quarta-feira, 30 de novembro de 2016

Governar é como conduzir um carro

O primeiro Ministro terá feito esta afirmação numa entrevista. Nunca foi tão sincero nem demonstrou tão claramente o que é a sua governação. Infelizmente.
De facto, conduz-se um carro por uma estrada existente e reage-se ao que vai surgindo: estrada desimpedida, anda-se mais depressa; estrada movimentada e com curvas, anda-se mais devagar. Não há melhor imagem para a total falta de estratégia e de definição de objectivos, para além de chegar ao fim vivo.
Se tivesse dito que era como governar um navio, aí a conversa seria outra. Porque aí parte-se de um porto para outro de chegada e tem que se planear tudo, para lá chegar, desde escolher a rota, verificar a meteorologia e um monte de outras coisas que não vale a pena referir aqui.
Mas para isso é preciso estabelecer uma estratégia e não apenas reagir ao que aparece a seguir a uma curva.

Henrique Monteiro: para onde vai o dinheiro do povo?

Com a confirmação, hoje, do INE de que a Economia tinha crescido 0,8% no terceiro trimestre podemos agora ter a certeza da decomposição desse número. O grande motor foi a exportação e, ao contrário do que chegou a afirmar, a exportação dos aviões militares F-16 para a Roménia tem um impacto nulo. Ao mesmo tempo sabe-se que a procura interna cai 0,6 pontos percentuais em cadeia, mas parece que a poupança também está nos mínimos. O mistério é, pois, onde está o dinheiro?
 
http://expresso.sapo.pt/blogues/blogue_chamem_me_o_que_quiserem/2016-11-30-Para-onde-vai-o-dinheiro-do-povo-

Ainda aí uma grande conversa sobre mudança de estratégia  do governo do consumo interno para as exportações. A conversa é da treta. A estratégia do consumo interno falhou redondamente e o que fica são as exportações em que o governo anterior apostou com força e que neste momento têm a força da inércia. Isto é, não há mudança de estratégia e apenas viver com o que há.

Prémio Francisco Martins


Sobre a consolidação orçamental

 Sobre o esforço de consolidação orçamental e o tal  défice mais baixo da história da Democracia (um record) vejam-se os números, em vez de ler as asneiras de Nicolaus Santos e cia.




https://oinsurgente.org/2016/11/30/o-menor-defice-de-sempre-em-democracia/

Refeições nas escolas

Ora aqui está um assunto em que as associações de pais se deviam meter, em vez de andarem a fazer política ou tratar dos problemas das criancinhas dos dirigentes. A comida dada às crianças feita pelas empresas pode ter todo o controlo sob o ponto de vista nutricional, quando a coisa funciona bem. Mas os responsáveis deviam comê-la todos os dias ao lado dos alunos. Sempre gostava de ver se no fim do ano não arranjavam outra solução.

http://campeaoprovincias.pt/noticia/comida-impropria-na-escola-leva-pais-a-exigir-intervencao-da-autarquia

Diz Morais Sarmento

 Morais Sarmento faz prova de vida dizendo umas patetices sobre possíveis candidatos ao cargo partidário de Passos Coelho. Há gente que gosta de fazer figuras destas, depois deve rir-se muito com a boutade e os portugueses confiam ainda menos um bocadinho nos políticos.

http://observador.pt/2016/11/30/lideranca-do-psd-tenham-atencao-a-marques-mendes-e-santana-lopes-diz-sarmento/

segunda-feira, 28 de novembro de 2016

Nuvens escuras no horizonte





O chamado “populismo” invadiu a comunicação social e a discussão pública. Mas será que se lhe deverá dar tanta atenção? Ou antes perceber que está a servir de capa para algo muito mais profundo e que está a fazer o seu caminho para a superfície de uma forma que ainda há poucos anos não se suspeitaria? Na realidade, o populismo não é senão uma técnica “de feira” usada por muitos políticos para atrair apoio, que as mais das vezes não anda longe da pura mentira. Mas isso há que o reconhecer, sempre houve e, quase seguramente, sempre haverá não advindo daí grande mal ao mundo, para além de desilusões mais ou menos sérias por parte dos cidadãos crédulos e de, mais cedo ou mais tarde, más consequências para os políticos que vão por esse caminho.
Nos dias de hoje, contudo, o populismo tem aberto o caminho para o ressurgimento de algo que se julgaria afastado pelo racionalismo, pelo crescimento económico generalizado durante décadas e, fundamentalmente, pelos trágicos resultados que teve na História, em particular nas primeiras décadas do século XX, ainda não passaram cem anos.

Há um nacionalismo que se poderá considerar positivo, dado que permite aos povos conseguir atingir objectivos através da sua união, o que não conseguiriam se as pessoas não sentissem que algo as une. Um exemplo dos dias de hoje verifica-se no futebol, que concita os maiores entusiasmos colectivos seja clubísticos, seja através das selecções nacionais. E claro, não deve político que se preze que não se junte às comemorações e não atribua prémios dentro das suas possibilidades institucionais.
Mas há um outro nacionalismo, extremamente negativo e perigoso, que pretende unir através da consideração do outro como diferente e, acima de tudo, inferior. Foi este nacionalismo a que alguns chamam étnico, que levou à tremenda tragédia da II Grande Guerra.
A globalização e o liberalismo económico pode ter muitos defeitos e há certamente muitos erros a apontar a este processo que se desenvolveu nos últimos anos e que levou milhões de pessoas a sair da miséria absoluta, por muito que isso custe a muitos residentes do chamado mundo rico do ocidente e hemisfério norte que perderam um pouco. A liberdade e a igualdade nunca na História da Humanidade avançaram tanto como nestes tempos. Mas as nuvens de uma tempestade que poderá colocar em causa este movimento já não aparecem apenas no horizonte, surgindo cada vez mais ameaçadoras sobre nós.
A eleição presidencial americana que deu a vitória constitucional a Donald Trump (que não a maioria de votos dos americanos) foi o mais recente sinal de que uma espécie de nacionalismo “mau” está a surgir com força. Mas não é o único e os exemplos vêm um pouco de todo o mundo e cortando transversalmente a habitual dicotomia esquerda/direita.
O resultado do referendo de Junho passado no Reino Unido que deu início ao Brexit foi um claro indicador disso mesmo. A campanha que levou àquele resultado apelou à “independência” do Reino Unido face às regras comuns da União Europeia e ainda à limitação de entrada de determinados imigrantes; Não é por acaso que o partido do maior defensor do Brexit, Nigel Farage, se chama UKIP (partido da independência do Reino Unido). Se as eleições francesas do próximo ano entregarem a presidência a Marine Le Pen da Frente Nacional, tal significará a vitória das posições contra a globalização e livre troca, para além das afirmações anti-imigrantes. Significará ainda, com toda a certeza, o início do processo da saída da França da União Europeia, ditando de imediato o fim desta. A União Europeia conta já com dois países claramente nacionalistas, a Polónia e a Hungria, podendo a Áustria seguir-lhes o caminho. Acredita-se que a Holanda possa dar a vitória ao “partido da liberdade” anti-imigrantes de Geert Wilders.

Na Rússia, o presidente Putin pretende voltar à Grande Rússia, não só através do poderio económico, mas também puxando pelo nacionalismo contra vizinhos, como aconteceu na anexação da Crimeia. Usando do discurso nacionalista, Putin avança ainda com o poder militar, deslocando mísseis para o enclave de Kalininegrado e para as proximidades da fronteira com a Polónia. Na China, pelo menos desde que Xi Jinping atingiu a presidência em 2012 que o partido Comunista incute o espírito nacionalista da grande China aos estudantes em todos os graus de ensino. As afirmações nacionalistas do presidente da Coreia do Norte são também bem conhecidas.
As nuvens que quase cobrem o céu parecem indicar a formação de uma “tempestade perfeita”. Nós, portugueses, somos apenas um pequena parte neste complexo jogo. De uma coisa podemos ter a certeza: acabando a União Europeia, não há espaço atlântico nem nada semelhante que nos valha. Não nos deixemos enganar por vendedores de feira caseiros: estaremos sós, com uma fragilidade assustadora.

segunda-feira, 21 de novembro de 2016

Afirmação cultural




É já um lugar-comum afirmar-se que hoje a verdadeira competitividade não se faz entre países, nem sequer entre regiões, mas entre cidades. E todos verificamos isso diariamente. Há diversos aspectos pelos quais as cidades se podem diferenciar, mas há um que é comum a todas essas cidades que sobressaem do geral: a sua afirmação cultural.
É também habitual dizer-se que Coimbra é uma cidade de cultura e, na verdade, ligados à Universidade através de alunos ou de ex-alunos há numerosos organismos e instituições com actividade cultural permanente, quer no teatro, quer dança ou na música. Nesta última área, contudo, atrevo-me a dizer que impera algum conservadorismo que se verifica na pouca novidade da oferta que, sistematicamente, apresenta os mesmos tipos de música, quando não o mesmo repertório com poucas mudanças, anos a fio. Impera a nostalgia que, não raro, puxa pela lágrima ao canto do olho, única relação com uma juventude que da irreverência tem sobretudo a saudade. Não quero ser mal interpretado com estas afirmações, dado que eu próprio tenho gosto em apreciar essa música, que ainda bem que existe e é praticada, não se devendo deixar cair as tradições, ainda por cima com qualidade e valor cultural intrínseco.
A minha questão prende-se com a necessidade da existência de diversidade de oferta e de capacidade de inovação e abertura ao exterior.
Foi o caso dos últimos Encontros Internacionais de Guitarra organizados pela Orquestra Clássica do Centro, que já vão na sua X edição e que este ano deram particular atenção à música da Guiné Bissau.

A relação de Coimbra com a guitarra é antiga e, em particular através da guitarra de Coimbra é muito importante e tem-se manifestado ao longo dos anos de diversas formas, mas essencialmente como acompanhamento ao fado ou canção de Coimbra, como se lhe queira chamar, além dos temas instrumentais tocados com a companhia da guitarra clássica.
Mas esta utilização tradicional, sendo de extraordinário valor, pode tornar-se redutora, pelo que são de saudar as iniciativas culturais que rompem a redoma criada à volta da guitarra como ela é hoje e como é tocada em Coimbra.
Da Guiné-Bissau veio José Braima Galissá com a sua KORA, instrumento tradicional africano de 22 cordas, com uma sonoridade extraordinária, que carrega toda uma cultura e tradição de um país irmão. Para além de temas originários da sua terra, José Galissá teve oportunidade de tocar igualmente com Ricardo Silva em guitarra de Coimbra e também de Lisboa.
Sonoridades diferentes e maravilhosas as que foram dadas a ouvir a quem se deslocou ao pavilhão Centro de Portugal para os espectáculos destes X Encontros. A guitarra de Coimbra, magnificamente tocada por Ricardo Silva, transformou-se num instrumento perfeitamente integrado na orquestra, mostrando possibilidades muito para além da sua utilização mais corrente. Tal como se mostrou capaz de se integrar brilhantemente na interpretação de músicas africanas tradicionais, em conjunto com a kora e também com guitarra tocada pelo interprete guineense Manecas Costa, em formações inéditas com novas sonoridades por vezes encantatórias.
Para além da kora, nestes X Encontros houve igualmente lugar à apresentação de temas com a viola toeira e fez-se a redescoberta de um notável e quase esquecido cultor da música de Coimbra, Nuno Guimarães.

Sempre com a guitarra como elo de ligação, houve instrumentos antigos que foram chamados para a actualidade, houve instrumentos vindos de muito longe, houve música erudita, houve música africana, houve redescoberta de um músico e houve também música tradicional de Coimbra tocada e cantada por estudantes actuais e antigos.
Sem deixar de respeitar a tradição, houve renovação e houve abertura ao exterior, pelo que a Orquestra Clássica do Centro está mais uma vez de parabéns. É nisto que consiste a afirmação cultural de uma cidade que, consciente do valor das suas tradições, se abre ao mundo e ao futuro, certa de que não pode viver num passado por mais brilhante que seja, e que se vive hoje num mundo aberto e em que todas as culturas devem ter lugar respeitando-se pelo melhor conhecimento mútuo.

segunda-feira, 14 de novembro de 2016

Trump: E o “imprevisto” aconteceu




Para quem tenha seguido as recentes eleições presidenciais americanas com algum interesse e fomos muitos, o resultado final foi uma surpresa atendendo às sondagens e, essencialmente, ao que ao longo da campanha fomos lendo, ouvindo e vendo nos mais diversos órgãos da comunicação social, nacionais e estrangeiros.
Por isso coloco no título desta crónica a palavra “imprevisto”. Trump foi dizendo, ao longo de toda a campanha, que iria mudar por completo o mapa político da América. Na verdade, foi isso mesmo que aconteceu, contra o que diziam as sondagens. A diferença que se verificou relativamente ao previsto, que dava Clinton como vencedora com uma margem de 3%, foi relativamente curta: menos 2%, tendo Clinton obtido mesmo mais votos do que Trump na globalidade. O problema é que as sondagens eram feitas a nível nacional e as eleições são feitas estado a estado, sendo estes muito diferentes entre si em termos de número de eleitores e, essencialmente, em termos sociais. 

Uma pequena alteração favorável a Trump a nível de vários estados mudou tudo e passou os representantes ao colégio eleitoral para o lado do candidato republicano. As técnicas das sondagens atingiram hoje um apreciável desenvolvimento. Sucedeu que, nesta campanha, houve um erro generalizado na consideração das diversas “fatias” do eleitorado, tendo sido claramente sub-estimado aquilo a que se chama “os trabalhadores brancos” e que eram os antigos “operários” outrora tão acarinhados pelas esquerdas que nos últimos anos têm vindo a transferir os suas cuidados para as mais diversas minorias. E isso, como se encontra claramente demonstrado na revista Economist, fez toda a diferença, já que são esses os que mais sofrem com as alterações económicas dos últimos anos, em particular depois da recessão de 2008. Acresce que não fazem parte daquelas minorias sistematicamente faladas na comunicação social pelo que foram esquecidos nas sondagens. Mas não por Trump, cuja mensagem agressiva de mudança contra o “establishment” que lhes retirou qualidade de vida, lhes foi estrategicamente direccionada com os resultados que agora se conhecem.
Esta vitória de Donald Trump não aparece isolada. Surge poucos meses depois do referendo da Grã Bretanha que optou pela saída da União Europeia numa afirmação contra o liberalismo e contra a globalização. Teme-se que este movimento populista venha ainda a influenciar decisivamente as próximas eleições em França, na Holanda e mesmo na própria Alemanha, o que alterará completamente a política internacional tal como a conhecemos hoje.
A comunicação social tem tido também um papel importante nesta evolução da situação política que se está a verificar nas democracias um pouco por todo o lado. A comunicação social tem alinhado sistematicamente com um “politicamente correcto” radical que abafa todas as opiniões que não vão com o “mainstream” instalado” e com as novas agendas de grande parte da esquerda que substituiu a procura do bem-estar da maioria das populações por uma re-engenharia social que a maioria nem compreende nem apoia, embora se cale. Algum dia apareceria a reacção a esta manipulação grosseira e arrogante da realidade, já que o cântaro tantas vezes vai à fonte que algum dia lá fica. Seria irónico, se não for trágico, que essa reação venha precisamente da parte de quem menos se imaginaria, já que tida como garantida, à partida
Outro grande derrotado nestas eleições foi o próprio Obama que sai da presidência pela porta baixa. Oito anos depois de ter corporizado a “mudança”, foi clamorosamente derrotado por uma nova vontade de “mudança”, não só pelo que fez ou não fez nesses mandatos, mas por se ter envolvido como o fez na campanha de Hillary Clinton, que assumiu ser a sua sucessora política e fez dessa continuidade o seu maior cavalo de batalha. Os dez milhões de votos perdidos em oito anos entre uma e outra eleição para algum lado foram e muitos terão mesmo ido para Trump.
Provavelmente os verdadeiros responsáveis por esta evolução política nunca o reconhecerão, por arrogância intelectual e por puro oportunismo político. Estas eleições merecem ainda muitos mais comentários. Acabaram por ter dois contendores finais que, cada um à sua maneira, não suscitaram grandes simpatias generalizadas, acabando por funcionar cada um deles como o mal menor contra o outro. Como referi em diversas vezes, Donald Trump não é do meu agrado: não gosto do estilo, não gosto da conversa e não gosto das amizades. E receio, fazendo votos que me engane que, no que a nós europeus interessa, vá muito mais longe nas suas políticas do que prometeu na campanha eleitoral.


segunda-feira, 7 de novembro de 2016

DYLAN: “The Times They Are A-Changin”




Para grande espanto de muitos, a Academia Sueca decidiu este ano entregar o prémio Nobel da Literatura a Bob Dylan.
Esta escolha levantou uma grande celeuma porque Bob Dylan é de facto conhecido no mundo inteiro pelas suas canções e não pelos seus livros de poemas, embora também os tenha. Discute-se o que é literatura, defendendo muitos que as letras das canções não têm a dignidade da poesia que deveria ser escrita e publicada em papel antes de, eventualmente, ser cantada. Uma escritora portuguesa chegou mesmo a sugerir que no próximo ano a Academia Sueca poderia entregar o prémio a Quim Barreiros. Para além do notório despeito revelado, o que mais importa nestes comentários, já que aquele não foi o único, é a revelação de um espírito de casta mais próprio de literatos e não de quem ama verdadeiramente a cultura no respeito pelos diversos cultores, pelas diferentes maneiras de ser expressa e até pelas transformações trazidas pelos novos processos de comunicação. A instituição de um cânon definidor do que é a literatura, fechando a porta a toda e qualquer intervenção que não o respeite diz mais sobre o conservadorismo de quem o defende do que sobre aquilo que se discute. Ironicamente trata-se do fecho de um círculo histórico: a transmissão da poesia ter-se-à iniciado através das canções, antes até do surgimento da escrita e a modernidade vem reconhecer o valor e a importância da poesia cantada nos dias de hoje. Claro que há muitos escritores que merecem o prémio Nobel da Literatura. Como há outros cantores cuja poesia é tão importante como a de Bob Dylan. Mas a decisão da Academia Sueca, para além de reconhecer a qualidade intrínseca da poesia de Bob Dylan, vinca a sua importância social nas últimas décadas e a influência que teve na juventude no mundo inteiro ao longo de várias gerações. O cantor adoptou desde muito cedo o nome de um poeta que muito admirava: Dylan Thomas; curiosamente, a sua ligação ao mundo literário foi sempre muito profunda, para além da adopção do nome Dylan, já que acompanhou de muito perto escritores como Allen Ginsberg e Jack Kerouac.

Apoiar ou discordar deste prémio não se trata de uma questão de gosto, que se coloca exactamente do mesmo modo em relação à obra dos galardoados com o Prémio Nobel da Literatura desde que o francês Sully Prudhomme recebeu o primeiro em 1901. Muitos não gostarão das canções de Bob Dylan ou da sua forma de cantar, ou mesmo da sua voz, e estão naturalmente no seu direito. A sua forma de estar ao longo da sua carreira foi-lhe granjeando admiradores incondicionais, mas também muitos descontentes. Às diversas classificações que lhe tentaram colar ao longo dos anos foi sempre respondendo com mudanças, por vezes radicais, na música que ia fazendo. E manifestando sempre independência de espírito e mesmo alheamento em relação ao mundo da música e de tudo o que gira à sua volta, tendo nessa atitude a mesma integridade e coerência da sua arte. Só quem não tem seguido a sua carreira poderá ficar admirado com o distanciamento perante a atribuição do prémio Nobel, que muitos logo classificaram como manifestação de arrogância.
A sua obra fica e a sua importância não lhe advém da atribuição deste prémio Nobel, mas do seu valor que levou a que Bob Dylan seja desde há muito tempo conhecido e admirado no mundo inteiro. Como é natural, algumas das suas canções são mais conhecidas do que outras e merecem ser destacadas pelos poemas e pela influência que tiveram.
“Blowing in the wind” é certamente uma delas e, na sua simplicidade dos primeiros tempos, foi esse verdadeiro hino da juventude, editado em 1963 e cantado desde então por uma infinidade de artistas, que o Papa João Paulo II destacou ao pedir a Bob Dylan que a cantasse. “Like a rolling stone” ou “Forever young” estão também entre as suas canções cujos poemas mais importância tiveram nos movimentos sociais dos anos 60 e 70, em todo o mundo.
Para terminar, o grito de Dylan em “The Times They Are A-Changin” é bem um símbolo dos tempos que vivemos, de que a atribuição do Prémio Nobel da Literatura a Bob Dylan não é mais do que um sinal bem visível.