sexta-feira, 11 de dezembro de 2020

Títulos enganadores

 O Estado não subsidia as empresas. Devolve-lhes o que lhes tira. Com o aumento do salário mínimo, as empresas vêem os seus custos salariais aumentar, sendo esse aumento estimado em 74 milhões. É esse montante que o Estado devolve, não é subsídio.



quinta-feira, 10 de dezembro de 2020

Há dias assim

 

Há cada vez mais dias assim: morreu o Sr. Fernando Vale; morreu Paolo Rossi.
Em tempo: morreu também o meu querido Amigo Sr. Manuel Mendes. Choro.

J.S. Bach - Cantata No.106〈Gottes Zeit ist die allerbeste Zeit〉BWV 106 /...

Dez milhões de ortografias

 É isto mesmo. E qualquer dia, em vez de cinco teremos dez milhões de ortografias. Uma por cada português. Ficaremos muito mais ricos.


 

quarta-feira, 9 de dezembro de 2020

Investimento público em Portugal

 Formidável.

Portugal tem a taxa de investimento público mais baixa da OCDE. Devemos agradecer a toda a geringonça com Costa à cabeça.



segunda-feira, 7 de dezembro de 2020

Sobre obras públicas

 


Uma das obras públicas de que ouvimos falar desde os anos 60 do século passado é o «novo aeroporto de Lisboa», já previsto nos Planos de Fomento do antigo regime e que é de novo notícia nos jornais. Parece que, como agora já não há pressa para o construir porque o turismo foi ao fundo com a pandemia, abre-se a possibilidade de o aeroporto do Montijo ser afinal sujeito a uma avaliação de impacte ambiental estratégica. Isto é, os estudos ambientais deverão incluir uma avaliação ambiental comparativa com outras hipóteses de localização, o que antes foi considerado desnecessário. Algo que parece evidente, para que a escolha do local seja a mais correcta, surge apenas como possível em consequência da pandemia, significando que, em 2020, ainda se anda aos papéis com a escolha da localização do novo aeroporto de Lisboa. De tal forma assim é, que até aparecem uns iluminados a propor Beja como solução de novo aeroporto para Lisboa assim se tentando resgatar, com outro disparate, a má despesa pública que aquele aeroporto significou.

Felizmente, também entre nós já se fazem estudos de custo/benefício que justifiquem novas obras públicas. Contudo, mesmo assim, ainda andamos frequentemente por maus caminhos. Desde logo, no que diz respeito aos benefícios, já que são muitas vezes habilmente exagerados de propósito, para justificar a vontade de obra dos decisores políticos, embora os autores coloquem sempre umas letrinhas pequenas no fim, com os pressupostos utilizados, assim se livrando de responsabilidades futuras. O caso mais evidente é o das auto-estradas cujo tráfego real é muitas vezes inferior ao previsto nos estudos económicos que justificaram a sua construção.

Mas há ainda a questão dos custos previstos. Não me refiro aos custos de instalação/construção que tantas vezes ultrapassam de longe os custos previstos, como aconteceu na ponte Rainha Santa que veio a custar mais do dobro do valor adjudicado quando o então ministro das obras públicas tinha garantido que seria uma obra modelo, «nem mais um dia, nem mais um tostão». Refiro-me a algo que em Portugal é ainda uma pecha nas obras públicas, provavelmente porque quem as manda fazer não está minimamente preocupado com isso, já que não terá a ver com essa responsabilidade.

Refiro-me, em concreto, à questão da manutenção. Há países em que, desde há muito, o custo da análise de oportunidade inclui obrigatoriamente os custos de manutenção durante a vida útil da obra. O que qualquer engenheiro sabe perfeitamente que pode ser decisivo para fazer ou não a obra, ou mesmo na escolha da solução técnica a adoptar. E há dois tipos de manutenção: aquela que é necessária para o correcto e contínuo funcionamento do equipamento e aquela outra que tem a ver com a segurança que pode por em causa a sua existência.


Para ilustrar o que acima digo, vou utilizar um exemplo de uma obra que todos os conimbricenses conhecem bem: o Estádio Cidade de Coimbra, construído há quase vinte anos. Para além da manutenção diária que tem a ver com limpeza, higiene, e alguns equipamentos correntes como elevadores, há outros aspectos da manutenção muito importantes a ter em conta. O sistema de iluminação do campo permite que se jogue à noite com transmissão televisiva. Se falhar a electricidade da rede existe um gerador que deverá estar perfeitamente activo em cerca de 20 segundos e, para que não se note qualquer falha de iluminação, existe um sistema sofisticado e caríssimo de unidades de UPS com baterias que asseguram a iluminação contínua até o gerador passar a garantir o mesmo. Trata-se de algo que, se não funcionar, não coloca o edifício em perigo, apenas não permite a sua utilização em pleno: a sua manutenção é muito importante, mas não crucial. Já o mesmo não se pode dizer da cobertura das bancadas sujeita ao peso próprio, mas também ao vento. Trata-se de uma estrutura mista aço/betão em que as forças de tracção são conduzidas por tirantes às vigas de betão que, por sua vez e como é natural, funcionam à compressão. O sistema exige manutenção, não diária, mas de dez em dez anos, com verificação da tensão de aperto de todos os parafusos (e são muitos) além de controlo das pinturas das peças metálicas: aqui já se trata de uma manutenção que visa a própria estabilidade estrutural do edifício. Numa obra pública desta dimensão, com um custo inicial da ordem dos 40 milhões de euros, a manutenção é uma parte essencial do investimento e não pode ser descurada em momento algum, de acordo com as regras estabelecidas aquando da construção, o que estou certo ser feito com profissionalismo e diligência.

Como se vê, através do exemplo apresentado, há toda uma cultura de rigor na análise das diversas opções técnicas das obras públicas, para além das decisões políticas, que deve continuar a ser implantada no país, para que os impostos dos portugueses sejam sempre aplicados com a maior eficiência. E o custo da manutenção, seja em estádios, seja em pontes ou mesmo estradas, é crucial para a determinação dos custos totais de investimento.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 7 de Novembro 2020

 

The Little Drummer Boy

Pearl Harbour foi há 79 anos

Em  7 de Dezembro de 1941, faz hoje 79 anos, o Japão atacou a base naval norte-americana de Pearl Harbour, no Hawai o que levou os EUA a entrar na II Guerra Mundial.

Há quase três anos escrevi aqui sobre esse acontecimento:

( https://vistodedentro.blogspot.com/2017/01/a-guerra-e-as-escolhas.html)

No passado mês de Dezembro cumpriram-se 75 anos sobre um dos mais célebres episódios militares da História, o ataque japonês a Pearl Harbour na ilha havaiana de Oahu, que ditou a entrada dos EUA na II Guerra Mundial. Neste ataque surpresa foram destruídos vários couraçados, tendo sido severamente danificados vários outros couraçados, contratorpedeiros e cruzadores, e morreram mais de 2.400 americanos. Este episódio tem sido abordado quer na literatura, quer no cinema, sendo hoje bem conhecido, tal como as suas consequências que acabaram por levar à rendição do Japão após o lançamento das bombas atómicas em Hiroshima e Nagasaki em Agosto de 1945.

O ataque a Pearl Harbour teve um estratega, o Almirante japonês Isoroku Yamamoto. Após o ataque, fez um comentário em que referia “recear que apenas tivesse acordado um gigante adormecido”. E Yamamoto sabia do que falava. Apesar de considerado um sucesso, na realidade não estava nenhum porta-aviões americano em Pearl Harbour, os submarinos não foram danificados e os depósitos de combustível também escaparam e ele sabia o que isso significava. Quando jovem Yamamoto foi para os EUA onde estudou na Universidade de Harvard então, como hoje, uma das universidades mais prestigiadas. Aí, a sua percepção do mundo mudou certamente da visão imperialista e fechada da filosofia medieval da “honra” dos samurais para uma abertura cosmopolita, mudança que terá sido ainda acentuada pelas suas funções posteriores de Adido Naval em Washington.

Por tudo isso era um opositor declarado à entrada do Japão em guerra com os EUA. Além de que, sendo um profundo conhecedor desse país onde vivera tantos anos, sabia exactamente o que significaria para o Japão entrar em conflito militar com os EUA. Por causa dessas suas posições, a sua vida ficou mesmo em perigo junto da clique militarista que rodeava o Imperador pelo que, se a nomeação como Comandante-chefe da Frota Combinada foi uma boia de salvação momentânea, colocou-o também na posição de responsável estratégico pela preparação do início da guerra com os EUA. E planeou um ataque de forma a infligir o máximo de estragos à Marinha Americana no Pacífico de uma só vez, prevendo a utilização de centenas de aviões transportados em porta-aviões, numa tática moderna até aí não utilizada. Os militares americanos falharam aqui redondamente porque, por um lado acreditaram que não haveria ataque sem prévia declaração de guerra e, por outro lado, não acautelaram devidamente a hipótese de ataque aero-naval combinado à distância que, no entanto, tinha sido previsto e analisado em pormenor pelo próprio Yamamoto enquanto fazia a sua preparação na América.
Yamamoto sabia que o ataque a Pearl Harbour, celebrado como uma grande vitória no Japão, havia sido um fracasso estratégico. Tal veio a confirmar-se seis meses depois num dos piores desastres navais da História, a batalha naval de Midway, em que quatro porta-aviões japoneses foram afundados pela Marinha Americana utilizando precisamente os seus porta-aviões que tinham escapado ao ataque de Pearl Harbour e que, mais uma vez, Yamamoto tentava destruir. O poderio naval japonês ficou praticamente anulado comprometendo definitivamente as aspirações de domínio do Pacífico pelo Império do Sol Nascente e colocando o Japão ao alcance dos aviões americanos. Em Abril de 1943, Yamamoto seria vítima de uma missão da aviação americana designada apropriadamente “vingança” que visou deliberadamente o abate do avião em que se deslocava quando fazia uma visita às Ilhas Salomão.
Antes de Pearl Harbour Yamamoto tinha avisado o governo japonês de que, depois de entrar em guerra com os EUA, estes demorariam entre seis meses a um ano a virar a sorte da guerra contra o Japão. Não conseguindo demover o seu governo, trabalhou depois para conseguir o máximo de eficácia naval com vista a obrigar os americanos a negociar a paz. Foi assim que delineou o ataque a Pearl Harbour e, depois às Ilhas Midway para eliminar a Marinha Americana e conseguir um domínio sobre todo o Pacífico.

 A batalha de Midway ainda hoje é estudada pelos oficiais de marinha e, embora os comandantes americanos chefiados pelo Almirante Nimitz tenham tido uma acção notável, não pode deixar de se pensar que a sorte teve também um papel essencial no resultado.
E Yamamoto ficou igualmente na História como um militar excepcional que, no entanto, colocou toda a sua competência e conhecimento ao serviço de uma política infame, com a qual aliás nem concordava, ligando a sua sorte ao destino dos criminosos imperialistas japoneses.

sexta-feira, 4 de dezembro de 2020

Sá Carneiro - 40 anos

 Passam hoje 40 anos sobre a morte de Sá Carneiro . Raramente falo nele porque me irritam todos os que se tentam colocar num pedestal à sua custa, de uma maneira ou de outra. Costumo dizer que nunca fui XXXXista, fosse de quem fosse. Na verdade, se não o fui com Sá Carneiro nunca o poderia ser com qualquer outro político da área política, depois dele.

Aproveito apenas o dia para lembrar que faz hoje 40 anos estava Oficial de Dia à Flotilha de Patrulhas na Base do Alfeite. Depois de jantar estava a ver a RTP e veio a notícia arrasadora. Para mim. Porque para os os outros dois homens que estavam de serviço comigo, um 1º Tenente e um Sargento Ajudante, foi uma festa. Desataram aos saltos e abraços de contentamento e a mim não me restou mais nada que sair para o ar frio exterior do Alfeite, enquanto me vinham lágrimas aos olhos. 

E foi assim. E Portugal est assim como está.

segunda-feira, 30 de novembro de 2020

A legalidade, a aritmética e a Confiança

 

A minha última crónica foi motivo para diversas críticas (todas amáveis e bem vindas) sobre o aspecto concreto da formação de governos por partidos que não foram os mais votados em eleições.

Não sendo constitucionalista, nem sequer jurista, a minha visão sobre o assunto pode e terá, certamente, erros de perspectiva técnico-jurídica, mas já aprendi há muitos anos que nestas matérias é fácil suceder que o bom senso e a perspectiva do simples cidadão não fiquem a perder às doutrinas jurídico-filosóficas.

Feita esta introdução e agradecendo que me sejam relevados erros na matéria, explico as minhas razões para abordar de novo o assunto, porque estou convencido de que tem repercussões na forma como é entendida a democracia e no próprio funcionamento da sociedade. Até porque uma nova normalidade substitui uma anterior, sem que entretanto tenha havido alteração do contexto jurídico, seja constitucional, seja na lei eleitoral comum.

Para melhor explicar o raciocínio, não há como colocar um exemplo concreto que não andará longe da realidade possível. Imagine-se que um partido obtém um resultado à volta dos 39%, próximo da maioria absoluta mas sem lá chegar, e que quatro dos outros partidos andam todos à volta dos 10-12%. Podem estes juntar-se depois das eleições e formar eles próprios governo, não interessando para o caso se são de direita ou de esquerda. Será que há respeito pela vontade popular? Na minha opinião, não há!

E, no entanto, Portugal entrou nesta nova normalidade em 2015. Já não interessa quem vence as eleições, e sim que maiorias se podem formar depois delas na Assembleia da República.

Esquece-se que a Democracia é muito mais que aritmética. E que, para além da simples negociação de votos entre os partidos nesta ou naquela matéria, há todo um formalismo respeitoso da comunidade que, quando é abandonado, coloca a nu fragilidades e hipocrisias do sistema. É para mim evidente que o simples somatório de votos na Assembleia não pode substituir a convergência coerente de ideias e de programas, sob pena de o país estagnar ou retroceder nos mais diversos domínios. Coloco aqui um pequeno exemplo, mas bem significativo do que quero significar: pode a discussão de um Orçamento Geral de Estado assemelhar-se a um “bar aberto”, como sucedeu nestas últimas semanas com o OGE para 2021? Como se viu, poder pode, mas não devia.

Na Assembleia da República reside um dos pilares fundamentais da Democracia. Mas como são escolhidos os Deputados que a compõem? Não me refiro às eleições em que os cidadãos escolhem as listas partidárias que lhes são propostas, mas antes, quais são os procedimentos partidários para definição dessas listas? Durante as primeiras décadas que se seguiram ao 25 de Abril, era evidente uma preocupação dos partidos em irem procurar, nos seus quadros ou na sociedade, personalidades cuja capacidade profissional ou pessoal os colocava acima da média garantindo, pelo menos, uma consciência das consequências das opções tomadas. Do PCP ao CDS, podia-se discordar das diversas posições, mas nos diferentes partidos havia quem soubesse perfeitamente o que defendia, porquê e para quê, muito para além da mera barganha de votos.

O sistema foi evoluindo e, em boa verdade, numa direcção que não é a melhor, não se vendo quem esteja na disposição de pretender alterar as coisas. Já se sabe que as organizações concelhias dos partidos servem para aceder aos executivos municipais e as distritais, por sua vez, às listas de deputados da Assembleia da República. Os resultados não têm sido os melhores provocando um distanciamento entre os eleitores e os seus representantes que é cada vez maior. O leitor consegue identificar os deputados do seu círculo eleitoral? Provavelmente nem sabe os nomes dos eleitos da lista em que votou!

Para piorar a situação, a progressiva deslocação da população do interior para o litoral tem também, além das outras, consequências eleitorais. Entre um deputado eleito em Lisboa e outro e outro no interior, por exemplo Portalegre, pode existir uma diferença de um para três em número de eleitores necessários para o eleger.

Mas qualquer alteração que se possa imaginar para alterar esta situação, com método de Hondt modificado ou através da criação de um círculo nacional, esbarra nos interesses imediatos dos partidos.

Sendo o respeito pela vontade popular expressa pelo voto a essência da democracia representativa, há outro aspecto crucial a ter em conta: A CONFIANÇA. E a confiança tem de começar pelos partidos, que têm de a merecer pela sua prática no poder e fora dele. Sob pena de doenças graves se instalarem, como a abstenção e o populismo, como já é visível entre nós.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 30 de Novembro de 2020