segunda-feira, 6 de maio de 2024

GOVERNO E OPOSIÇÃO TÊM RESPONSABILIDADES


 Passadas que estão as comemorações dos 50 anos sobre o 25 de Abril, regressou a vida habitual e o que os portugueses veem não é bonito de se ver e traz-nos a todos algo perplexos e muito preocupados com o futuro. As eleições de 10 de Março passado traduziram-se numa nova estrutura partidária em que os dois maiores partidos, o PSD e o PS ficaram praticamente empatados, aparecendo um terceiro partido, o Chega, bastante próximo. O estabelecimento de uma maioria obrigaria a que um dos dois maiores se associasse de alguma maneira ao CHEGA, ou que algum tipo de acordo se fizesse entre o PS e o PSD/CDS.

Pelo contrário, o PSD e o CDS formaram Governo minoritário, solução aceite pelo Presidente da República que, ao que se sabe, nem tentou que houvesse pelo menos um acordo parlamentar que assegurasse um mínimo de estabilidade política em matérias essenciais. É possível que tal atitude se deva a um mau momento do Presidente da República cuja autoridade se encontra claramente diminuída, mas a realidade é que estão criadas as condições para que o actual Governo vá encontrar condições muito difíceis para governar normalmente. Tal só será possível caso esteja disponível para negociar todas as decisões que tenham de passar pela Assembleia da República. Será ainda necessário que um dos dois partidos maiores da oposição, ou ambos, se abstenham de criar um permanente obstáculo à governação e ainda de tomar a iniciativa de propor e aprovar decisões contrárias à política governativa. Isto é, será necessário que o Governo possa governar e que o faça e, por outro lado, que os partidos da oposição não cedam à tentação de transformar o Parlamento em entidade governativa em vez de fiscalizar a actividade do Governo, como estipula a Constituição.

Durante o período comemorativo do 25 de Abril, pudemos ouvir, e bem, que se deve defender a Liberdade e a Democracia todos os dias, que nunca se devem ter como garantidas. Para tal, o primeiro dever dos líderes políticos deve ser evitar a irresponsabilidade e o populismo. No entanto, o que todos vemos é o contrário, numa demonstração evidente do “faz o que eu digo e não o que eu faço”. A aprovação do fim das portagens nas ex-SCUTS na Assembleia da República pelo Chega e pelo PS é disso prova evidente. Um partido diz que essa medida constava do seu programa eleitoral o que não faz sentido, porque não é governo. O outro segue a sua política populista e irresponsável de terra queimada ao prometer tudo a todos em simultâneo, sem cuidar minimamente das condições financeiras do país.

Tudo indica que, 50 anos depois da instauração da Democracia, nos voltamos a aproximar perigosamente do que se passou na primeira República. O interesse nacional é esquecido em função dos interesses eleitorais imediatos dos partidos. Os fundamentos da Democracia poderão ser minados através de uma utilização egoísta dos meios proporcionados por essa mesma democracia, como infelizmente a História nos ensina com demasiados exemplos.


Perante este cenário o Senhor Presidente da República pode vir a ter de tomar decisões difíceis e importantes a curto prazo. No jantar com os correspondentes estrangeiros as referências que fez ao actual e ao ex-Primeiro Ministro bem como à Procuradora-Geral da República e às reparações históricas foram no mínimo infelizes, mas situam-se na área da política. Já a referência às suas relações familiares revestiu-se de um carácter completamente diferente. E o carácter dessa referência poderá ter minado a confiança de grande parte dos portugueses no Presidente da República de uma forma possivelmente irreversível. O que não deixará de ter consequências na relação dos portugueses com a instituição da Presidência da República criando um ambiente político degradado.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 6 de Maio de 2024

Imagens retiradas da internet

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