Dar sangue
é, com toda a certeza, uma das acções mais meritórias que cada um de nós pode
fazer ao longo da vida. Trata-se de partilhar algo que nos é absolutamente
vital, ainda por cima sem sabermos quem virá a beneficiará dessa partilha.
Depois da dádiva, eventualmente, o dador virá a receber um SMS do Hospital a
informar que o sangue dado «ajudou hoje a salvar uma vida», gratificação mais
que suficiente para justificar o pequeno sacrifício da recolha do sangue.
A dádiva
de sangue só não é feita de forma totalmente anónima porque se torna necessário
rastrear determinado tipo de doenças que não podem ser transmitidas pelo doador
ao receptor, sendo feitas determinadas análises de cujo resultado é depois dado
conhecimento ao dador. A segurança em toda a cadeia de doação de sangue é
absolutamente necessária, e é uma questão médica e científica, razão pela qual
os partidos políticos se deveriam abster de se intrometer no processo.
Por razões
de idade, deixei há algum tempo de poder ser dador de sangue, razão pela qual
me sinto hoje à vontade para abordar este assunto de forma que inclui a visão
pessoal resultante de experiência própria. Aliás, na última vez que dei sangue,
já depois de passada a idade tida como limite habitual, senti pela primeira vez
que o corpo reagiu de forma negativa com alguma intensidade, assim me provando
caso tal ainda fosse necessário, que a idade não perdoa pelo que a nossa
actividade deve ter isso em conta e que as regras estabelecidas têm toda a
razão de ser.
Durante
anos doei sangue nos HUC, sendo testemunha, quer do espírito espantoso de
partilha humilde dos doadores desconhecidos que ali encontrava no Serviço de
Sangue e Medicina Transfusional do CHUC, quer de todo o pessoal que ali presta serviço,
de um cuidado e mesmo carinho para com os doadores que é digno do maior apreço.
Para
rematar esta fase da vida, tive há dias a grata surpresa de ter sido um dos
dadores distinguidos com um Certificado de dador de sangue assinado pela
própria ministra da Saúde entregue numa sessão que decorreu no auditório dos
HUC, num momento cultural e cívico do maior significado. Ali fiquei a saber que
o CHUC conta com cerca de 18.000 dadores inscritos que anualmente permitem a
obtenção de 14.000 unidades de sangue. É um número elevado, mas por vezes
insuficiente para as necessidades do Centro Hospitalar. Razão por que foi
lançada uma campanha para promover a dádiva de sangue neste Verão. Não sei a
razão, mas nesta época do ano faz-se normalmente sentir mais a necessidade de
sangue. Pessoalmente, e como o meu sangue é do tipo dador universal, várias
foram as vezes ao longo dos anos em que recebi mensagens do Hospital a
solicitar dádiva com urgência por falta de capacidade de resposta momentânea
para um ou outro tipo de sangue. O que eu fazia, sempre que possível, lembrando-me
das trágicas consequências de uma possível situação de emergência sem haver
capacidade de resposta.
A pandemia
COVID 19 teve também consequências a nível das dádivas de sangue, pelos mais diversos
motivos, de entre os quais o isolamento sanitário de muitas pessoas, incluindo
dadores habituais.
Por isso
mesmo, o Serviço de Sangue e Medicina Transfusional do CHUC, em articulação com
a Associação de Dadores de Sangue de Coimbra, está a promover uma campanha que
visa alertar a comunidade para a importância de dar sangue, em particular nesta
época estival. Estabelecendo uma feliz associação de ideias com a praia e os
necessários nadadores salvadores a campanha recebeu a designação “Neste Verão,
seja uma dador salvador”. Como se pode dar sangue a partir dos 18 anos, o
objectivo é aliciar os jovens a dar sangue neste Verão. Num tempo em que tanto
se fala, e bem, de igualdade e fraternidade, a doação de sangue permite a
qualquer pessoa transformar-se em salvador participando nessa grande família de
dadores beneméritos de sangue de todo o mundo. E, sim, na verdade todos somos
iguais sendo o sangue de todos nós da mesma cor, não havendo ninguém com sangue
azul.
Caro leitor, neste Verão dê sangue e seja também um “dador salvador”,
pelo menos para compensar a falta do autor desta crónica.
Texto publicado originalmente no Diário de Coimbra em 19 de Julho de 2021
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