O actual ministro da Economia reagiu ao sucedido no BES e na PT, manifestando publicamente uma enorme perplexidade traduzida na exclamação: estas situações "são completamente atípicas e, acima de tudo, inexplicáveis".
De facto, para alguma quase-elite portuguesa deslumbrada, o que se tem
passado nos últimos anos é inexplicável e, acima de tudo, motivo uma enorme
perplexidade. Já para o português comum, infelizmente não é nada surpreendente,
vindo na esteira do que se tem passado no nosso país há séculos.
Portugal teve um período histórico de grande notoriedade quando, muito por
acção de uma mulher inglesa que veio casar com um rei nosso e que educou os
seus filhos de uma forma diferente do habitual entre nós criando a chamada
“ínclita geração”, se virou para o único lado que podia para crescer e deu
origem aos descobrimentos marítimos. Após essas dezenas de anos ainda teve
alguma importância internacional, mas afundou-se numa exploração miserável de
escravos e das riquezas ultramarinas, sobretudo do Brasil. Até chegar ao início
do século XIX em que o rei e toda a corte fugiram para o Brasil perante a
invasão francesa, abandonando o povo à sua sorte, isto é, à completa destruição
e roubo de tudo o que tinha algum valor e à morte de milhares de portugueses e
miséria absoluta dos sobreviventes. Após o que seguiu uma guerra civil entre
facções de dois irmãos, cada um pior que o outro em todos os aspectos, deixando
o país ainda pior do que estava, se é que tal era possível.
Vinda a paz,
continuou a degradação do regime, até ao Ultimato Inglês e à bancarrota que só
acabámos de pagar poucos anos antes do século XXI. À Monarquia em que no fim o
próprio rei se queixava de ser rei de uma república, seguiu-se a Primeira
República que, de tal confusão que foi, deu logo origem a uma ditadura militar
que, por sua vez, vendo-se incapaz de governar, tratou de chamar um catedrático
de finanças de Coimbra para o fazer. E Salazar governou como sabia e como quis:
em ditadura, sem partidos políticos e portanto sem eleições, cuidando de todos
os aspectos da vida do país como se fosse a sua própria casa. Desaparecido
Salazar, o seu sucessor Marcelo Caetano enredou-se nas suas indecisões ficando
apenas o tempo necessário para ver o regime cair sem ninguém para o defender.
Vinda a Democracia com o 25 de Abril, e após os tempos habituais de
confusão que normalmente se seguem aos golpes de estado, rapidamente entrámos
em falência por duas vezes com a chamada do FMI para nos valer. Após o que
Mário Soares, olhando à sua volta, terá concluido que com aquela gente que via
a nossa economia não tinha hipóteses de crescer a sério. E tratou de chamar os
antigos que se tinham ido embora. Voltaram assim Espíritos Santo, Mellos,
Champalimaud e até Jardim Gonçalves ainda bancário, mas convidado a fazer um
Banco privado a sério. Cuidava Mário Soares que assim restauraria a elite
económica do país e o recolocaria nos índices de crescimento dos fins dos anos
sessenta, inícios de setenta.
Depois de centenas de milhares de milhões de
euros vindos da EU, acabámos novamente por ir à falência e vemos agora esfumar-se
à nossa frente um dos principais grupos económicos, com um ministro da Economia
a olhar espantado sem perceber nada do que vê e a dizê-lo publicamente.
O que há de comum em toda esta História?: não um povo incapaz ou calaceiro
que, quando vai para fora, produz mais e melhor que muitos outros O que há de
comum, em permanência secular, é a não existência de elites capazes e
empreendedoras. Se, desde os descobrimentos até ao fim do século XIX, a elite
nacional era constituída por uma aristocracia caduca e ridícula nas suas
preocupações de manifestação de importância, quer fosse ultramontana ou
liberal, no século XX viveu quase sempre à sombra do poder político e dele
dependeu. Mário Soares, na sua santa ingenuidade, acreditou que com as antigas elites
reconstruiria o país. Infelizmente enganou-se. Vemos hoje como boa parte dessas
supostas elites não é capaz de trabalhar e produzir em regime liberal e aberto
de sã concorrência, preferindo conúbios mais ou menos secretos com o Estado e
negociatas com fugas às responsabilidades fiscais que todos os cidadãos
partilham.
Não precisamos de elites pseudo aristocráticas com falso brilho e podres
por dentro. O que Portugal precisa é de elites económicas e empresárias capazes
de criar um lastro estabilizador que permita uma navegação do país rumo ao
crescimento e desenvolvimento, independentemente de políticos e das navegações
à vista.
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