segunda-feira, 11 de maio de 2015

Fazer bem e dizer bem



Quando menos espera, qualquer pessoa pode ter necessidade de cuidados médicos de emergência. Há uma semana, foi isso que sucedeu ao autor destas linhas. Tinha acabado uma daquelas chuvadas fortes que ultimamente caracterizam o nosso clima quando, descendo uma antiga calçada, um pé escorregou e lá acabei sentado em cima desse pé, um bocado torcido. Perante a necessidade de verificação da situação, lá tive que escolher qual o hospital aonde me dirigir.
De acordo com os comentários e artigos desfavoráveis às Urgências dos Hospitais da Universidade, actuais CHUC, que lemos frequentemente na comunicação social, talvez o mais prudente fosse dirigir-me a um dos novos serviços privados de saúde. Apesar disso, resolvi recorrer às urgências dos CHUC já que, ao longo da vida, por várias vezes fui doente daqueles hospitais, com doenças de maior e menor gravidade e nunca tive razões de queixa. Confesso que ia um pouco a medo, de tal forma aquelas urgências têm sido sistematicamente pintadas com as cores mais escuras.

No entanto, o meu testemunho das Urgências dos CHUC é exactamente o oposto daquilo que alguns nos tentam fazer crer. Claro que a simpatia e cuidado colocado no contacto com os doentes por parte do pessoal de secretariado, de enfermagem e médicos, passando pelo pessoal auxiliar é sempre referido, mesmo pelos críticos, como sendo excelente, colocando-se a tónica desfavorável na desorganização, falta de meios, atendimento caótico, etc. Aquilo que fui encontrar é o oposto disso. Confirmo que todo o pessoal com que contactei, desde a entrada até à saída, foi modelar no atendimento aos doentes que naquele dia se encontravam nas urgências. Mas verifiquei outras coisas. Desde logo, competência no pessoal e isso nota-se logo, pelo à vontade e calma com que lidam com as diversas situações. Depois a organização. A espera para a triagem foi perfeitamente aceitável, de poucos minutos. A transferência para o serviço respectivo foi feita com rapidez. A consulta médica foi também realizada sem que a espera se possa de alguma forma considerar excessiva. Os exames de diagnóstico, no caso radiológicos, são feitos localmente, sem grandes deslocações e a espera para os mesmos foi igualmente reduzida. Devo dizer que em todos estes locais havia um relativamente elevado número de doentes, não se podendo de forma nenhuma dizer que era dia de “folga” às Urgências e posso dizer que eu próprio “ia na corrente” dos doentes, pelo que a minha visão não está distorcida. A análise médica final e subsequente diagnóstico da situação foram igualmente feitos pouco tempo depois do RX, cujo resultado foi analisado directamente no computador pelo médico, sem necessidade de impressões inúteis e dispendiosas.
Esta é a minha experiência pessoal, que preferia obviamente que não tivesse sucedido. Mas que me obriga a algumas, breves, considerações.

Desde a vinda da Troika em 2011, o país teve necessidade de cortar custos em praticamente tudo o que o Estado faz. Muitas vezes tal foi feito de forma cega, que só a urgência da situação financeira do país justificou, embora por vezes não desculpando, talvez, parte do que se passou. Uma das áreas em que se diminuíram custos de forma drástica, foi a da saúde, concretamente o Serviço Nacional de Saúde. Ninguém tem dúvidas disso. Mas para alguém se mostrar discordante com a austeridade feita, a meu ver não necessita de cometer a injustiça de desmerecer e deitar abaixo o trabalho meritório de tantos que se esforçam para, embora com menos recursos, manter ou mesmo melhorar o serviço que prestam aos portugueses. Ao longo dos anos os HUC/CHUC conquistaram um lugar cimeiro nos hospitais do país, através da elevada qualidade dos serviços médicos que prestam. Notoriamente, esse lugar mantém-se e cabe a todos nós, a começar pelos que directamente o podem testemunhar, realçar essa qualidade porque, se é difícil alcançar um lugar de topo em qualquer área, fácil é destruir essa situação através da crítica destrutiva, quantas vezes sem razão e com objectivos que nada têm a ver em concreto com o que se critica.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 11 de Maio de 2015

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