terça-feira, 14 de maio de 2024

EUROPEUS VÃO A VOTOS

 


No próximo dia 9 de Junho os europeus vão a votos para escolher os deputados do Parlamento Europeu. Em Portugal a taxa de abstenção nestas eleições evoluiu de 27,8% em 1987 para 69,3% nas últimas eleições realizadas em 2019. Isto é, nestas últimas, em cada dez eleitores apenas votaram três.

Dir-se-ia que os portugueses, ou não se sentem europeus, ou não querem saber da União Europeia para nada. Contudo, em simultâneo, os portugueses contam-se entre os europeus que mais aprovam a participação na União. Um paradoxo dificilmente explicável, a não ser pelo volume de fundos europeus recebidos por Portugal desde a entrada na CEE que ocorreu em 12 de Junho de 1985. Na realidade, entre 1986 e 2022, o nosso país recebeu mais de 157 mil milhões de euros da União Europeia que são facilmente verificáveis em obras públicas e inúmeros melhoramentos assinalados pelas placas obrigatórias por todo o país. E isso os portugueses sabem-no bem! Isto é, olhamos para a União Europeia, não como um projecto político comum, mas sim com um banco onde vamos buscar dinheiro fácil, como aconteceu com o ouro do Brasil há três séculos.

Mas esse dinheiro recebido tem consequências, nem sempre as melhores. Todos sentimos que uma percentagem não negligenciável tem sido gasta em obras de fachada que não introduzem qualquer melhoria concreta na vida colectiva nem, e isso é o essencial, se traduz verdadeiramente num crescimento sustentável da economia e do bem-estar generalizado dos portugueses. Dado que nas obras comparticipadas pela União Europeia uma parte tem de ser assegurada pelos orçamentos nacionais, fácil é concluir pelo desvio de verbas essenciais ao bem-estar colectivo para obras e iniciativas várias que não são reprodutíveis.

Os partidos concorrentes às eleições também não têm ajudado muito. De facto, nos extremos do leque partidário encontramos discursos que, na prática, desligam os eleitores do verdadeiro interesse da União para todos os países membros, incluindo Portugal. À esquerda, os discursos populistas apontam a União Europeia como sendo responsável pelos nossos problemas económicos e financeiros. Na realidade, evoluíram um pouco, já que deixaram de exigir a saída de Portugal da União. Mas continuam a manipular o povo defendendo a saída da moeda única. A entrega ao Banco Central Europeu das competências relativas a políticas monetárias e de juros que são agora comuns aos países do Euro, é apresentada como perda de soberania e origem das nossas dificuldades periódicas, quando se verifica exactamente o contrário. O que seria da nossa economia se não pertencêssemos à moeda única? Em vez de crescimento, que apesar de fraco existe, teríamos pobreza e isolamento: mais orgulhosamente sós! À direita igual populismo tenta ressuscitar um nacionalismo serôdio que explora sentimentos retrógrados. Como se a moeda única e a livre circulação de pessoas e bens fossem algo prejudicial a um país que há séculos estava separado da Europa e que após a perda do Império reencontrou o espaço e os povos que estiveram na sua origem. Basta ler a entrevista ao Observador do cabeça de lista do Chega para se perceber como devemos evitar o populismo da extrema-direita e as suas mais desvairadas teorias da conspiração que fazem lembrar os “protocolos dos sábios de Sião”. Quer à esquerda, quer à direita, os sonhos dos extremos passam por destruir ou enfraquecer por dentro a União Europeia.


Já os partidos situados ao Centro, à esquerda e direita aparecem nestas eleições europeias com propostas muito semelhantes, aceitando e promovendo a participação numa União Europeia cada vez mais aprofundada. O que os separa tem mais a ver com a situação nacional e os seus objectivos a esse nível, não pretendendo enviar para Estrasburgo lutadores contra a União. Mais importante do que transportar para Bruxelas e Estrasburgo os problemas próprios nacionais, o que interessa é perceber que resposta se pretende dar às questões verdadeiramente decisivas para o futuro da União: a agressão russa, o isolacionismo americano e as mudanças climáticas.

A entrada na CEE, agora União Europeia, foi um momento de grande importância para Portugal que assim pertence de pleno direito a um dos blocos políticos e económicos mais avançados do mundo, que permanece firme na defesa da Liberdade, da paz e dos direitos humanos. Isso é bem mais importante do que ser considerada como mero financiador dos nossos investimentos.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 13 Maio 2024

Imagens recolhidas na internet

segunda-feira, 6 de maio de 2024

GOVERNO E OPOSIÇÃO TÊM RESPONSABILIDADES


 Passadas que estão as comemorações dos 50 anos sobre o 25 de Abril, regressou a vida habitual e o que os portugueses veem não é bonito de se ver e traz-nos a todos algo perplexos e muito preocupados com o futuro. As eleições de 10 de Março passado traduziram-se numa nova estrutura partidária em que os dois maiores partidos, o PSD e o PS ficaram praticamente empatados, aparecendo um terceiro partido, o Chega, bastante próximo. O estabelecimento de uma maioria obrigaria a que um dos dois maiores se associasse de alguma maneira ao CHEGA, ou que algum tipo de acordo se fizesse entre o PS e o PSD/CDS.

Pelo contrário, o PSD e o CDS formaram Governo minoritário, solução aceite pelo Presidente da República que, ao que se sabe, nem tentou que houvesse pelo menos um acordo parlamentar que assegurasse um mínimo de estabilidade política em matérias essenciais. É possível que tal atitude se deva a um mau momento do Presidente da República cuja autoridade se encontra claramente diminuída, mas a realidade é que estão criadas as condições para que o actual Governo vá encontrar condições muito difíceis para governar normalmente. Tal só será possível caso esteja disponível para negociar todas as decisões que tenham de passar pela Assembleia da República. Será ainda necessário que um dos dois partidos maiores da oposição, ou ambos, se abstenham de criar um permanente obstáculo à governação e ainda de tomar a iniciativa de propor e aprovar decisões contrárias à política governativa. Isto é, será necessário que o Governo possa governar e que o faça e, por outro lado, que os partidos da oposição não cedam à tentação de transformar o Parlamento em entidade governativa em vez de fiscalizar a actividade do Governo, como estipula a Constituição.

Durante o período comemorativo do 25 de Abril, pudemos ouvir, e bem, que se deve defender a Liberdade e a Democracia todos os dias, que nunca se devem ter como garantidas. Para tal, o primeiro dever dos líderes políticos deve ser evitar a irresponsabilidade e o populismo. No entanto, o que todos vemos é o contrário, numa demonstração evidente do “faz o que eu digo e não o que eu faço”. A aprovação do fim das portagens nas ex-SCUTS na Assembleia da República pelo Chega e pelo PS é disso prova evidente. Um partido diz que essa medida constava do seu programa eleitoral o que não faz sentido, porque não é governo. O outro segue a sua política populista e irresponsável de terra queimada ao prometer tudo a todos em simultâneo, sem cuidar minimamente das condições financeiras do país.

Tudo indica que, 50 anos depois da instauração da Democracia, nos voltamos a aproximar perigosamente do que se passou na primeira República. O interesse nacional é esquecido em função dos interesses eleitorais imediatos dos partidos. Os fundamentos da Democracia poderão ser minados através de uma utilização egoísta dos meios proporcionados por essa mesma democracia, como infelizmente a História nos ensina com demasiados exemplos.


Perante este cenário o Senhor Presidente da República pode vir a ter de tomar decisões difíceis e importantes a curto prazo. No jantar com os correspondentes estrangeiros as referências que fez ao actual e ao ex-Primeiro Ministro bem como à Procuradora-Geral da República e às reparações históricas foram no mínimo infelizes, mas situam-se na área da política. Já a referência às suas relações familiares revestiu-se de um carácter completamente diferente. E o carácter dessa referência poderá ter minado a confiança de grande parte dos portugueses no Presidente da República de uma forma possivelmente irreversível. O que não deixará de ter consequências na relação dos portugueses com a instituição da Presidência da República criando um ambiente político degradado.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 6 de Maio de 2024

Imagens retiradas da internet