jpaulocraveiro@ gmail.com "Por decisão do autor, o presente blogue não segue o novo Acordo Ortográfico"
terça-feira, 29 de dezembro de 2020
segunda-feira, 28 de dezembro de 2020
ANO NOVO, VIDA COMUM?
Está quase a acabar este ano de 2020, que é um ano que todos gostaríamos de esquecer, mas que vamos todos, certamente, recordar pelos mais diversos motivos. Alguns bons, que têm a ver essencialmente com a resposta a uma pandemia viral. Pela primeira vez a humanidade foi capaz de identificar com rigor o vírus causador da pandemia pouco tempo depois do seu início e, muito importante, conseguiu desenvolver vacinas específicas em menos de um ano. Proeza farmacológica só tornada possível pelo desenvolvimento científico na área do ADN e ARN que se verificou nas últimas décadas e da capacidade tecnológica associada à investigação dos grandes laboratórios farmacêuticos. O investimento público de diversos países no apoio à investigação com vista ao desenvolvimento destas vacinas terá sido fundamental para que os prazos de desenvolvimento tenham sido tão encurtados, sabendo-se do tempo que normalmente é necessário para preparar novas vacinas. A resposta dos serviços de saúde um pouco por todo o mundo, em termos tecnológicos, humanos e organizacionais marcou a diferença relativamente a outras pandemias da História. Entre nós a dádiva pessoal e profissional dos profissionais de saúde, aos vários níveis, que tiveram que lidar directamente com os doentes COVID-19, em particular nos serviços cuidados intensivos, foi e é de registar, de louvar e de agradecer por toda a sociedade por ter, tantas vezes, raiado o puro heroísmo.
Mas, embora não se possa comparar com outras pandemias ao longo da História, as consequências da pandemia são, ainda assim, graves tanto a nível mundial, como no nosso país. Na totalidade verifica-se a existência de cerca de milhão e meio de mortes no mundo, havendo a registar, entre nós mais de 6.400 óbitos devidos ao vírus SARS-CoV-2 com cerca de 400.000 casos confirmados. No ano de 2020 deverá verificar-se um total de mais de 120.000 óbitos em Portugal, algo que não sucedia desde 1946. Se o envelhecimento da população pode explicar uma parte deste aumento, a verdade é que há 4 a 5 mil mortes não devidas ao COVID-19, sendo ainda de ter em conta a radical diminuição de gripes relativamente aos anos anteriores. Isto é, podemos felicitar-nos dizendo que «o SNS respondeu bem», que tal não corresponde à verdade; há estes óbitos a mais e sabemos todos muito bem que milhares de operações cirúrgicas ficaram por realizar, ainda muitas mais consultas por fazer e, o que pode revelar-se trágico nos próximos anos, muitos cancros ficaram por ser precocemente detectados.
As consequências directas na economia, quer na produção, quer no emprego estão ainda por se conhecer na totalidade, dados os apoios excepcionais e temporários que o Estado proporcionou a empresas e pessoas individuais, embora esse apoio tivesse sido dos mais reduzidos da Europa, pela nossa fragilidade orçamental e enorme dívida externa, nomeadamente pública. Os apoios têm-se traduzido essencialmente em empurrar as dificuldades para diante, pelo que mais cedo ou mais tarde as falências e desemprego irão fatalmente crescer de uma forma que até hoje desconhecemos. Qualquer que seja a dimensão dos apoios financeiros europeus, não será suficiente para cobrir as quebras já verificadas na economia e nas famílias, pelo que a recuperação dos níveis de 2019 estará ainda muito longe.
O Primeiro-Ministro reconheceu há poucos dias que foram cometidos erros pelo Governo na resposta à pandemia. Ainda bem que o fez, mas só manifestou uma evidência, aos olhos dos portugueses, para quem a realidade não se limita aos telejornais das televisões e que não podem deixar de notar o crescente número de pessoas a precisar de ajuda alimentar. Uma das consequências mais evidentes da pandemia é o agravar das desigualdades sociais atirando para a miséria uma larga franja da classe média.
A luta contra a pandemia é uma verdadeira guerra que se trava em diversas frentes; científica, sanitária, económica, educacional e social. Para além do estabelecimento do medo generalizado, é sabido que nas guerras a primeira coisa a morrer é a verdade. Também nesta guerra a mentira, a desinformação e mesmo as teorias da conspiração têm tido um palco enorme de actuação. Cabe-nos a nós um esforço, ainda maior do que em tempos comuns, para perceber quem, como e porquê nos tenta manipular, mantendo uma atitude de abertura à ciência e a todos os que, com verdade, nos tentam apoiar e mesmo orientar neste mar encapelado de informação.
domingo, 27 de dezembro de 2020
sexta-feira, 25 de dezembro de 2020
quinta-feira, 24 de dezembro de 2020
quarta-feira, 23 de dezembro de 2020
Economia sem alma e sem sentido.
Abates de animais para instalar painéis solares na Torre Bela começaram há meses - TSF
segunda-feira, 21 de dezembro de 2020
O dom de ouvir
Quando leio ou ouço cientistas e investigadores tecnológicos descrever com entusiasmo a novidade de um futuro cheio de inteligência artificial em que numerosos sensores formarão uma imagem o mais próxima possível da realidade, não posso deixar de sorrir. É que o nosso cérebro com os seus cinco sentidos já faz isso mesmo e «trata» toda a informação que recolhe de uma forma que desconfio que será impossível de replicar algum dia com computadores, ainda que sejam os novos quânticos: é que, como nos ensina um grande cientista português, António Damásio, o nosso corpo alia inteligência à emoção. Ainda por cima esses «inputs» não materiais são por todos nós tratados em simultâneo e guardados para mais tarde serem recordados de forma insuspeitada em relação a cheiros, sons ou determinadas situações específicas, como passar pelo mesmo local em que foram originados.
E uma das «informações» que os nossos sentidos transportam para o nosso cérebro é a dos sons. Por vezes essa informação não é mais do que ruído, outras vezes encanta-nos por trazer a Natureza para dentro de nós como sucede com o barulho das ondas do mar ou o cantar dos pássaros e outras vezes maravilha-nos pela capacidade humana de construir o que chamamos música, umas vezes simples outras de uma complexidade extraordinária.
No dia em que escrevo esta crónica passam 250 anos sobre o dia de baptismo de uma das personalidades mais marcantes da História da Humanidade, cuja data exacta de nascimento não é conhecida: Ludwig van Beethoven. Claro que todos nós o conhecemos como um dos maiores compositores que já viveram, mas Beethoven foi muito para além disso.
É que Beethoven simboliza também o poder do cérebro humano. Tal como Einstein muito mais tarde viria a descobrir aspectos encobertos da ciência apenas através do desenvolvimento de teorias físicas expressas por fórmulas matemáticas que só mais de cem anos depois a experimentação conseguiu provar, Beethoven desenvolveu a sua música no cérebro. E só depois a transcrevia para o papel, porque durante a maior parte da sua vida Beethoven esteve surdo.
A obra-prima que é a sua 9ª Sinfonia foi elaborada, em toda a sua complexidade, no cérebro do compositor. Aquando da sua estreia, o compositor nem sequer se apercebeu de que a sala vinha abaixo com os aplausos entusiásticos do público, porque não os ouvia como não ouvia a orquestra, as quatro vozes solistas e o coro que cantaram o poema de Schiller.
Para além da importância cultural que todos lhe reconhecemos, a música tem ainda a capacidade de nos oferecer a possibilidade de fugir intelectualmente ao confinamento provocado pela pandemia que com tanta perplexidade, medo e sofrimento quase nos destruiu o ano que agora acaba. Esta é a crónica «Visto de Dentro» que antecede o Natal e esta é precisamente a única época do ano que nos oferece o encanto de inúmeras músicas próprias que nos elevam e acalmam o espírito. Não será por acaso que o espírito natalício desde há muitos séculos entrou na cultura ocidental e não só, tendo inspirado S. Francisco de Assis e o seu Presépio e tantas melodias e poemas que apelam à fraternidade e simplicidade da mensagem do amor entre os homens de boa vontade.
De entre as músicas tradicionais da época do Natal, relembro "O du fröhliche" do séc. XVIII com poema de Johannes Daniel Falk cantada por Anneliese Rothenberger ou «O Pequeno Tambor» pelo Harry Simeone Chorale ou mesmo por Bing Crosby com David Bowie e «Feliz Navidade» de Jose Feliciano. Mas também «White Christmas» dos «nossos» Marina Pacheco e Paulo Ferreira com o Ensemble Orquestra Clássica do Centro.
Evidentemente, não é possível deixar de fazer uma menção especial a essa grande, enorme intérprete de canções de Natal que foi a inesquecível Mahalia Jackson, em particular a sua interpretação de «Silent Night». Tal como não se pode deixar de referir o «Adestes Fideles», tema tradicional de Natal tradicional tão antigo e que ainda tantos, eventualmente de forma errada, atribuem ao rei D. João IV talvez por ser tocado na capela da embaixada de Portugal em Londres e por isso mesmo ser conhecido por «Hino Português». E recordar José Afonso e a sua «Canção de Embalar».
A todos os leitores do Diário de Coimbra um Feliz e Santo Natal, com votos de um novo ano decididamente melhor do que este que agora termina, se possível com a família e a boa companhia da música de Natal.
Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 21 de Dezembro de 2020
ESTRELA DE BELÉM ?
Grande Conjunção de Júpiter e Saturno
Hoje, pelas 18:37, verifica-se um acontecimento astronomicamente muito especial, que é a conjunção planetária entre os dois planetas Júpiter e Saturno: uma nova “Estrela de Belém”.
SOLSTÍCIO DE INVERNO
«O Solstício de Inverno ocorre hoje, 21 de Dezembro de 2020, às 10h02min, marcando o início da estação no hemisfério norte (a mais fria apesar da Terra vir a estar o mais perto do sol a 2 de janeiro). O sol neste dia de solstício estará o mais baixo possível no céu em Lisboa e aquando da sua passagem meridiana atingirá a altura mínima de 28° .
A duração do dia no Solstício de Inverno é a mais curta. A 21 de Dezembro de 2020 o disco solar nasceu às 07:51:19 horas e pôr-se-á às 17:18:23 horas em Lisboa, assim a duração do dia será de 09:27:04 horas»
De: Observatório Astronómico de Lisboa.
Foto de NASA
Hoje é, portanto, no nosso Hemisfério Norte, o dia mais curto do ano. O que é óptimo. A partir de hoje, apesar de entrarmos no Inverno, os dias começam a crescer até Junho.
sábado, 19 de dezembro de 2020
quinta-feira, 17 de dezembro de 2020
segunda-feira, 14 de dezembro de 2020
Eleições presidenciais
Daqui a pouco mais de um mês vamos escolher o presidente da República para os próximos cinco anos. Mas esta eleição tem características muito próprias já que, na realidade se trata de uma reeleição por duas razões concretas: em primeiro lugar, todos os presidentes da presente República foram reeleitos e em segundo lugar porque quem se recandidata é Marcelo Rebelo de Sousa.
Muito pessoalmente, estas eleições surgem numa altura da minha vida, interesse isso a quem interessar, em que considero a independência pessoal, a todos os níveis, um bem demasiado valioso para ser desperdiçado. Em consequência nada nem ninguém me influencia hoje nas minhas opiniões e tomadas de posição no espaço público, em que incluo estas crónicas semanais que o Diário de Coimbra me publica desde há 15 anos.
Depois, a situação do país é de uma complexidade verdadeiramente extraordinária, com factores que fogem completamente ao controlo de quem tem que assumir responsabilidades. Essa circunstância decorrente da pandemia do COVID-19 exige, ou deveria exigir, uma atitude de rigor e absoluto respeito pela verdade, em todas as vertentes da governação e mesmo da actividade política, desde o Governo às Juntas de Freguesia. E exige, também, que quem cuida dos portugueses e da coisa pública seja capaz de enfrentar dificuldades impensáveis há escassos dez meses.
Deveremos ter ainda em conta o fenómeno da abstenção em Portugal. Nas últimas presidenciais de 2016, foi de 51.34% isto é, a votação obtida pelo vencedor e actual presidente que foi de 2.411.925 votos correspondentes a 52% dos votos expressos, na realidade correspondeu à vontade de um pouco menos de 25% dos portugueses inscritos como eleitores que eram 9.741.377. A dimensão da abstenção significa que mais de metade dos portugueses não querem, não podem por qualquer motivo ou não estão para se maçar para participar num acto cívico tão importante como escolher o Presidente da República por cinco anos. A representatividade real dos eleitos perante o universo dos portugueses é muito baixa. E isso deveria levar os eleitos, quer Presidente da República, quer Deputados, a questionar-se e a tudo fazer para que os portugueses se sintam realmente representados por eles.
E é tendo em conta estas circunstâncias que, como qualquer português comum, me coloco perante as diversas candidaturas já apresentadas que tudo indica serão as definitivas, não havendo outras hipóteses de escolha que não estas. Em primeiro lugar há as candidaturas saídas de partidos. Estão nesta situação João Ferreira do PCP, Marisa Matias do BE, André Ventura do Chega e Tiago Mayan Gonçalves da Iniciativa Liberal
As duas candidaturas à esquerda buscam marcar terreno por parte dos respectivos partidos tentando segurar os respectivos eleitores habituais. Embora possam almejar conseguir algum apoio exterior fruto das características pessoais de João Ferreira e Marisa Matias, na realidade não trazem nada de novo, mesmo com a candidata do BE a afirmar-se surpreendentemente como social-democrata. O caso de André Ventura é diferente, dado que o Chega é um partido construído à sua volta, muito personalizado: o objectivo será obter mais votos que mais tarde venham a ampliar os resultados eleitorais para a assembleia da República, dando continuidade à sua cruzada contra pobres e desfavorecidos da sociedade. Quanto a Tiago Gonçalves a sua intervenção pública pessoal ainda não deu para se perceber ao que vem, para além de também tentar marcar terreno do partido.
E depois há Ana Gomes e Marcelo Rebelo de Sousa.
Com o voluntarismo que se lhe reconhece, Ana Gomes avançou de forma independente do seu partido, o PS. É evidente ter consigo uma parte da família socialista que, ou não se sente bem com António Costa, ou não admite que socialistas votem em Marcelo. A questão da vacina contra a gripe que se passou já depois de ser candidata presidencial não deverá ser uma grande ajuda para a candidata: tratou do seu problema pessoal com expedientes, ultrapassando a lei e pior, colocando em causa terceiros como as farmácias e o próprio governo, com uma hipocrisia impossível de se aceitar e incompreensível em alguém que protagoniza uma candidatura presidencial.
domingo, 13 de dezembro de 2020
sábado, 12 de dezembro de 2020
Incompatibilidades para Juizes
A Associação sindical dos juízes defende que, depois do exercício de determinados cargos, designadamente políticos, os juízes não possam voltar ao exercício de funções judiciais. Concordo e digo isto há muito tempo:
"A ASJP considera ainda fundamental haver uma alteração nas práticas dos Conselhos Superiores sobre a nomeação de juízes para comissões de serviço não judiciais «em cargos que impliquem o estabelecimento de relações de confiança ou dependência de interesses de natureza política, económica, empresarial, desportiva ou outra, incompatíveis com a percepção pública de independência e imparcialidade da justiça», defendendo que seja proibido o regresso a funções judiciais após o exercício de certos cargos políticos"
sexta-feira, 11 de dezembro de 2020
Títulos enganadores
O Estado não subsidia as empresas. Devolve-lhes o que lhes tira. Com o aumento do salário mínimo, as empresas vêem os seus custos salariais aumentar, sendo esse aumento estimado em 74 milhões. É esse montante que o Estado devolve, não é subsídio.
quinta-feira, 10 de dezembro de 2020
Há dias assim
Dez milhões de ortografias
É isto mesmo. E qualquer dia, em vez de cinco teremos dez milhões de ortografias. Uma por cada português. Ficaremos muito mais ricos.
quarta-feira, 9 de dezembro de 2020
Investimento público em Portugal
Formidável.
Portugal tem a taxa de investimento público mais baixa da OCDE. Devemos agradecer a toda a geringonça com Costa à cabeça.
segunda-feira, 7 de dezembro de 2020
Sobre obras públicas
Uma das obras públicas de que ouvimos falar desde os anos 60 do século passado é o «novo aeroporto de Lisboa», já previsto nos Planos de Fomento do antigo regime e que é de novo notícia nos jornais. Parece que, como agora já não há pressa para o construir porque o turismo foi ao fundo com a pandemia, abre-se a possibilidade de o aeroporto do Montijo ser afinal sujeito a uma avaliação de impacte ambiental estratégica. Isto é, os estudos ambientais deverão incluir uma avaliação ambiental comparativa com outras hipóteses de localização, o que antes foi considerado desnecessário. Algo que parece evidente, para que a escolha do local seja a mais correcta, surge apenas como possível em consequência da pandemia, significando que, em 2020, ainda se anda aos papéis com a escolha da localização do novo aeroporto de Lisboa. De tal forma assim é, que até aparecem uns iluminados a propor Beja como solução de novo aeroporto para Lisboa assim se tentando resgatar, com outro disparate, a má despesa pública que aquele aeroporto significou.
Felizmente, também entre nós já se fazem estudos de custo/benefício que justifiquem novas obras públicas. Contudo, mesmo assim, ainda andamos frequentemente por maus caminhos. Desde logo, no que diz respeito aos benefícios, já que são muitas vezes habilmente exagerados de propósito, para justificar a vontade de obra dos decisores políticos, embora os autores coloquem sempre umas letrinhas pequenas no fim, com os pressupostos utilizados, assim se livrando de responsabilidades futuras. O caso mais evidente é o das auto-estradas cujo tráfego real é muitas vezes inferior ao previsto nos estudos económicos que justificaram a sua construção.
Mas há ainda a questão dos custos previstos. Não me refiro aos custos de instalação/construção que tantas vezes ultrapassam de longe os custos previstos, como aconteceu na ponte Rainha Santa que veio a custar mais do dobro do valor adjudicado quando o então ministro das obras públicas tinha garantido que seria uma obra modelo, «nem mais um dia, nem mais um tostão». Refiro-me a algo que em Portugal é ainda uma pecha nas obras públicas, provavelmente porque quem as manda fazer não está minimamente preocupado com isso, já que não terá a ver com essa responsabilidade.
Refiro-me, em concreto, à questão da manutenção. Há países em que, desde há muito, o custo da análise de oportunidade inclui obrigatoriamente os custos de manutenção durante a vida útil da obra. O que qualquer engenheiro sabe perfeitamente que pode ser decisivo para fazer ou não a obra, ou mesmo na escolha da solução técnica a adoptar. E há dois tipos de manutenção: aquela que é necessária para o correcto e contínuo funcionamento do equipamento e aquela outra que tem a ver com a segurança que pode por em causa a sua existência.
Para ilustrar o que acima digo, vou utilizar um exemplo de uma obra que todos os conimbricenses conhecem bem: o Estádio Cidade de Coimbra, construído há quase vinte anos. Para além da manutenção diária que tem a ver com limpeza, higiene, e alguns equipamentos correntes como elevadores, há outros aspectos da manutenção muito importantes a ter em conta. O sistema de iluminação do campo permite que se jogue à noite com transmissão televisiva. Se falhar a electricidade da rede existe um gerador que deverá estar perfeitamente activo em cerca de 20 segundos e, para que não se note qualquer falha de iluminação, existe um sistema sofisticado e caríssimo de unidades de UPS com baterias que asseguram a iluminação contínua até o gerador passar a garantir o mesmo. Trata-se de algo que, se não funcionar, não coloca o edifício em perigo, apenas não permite a sua utilização em pleno: a sua manutenção é muito importante, mas não crucial. Já o mesmo não se pode dizer da cobertura das bancadas sujeita ao peso próprio, mas também ao vento. Trata-se de uma estrutura mista aço/betão em que as forças de tracção são conduzidas por tirantes às vigas de betão que, por sua vez e como é natural, funcionam à compressão. O sistema exige manutenção, não diária, mas de dez em dez anos, com verificação da tensão de aperto de todos os parafusos (e são muitos) além de controlo das pinturas das peças metálicas: aqui já se trata de uma manutenção que visa a própria estabilidade estrutural do edifício. Numa obra pública desta dimensão, com um custo inicial da ordem dos 40 milhões de euros, a manutenção é uma parte essencial do investimento e não pode ser descurada em momento algum, de acordo com as regras estabelecidas aquando da construção, o que estou certo ser feito com profissionalismo e diligência.
Como se vê, através do exemplo apresentado, há toda uma cultura de rigor na análise das diversas opções técnicas das obras públicas, para além das decisões políticas, que deve continuar a ser implantada no país, para que os impostos dos portugueses sejam sempre aplicados com a maior eficiência. E o custo da manutenção, seja em estádios, seja em pontes ou mesmo estradas, é crucial para a determinação dos custos totais de investimento.
Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 7 de Novembro 2020