hoje qualquer sentido, preferindo soluções pragmáticas para os problemas políticos à esquerda ou à direita, mas os seus votantes estarão mais próximos do Partido Democrata do que da Liga do Norte.
Há uma conclusão comum a tirar destas duas eleições que consiste em a União Europeia aparecer mal vista pelos eleitores destes dois países, mas principalmente pelos italianos que são dos europeus com mais reservas quanto à União. Trata-se de duas das maiores economias europeias que, curiosamente, funcionam com larga independência do poder político, havendo mesmo quem diga, quanto à italiana, que funciona apesar do Governo.

Fora da União Europeia, Putin vai assumir sem surpresa o seu quarto mandato presidencial da Federação Russa após a sua primeira eleição em 2000, para além de ter assumido o cargo de primeiro-ministro entre 2008 e 2012. Ao notório carácter imperialista do Kremlin sob Putin que tem provocado atritos nas suas fronteiras a Ocidente, veio agora juntar-se a crise provocada pelos atentados a cidadãos russos em território do Reino Unido através da utilização de armas químicas que também afectaram cidadãos britânicos. Tratou-se de uma acção sem precedentes em território britânico, contando mesmo com a Guerra Fria. Embora o Reino Unido esteja de saída da União Europeia, numa questão deste tipo a Europa deve manter-se unida e, de facto, quer a Alemanha quer a França já se colocaram decididamente ao lado do Reino Unido. Espera-se que, perante todo este quadro, que se reveste cada vez mais de maior complexidade e perigosidade, os dirigentes nacionais europeus sejam capazes de estar à altura da situação já que, de uma Comissão Europeia chefiada por Juncker, não será de esperar grande coisa.

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