segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

A Democracia tem um preço: mas qual o preço certo?

O Presidente da República promulgou recentemente uma alteração da lei de financiamento dos partidos políticos. Não sou dos que tendem a diabolizar os partidos como sendo responsáveis por tudo o que de mal acontece na nossa vida pública. Os partidos são fundamentais para o funcionamento do regime democrático, garantindo a representação política da pluralidade de pontos de vista e das diversas opções ideológicas. Proporcionam ao povo a escolha dos governantes. Sem partidos não há Democracia, pelo que é claro que a comunidade deve pagar um preço pela sua existência e funcionamento dentro das regras estabelecidas. Por isso mesmo a organização da vida partidária e o financiamento dos partidos políticos é uma questão importante. Para além do financiamento estatal de uma boa parte da actividade dos partidos, é crucial que existam sistemas de regulação e fiscalização claros e eficazes para evitar que os partidos, através da corrupção, se transformem em associações de malfeitores que rapidamente minam a essência do próprio sistema democrático.

A recente alteração da lei do financiamento dos partidos vai exactamente no sentido contrário, o que é absolutamente lamentável e reprovável por qualquer cidadão consciente e responsável, independentemente de ser ou não militante de qualquer um dos partidos existentes.

A coberto da necessidade de reduzir as subvenções do Estado para os partidos até 2013 e de um suposto princípio de auto-regulação, autorizou-se toda uma série de acções financeiras que vêm escancarar a porta ao branqueamento dos financiamentos ilegais, à opacidade da contabilidade partidária e portanto, à corrupção.

Se não, vejamos: Grande parte das despesas das campanhas, como publicidade, arrendamento de espaços, aluguer de viaturas e outras passam a poder ser consideradas como donativos indirectos, saindo das contas a prestar. Os partidos passam a poder ter receitas do arrendamento das suas próprias instalações para as suas próprias campanhas. Os partidos passam a poder fazer aplicações financeiras e terem assim relações privadas com a banca e até contas offshore.

Mas não ficamos por aqui. A partir de agora, os candidatos em listas eleitorais podem fazer contribuições ilimitadas para os partidos. O leitor está bem a ver as possibilidades desta norma, não está? As comissões políticas podem escolher candidatos com base na sua capacidade contributiva líquida para o partido (explícita ou implicitamente surgirá o leilão: quem paga mais?) e os concorrentes podem drenar dinheiro à vontade, qualquer que seja a sua proveniência. A qualidade da classe política descerá a níveis impensáveis. Para completar o ramalhete os partidos podem ainda utilizar contabilização criativa com a angariação de fundos, manipulando à vontade saldos positivos e negativos.

Mas ainda não é tudo. Imagine-se que as coimas aplicadas aos partidos serão pagas pelo próprio Estado, dado que passam a ser consideradas despesas correntes dos partidos. Hipocrisia maior não deverá ser possível.

Peço ao leitor que não leia esta minha crónica revoltada como um ataque aos partidos, longe disso, até sou militante partidário há muitos anos. É apenas um alerta contra o oportunismo de muitos dirigentes partidários e para a necessidade de os cidadãos se manterem informados sobre o que passa, já que quase não houve notícias sobre este assunto lamentável.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 10 de Janeiro de 2010

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Alberoni no jornal "i"

Uma regra notável: "Se tiver de escolher alguém para uma função importante, de director ou de colaborador, pergunte sempre a si mesmo: "Que faria esta pessoa se se tornasse um ditador todo-poderoso?"
Pessoalmente, ao longo da vida já encontrei demasiados casos, na vida privada e na vida pública, em que a passagem para um patamar máximo de decisão se revelou verdadeiramente trágica, isto em pessoas com um perfil profissional e académico exemplar até subirem a esse ponto.
Este artigo de Alberoni é de ler e meditar com a maior atenção.

domingo, 2 de janeiro de 2011

Carta ao leitor desconhecido

Estimado leitor

Em primeiro lugar permita-me que o cumprimente e felicite. Sei que no desgraçado ano que acabou na sexta-feira passada não passou a integrar o contingente de quase um milhão de portugueses no desemprego; se tal desgraça lhe tivesse acontecido não teria certamente comprado o jornal e não teria paciência para ler esta carta porque gastaria o seu dinheiro noutras coisas e faria outras leituras com maior interesse prático imediato.

Depois, peço-lhe que me desculpe por continuar a ser tão politicamente incorrecto quando escrevo leitor e não leitor/a. Mas creia que ainda acredito que o significado das palavras é superior às próprias palavras, querendo com o termo leitor abarcar toda a gente que me lê, independentemente do género (lá ia caindo noutra armadilha dos nossos dias e escrever sexo, mas desta vez escapei).

Passou o ano de 2010 a ouvir falar de uma crise anunciada. Lembre-se que desde sábado passado paga um imposto de 23% sobre quase tudo aquilo que compra. E que o gasóleo do seu carro custa outra vez o mesmo que naquela altura em que o famoso “crude” atingiu os 150 dólares por barril, quando agora não chega sequer aos 100. Pois é, caro leitor, a má notícia é que a crise chegou efectivamente hoje. A boa notícia é que as crises trazem sempre novas oportunidades. Dizem. Caro leitor, Portugal não vai sair do euro e este não vai acabar. O que significa que a saída para tudo isto passa por si. Pelos seus sacrifícios e por uma nova atitude perante a vida. Seja exigente. Não se deixe enganar em qualquer circunstância: nem na loja, nem no restaurante, nem na repartição pública, nem na escola, nem no hospital, nem sequer no tribunal. O leitor paga isso tudo e bem. Ah! E quando a oportunidade surgir, marque a sua posição na urna de voto. Olhe que o leitor também paga para isso. E não se deixe enganar com promessas de mau pagador, se me permite a vulgaridade. Pague, que não tem alternativa, mas exija! Exija sempre o que lhe é devido!

Mas os direitos significam sempre deveres. Compre “made in Portugal”. Faça férias cá dentro. Cumpra as suas obrigações cívicas e pague os seus impostos, mas não deixe que os corruptos enriqueçam à sua custa. Seja verdadeiro, assuma sempre as suas opções com frontalidade, lembre-se que o que calar não existirá nunca e contribua para resolver problemas evitando sempre ser “o” problema.

Como não conheço o seu nome, caro leitor, chamei-lhe desconhecido. Lembrei-me do soldado desconhecido que caiu na refrega da batalha e que é homenageado com uma chama eterna em memória do seu heroísmo anónimo. Mas o leitor desconhecido vai certamente continuar a ser um herói da vida que combate diariamente para tentar melhorar o que se passa à sua volta sem sonhar com honrarias e medalhas, exactamente como o faz a maioria dos portugueses.

Para si que os merece, os meus votos de um bom ano de 2011.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 3 de Janeiro de 2011

domingo, 26 de dezembro de 2010

CARLOS ENCARNAÇÃO E COIMBRA

A saída do Dr. Carlos Encarnação de Presidente da Câmara Municipal de Coimbra está a proporcionar momentos de vendetta política de quem nunca foi capaz de o defrontar politicamente com sucesso e a mostrar imensa falta de carácter de muita gente. Pessoas para quem na vida só interessa o “rei morto, rei posto”.

Entendamo-nos. A discordância sobre atitudes que possam provocar situações de orfandade política é uma coisa. Outra coisa, completamente diferente é promover ataques políticos e pessoais sem fundamento e desfazer injustamente numa obra sólida de nove anos. Nem o Dr. Carlos Encarnação o merece, nem Coimbra tão pouco.

A memória é muitas vezes curta e outras vezes selectiva. Recordo que em 2000 o Concelho de Coimbra era, em todo o Distrito, aquele que passava pela vergonha de ser o que tinha menor superfície de piscina para prática de natação por habitante. E as poucas piscinas que existiam na altura não tinham quaisquer condições de segurança. Será preciso enunciar os excelentes equipamentos de que Coimbra dispõe hoje nessa área e que começam já a dar os seus frutos na preparação de atletas? A existência e utilização do pavilhão multidesportos passa assim tão despercebida que ninguém dê por ele? O facto de o edifício do Estádio Cidade de Coimbra ser o único municipal do Euro 2004 com utilização total não diz nada a ninguém? Nem o facto de tal situação não se traduzir em quaisquer custos para os cofres municipais? Os edifícios de novas sedes de Juntas de Freguesia são transparentes? E as creches construídas e as escolas básicas recuperadas? Também não se vêem? Ninguém passa na circular externa? A obra do Convento de S. Francisco não está finalmente a decorrer, depois de anos de impedimento pela Administração Central? O Coimbra i Parque não tem a sua primeira fase construída? Não se esqueça também o trabalho que não se vê nas infra-estruturas, por estarem enterradas; Coimbra tem hoje uma cobertura de abastecimento de água de praticamente 100% e uma das mais altas taxas de saneamento básico do País: será isso por acaso? A Alta de Coimbra começa a ser outra com elevado número de edifícios habitacionais recuperados e uma Casa da Escrita exemplar. Recordo ainda a Orquestra Clássica do Centro que na sua área proporciona cultura a um nível profissional como nunca antes foi possível em Coimbra, fazendo-o não só em Coimbra, mas em toda a Zona Centro.

Agora quanto ao motivo principal e imediato apontado pelo Dr. Encarnação para se sentir farto: o processo do Metro Mondego. Não deverá haver nenhum conimbricense que, ainda que no íntimo, não lhe dê inteira razão. O Dr. Carlos Encarnação lutou pelo Metro Mondego como ninguém. Forçou a realização das demolições na Baixa para criar condições para que a sua travessia seja possível, sendo esta passagem na Baixa crucial para melhorar as acessibilidades de quem queira aqui viver e trabalhar no comércio de forma sustentável, possibilitando enfim a sua reabilitação. Recordo algo que muita gente hoje faz por esquecer ou omitir neste processo lamentável. Em 2005 houve um concurso internacional para concepção, construção e exploração do Metro Mondego na sequência do qual, caso tivesse avançado, já teríamos hoje metro em Coimbra, em Miranda do Corvo e na Lousã. Só não avançou porque o Autarca da Lousã se recusou a assiná-lo, por prever a possibilidade de transporte em autocarros no curto troço entre a Lousã e Serpins, cuja exploração ferroviária é completamente insustentável. Face ao que se passa hoje, é quase uma piada de mau gosto.

Por tudo isto e muito mais que aqui não cabe, como a ligação estratégica entre o Município e a Universidade que finalmente deixaram de estar de costas voltadas, apetece-me dizer: poupem-nos, por favor, façam política, mas respeitem as pessoas e saibam separar as situações.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 27 de Dezembro de 2010

domingo, 19 de dezembro de 2010

VIDA NA INTERNET

A influência crescente da internet na nossa vida é cada vez mais evidente, e já não se resume à entrada de novas palavras no nosso léxico diário. A vida diária de milhões de pessoas em todo o mundo mudou, e o Facebook e Wikileaks estão aí para o provar. Nomes como os de Mark Zuckerberg e Julian Assange são hoje parte do quotidiano.

O Facebook é a rede social mais bem sucedida, utilizada praticamente todos os dias por mais de 500 milhões de pessoas de todo o mundo. Mark Zuckerberg foi esta semana considerado a personalidade do ano pela revista TIME. Vale a pena referir que se trata de um jovem nascido em 1984 (o leitor leu bem, tem 26 anos de idade), que alterou hábitos de centenas de milhões de pessoas e com isso conseguiu uma fo

rtuna colossal que cresce todos os dias. Reza a história que a invenção se deveu ao seu carácter reservado que o impedia de conhecer raparigas pelo método tradicional, isto é, pela conversa pessoal, enquanto estudante da Universidade de Harvard. Imaginou e montou uma pequena rede de contactos e partilha de conversas pela internet a partir do seu quarto de estudante, que em sete anos se tornou na rede social mais utilizada do mundo, à qual adaptou um modelo de negócio muito lucrativo. O Facebook cresce a uma média de 700.000 novos aderentes por dia. Como diz a TIME, se fosse um país, seria já o terceiro maior do planeta, atrás apenas da China e da Índia, com uma diversidade linguística assinalável: 75 línguas. Aquilo que ainda há pouco não existia, o Facebook, é hoje uma ferramenta poderosa de marketing e de ligações pessoais sem a qual milhões de pessoas provavelmente já não saberiam como viver.

Muita gente considera que a personalidade do ano deveria ter sido Julian Assange, o inventor e mentor do site Wikileaks. Este site é basicamente um portal de denúncias, dedicando-se a recolher informações de carácter reservado ou secreto, disponibilizando-os posteriormente a todo o mundo, após se certificar da sua autenticidade. Depois de ter obtido acesso a centenas de milhares de telegramas trocados entre diplomatas norte-americanos, tem procedido à sua divulgação pública, quer através da internet, quer através de vários jornais de grande divulgação. Com isso, conseguiu embaraçar gravemente a diplomacia e o governo norte americanos, bem como os próprios países a quem esses telegramas se referem, não tendo Portugal escapado incólume.

Discute-se muito sobre o efectivo interesse público do conhecimento deste tipo de informações, sobre a legitimidade da sua divulgação, e sobre o sectarismo da atitude, já que só se debruça sobre a política norte-americana. Mas uma coisa é certa. A simples existência da internet possibilita tudo isto e muito mais, pondo em causa o secretismo da diplomacia tradicional e obrigando a uma completa revisão dos seus procedimentos. Não podemos ser ingénuos ao ponto de pensarmos que o Wikileaks será sempre um filho único deste tipo de activismo cibernético.

O carácter de Julian Assange não o recomendará como amigo de ninguém, e ainda bem que não foi escolhido como personalidade do ano. Mas o que é certo é que ele não é mais que um mensageiro, não tendo nenhum dos telegramas que o Wikileaks divulgou sido desmentido como falso. Assange abriu uma porta pela qual podemos estar seguros que irão passar muitos outros no futuro.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 20 de Dezembro de 2010

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

NEO-LIBERALISMO

Para quem ainda não percebeu bem o que é o neo-liberalismo, aqui vai a chave de decifração:
-onde se ler neo-liberalismo, ler capitalismo
-onde se ler neo-liberal, ler defensor do capitalismo.
É fácil: na realidade trata-se apenas de uma adaptação de linguagem dos marxistas e c.ia ao século XXI, já que o velho dicionário do marxismo do século XX ficou subitamente desacreditado após a queda "das paredes de vidro" do bloco soviético adequadamente chamado socialista.

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Oscar Wilde

As boas intenções têm sido a ruína do mundo. As únicas pessoas que realizaram qualquer coisa foram as que não tiveram intenção alguma

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

A MALDIÇÃO DA ORFANDADE POLÍTICA


Passaram há poucos dias 30 anos sobre a morte de Sá Carneiro. Muita gente falou sobre a sua obra, houve algumas cerimónias, publicaram-se livros e até se fala num novo processo de inquérito ao desastre de Camarate. Já tanto foi dito sobre a sua personalidade e vida, que não me vou debruçar sobre isso. O seu súbito desaparecimento teve no entanto uma consequência que é poucas vezes referida e que teve grandes implicações na vida nacional. Foi a primeira de uma série de orfandades do PSD (tantas, que mais parecem uma maldição ou uma autêntica síndrome).

De facto, após o 4 de Dezembro de 1980, o Governo da AD continuou em funções, com Pinto Balsemão à frente, por escolha interna do PSD. Independentemente das muitas qualidades de Balsemão, o Governo entrou quase imediatamente em desagregação e pouco mais tempo durou. No interior do PSD, e mesmo no Governo, outras individualidades acharam-se com mais qualidades e capacidades do que o Primeiro-Ministro e fizeram-lhe a vida negra, entregando rapidamente o poder ao PS. Começou aqui a série de orfandades do PSD.

Aos dez anos de governação de Cavaco Silva sucedeu-se o seu famoso abandono em 1995, e ao excelente e empenhado Fernando Nogueira coube o ingrato papel de levar a eleições o cavaquismo-sem-Cavaco, com os resultados que conhecemos. O PSD estava obviamente órfão de novo, com a agravante de estar órfão de alguém vivo e activo na sociedade, mas fora do PSD.

Ao pântano de Guterres, seguiu-se Durão Barroso que logo abandonou o Governo de Portugal para ir presidir à Comissão Europeia O PSD de então ficou outra vez órfão, decidindo entregar o lugar de Primeiro-Ministro a Santana Lopes, de forma orgânica e sem sanção eleitoral. Santana Lopes fez o que pôde naquelas condições. Rapidamente se percebeu que numa situação de aflição económica como a que se vivia, faltava àquele Governo a força que vem da legitimidade democrática das eleições para poder fazer as reformas que se impunham e logo o poder foi de novo para o PS. Até hoje, como bem se sabe. Desde aí, o partido continuou órfão, procurando sistemática e sucessivamente uma liderança que o libertasse dessa condição.

Parece um destino ao qual o PSD não consegue fugir: os seus líderes carismáticos saem dos lugares que ocuparam legitimamente por via eleitoral, sendo o poder entregue a quem previamente tinham escolhido para trabalharem com eles. A consequência desta passagem interna do poder foi sempre a mesma: nas eleições seguintes, lá volta o PS. De facto, o eleitorado tem uma intuição que escapa muitas vezes à teoria política. As eleições constituem cada vez mais uma escolha do líder e não das equipas, embora formalmente isso devesse ser assim apenas para o cargo uninominal de Presidente da República. Quando a transição de líderes não provoca eleições antecipadas, isto é, não devolve a voz ao eleitorado, os sucessores designados tendem a ter o seu destino marcado num futuro bem próximo, pese embora a sua grande qualidade política e capacidade de trabalho.

Resta o triste consolo de ver que o PSD não está sozinho neste hábito. Veja-se o que sucedeu a Gordon Brown após ter substituído Tony Blair à frente do Governo britânico: tendo aceitado o poder político sem eleições, Gordon Brown liderou os Trabalhistas para a derrota eleitoral.

A História ensina-nos muitas coisas. Aqui aprende-se que as orfandades que resultam de decisões unipessoais não dão bom resultado, e aprende-se ainda que o povo não perdoa aos que aceitam ficar “por nomeação”.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra de 13 de Dezembro de 2010

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

PROT-C, (mas pouco)


Por esta ou aquela razão, diversas autarquias da chamada NUT III (Baixo Mondego), acabam de dar pareceres negativos à proposta de PROT-C (Plano Regional de Ordenamento do Território da Região Centro). De acordo com a legislação que regula a política de ordenamento do território e de urbanismo, o PROT faz parte dos planos de ordenamento do território e pretende “definir a estratégia regional de desenvolvimento territorial, integrando as opções estabelecidas a nível nacional e considerando as estratégias municipais de desenvolvimento local”, situando-se entre o nível nacional (PNPOT) e os planos de âmbito municipal (PMOT).

Coimbra está precisamente entre as Autarquias que manifestaram discordância em relação àquele documento e por boas razões. Esta tomada de posição da Câmara Municipal de Coimbra foi unânime, pelo que todas forças políticas representativas dos munícipes de Coimbra estão de acordo neste ponto, o que é de saudar.

A meu ver há dois planos de leitura da proposta do PROT-C. Um, sob o ponto de vista da própria Região. O outro, tendo em atenção especial a protecção dos interesses de Coimbra. Não tenho qualquer prurido em assumir esta defesa, já que se nós conimbricenses não defendermos Coimbra, quem o fará? Até porque estou firmemente convicto de que a Região Centro só terá a ganhar com Coimbra forte, perdendo também se Coimbra for desconsiderada no planeamento central.

No que respeita à Região, o parecer dos municípios da região Centro é revelador: Por um lado, assinala que a proposta “não traduz os grandes objectivos de desenvolvimento económico e social sustentável, não equaciona medidas tendentes à atenuação das assimetrias intra-regionais”. Por outro lado, refere que “é excessivamente teórico, centralista, revela desconhecimento prático da realidade e não apresenta qualquer estratégia regional de desenvolvimento territorial”. Relativamente ao documento apresentado, estamos esclarecidos sobre a opinião dos eleitos locais da Região Centro

No que toca a Coimbra, não posso deixar de notar mais uma vez que a ideia base de toda a proposta se baseia na defesa do modelo policêntrico para a Região. Isto é, Coimbra aparece a par com todas as outras cidades da Região, sejam Aveiro, Leiria, Castelo Branco, Guarda ou Viseu. E parte-se disto para propor uma distribuição dos serviços públicos e serviços avançados às empresas.

Nesta proposta desenvolve-se toda uma teoria segundo a qual a tenaz constituída pelas áreas metropolitanas de Lisboa e Porto só pode ser contrariada pelo conjunto das cidades da região Centro, sem prevalência de nenhuma delas, isto é, de Coimbra capital histórica da Região. Até parece que este documento foi preparado em Lisboa ou no Porto e não em Coimbra, de tal forma segue a divisa de dividir para reinar!

Como conimbricense não sofro de nenhum complexo perante as cidades da Região. Devo dizer que gosto de todas elas e em todas encontro bons motivos para se lá viver. O que não suporto é que, com teorias que não estão de forma nenhuma demonstradas, se desfaça permanentemente Coimbra e se contribua para diminuir a sua importância nacional, o que tem aliás claros reflexos negativos para toda a Região, ao contrário do que se diz nesta proposta de PROT-C.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 6 de Dezembro de 2010