Pertenço à geração nascida nos anos 50 do sec. XX. Até há alguns anos não tive verdadeira consciência de como o fim da Segunda Grande Guerra acontecera menos de dez anos antes de ter nascido, certamente porque em Portugal não sofremos a desgraça da destruição de cidades que quase toda a Europa conheceu.
Mas testemunhei um mundo que já acabou, embora ainda muitos de nós não o reconheçamos e muito menos o aceitemos como realidade. Ao contrário dos mais jovens que já perceberam várias coisas, entre as quais que provavelmente irão viver com mais dificuldades económicas que os pais, que não terão provavelmente as mesmas possibilidades de trabalho e que a remuneração será mais baixa, que viverão num mundo mais inseguro mas mais aberto e que, fundamentalmente, o seu será um mundo mais tecnológico e desumanizado, menos próspero, menos limpo e mais áspero.
De facto, as 2 ou 3 décadas que se seguiram à IIGG foram, no mundo ocidental, de uma prosperidade nunca antes vista. Foi o tempo em que era possível sonhar tudo, até levar o Homem à Lua. O que aconteceu, em 1969!
Mas, como acontece a tudo o que é bom, essa era teve um fim. Como que numa bebedeira colectiva, estamos hoje a viver a ressaca desse tempo. A economia tinha uma caraterística linear: produzir, usar e deitar fora. O paradigma dessa economia será, para nós, uma célebre marca espanhola: comprar roupa barata, para usar umas (poucas) vezes, para logo substituir por outra em tudo semelhante descartando a “antiga”, assim continuando indefinidamente. O velho tempo em que se comprava roupa para durar anos a fio, feita de bons materiais, mas que não podia acompanhar a moda sempre a mudar, parecia ter terminado. O que não terminava de crescer era o lixo produzido por esse tipo de economia, já que tudo o mais seguia a regra da roupa, desde os automóveis à mobília e aos telemóveis. Há mesmo quem garanta que os electrodomésticos eram construídos com uma pequena peça mais frágil que viria a ditar o fim da vida útil dos aparelhos, assim se assegurando um mercado infindo.
E o lixo acumulou-se por todo o mundo, de várias maneiras, desde os continentes aos rios e mares, incluindo a atmosfera. Entretanto estamos a tomar consciência de que esse mundo acabou, tal como a forma como utilizamos tudo o que o planeta em que vivemos nos proporciona tem obrigatoriamente de acabar. Cerca de um terço do que consumimos acaba, mais cedo do que tarde, no lixo. Muito disso seria facilmente recuperável e reutilizável, seja por nós próprios, como por quem dificilmente tem acesso a esses produtos. Por outro lado, muito do que acumulamos nas nossas casas ao longo dos anos, é, se pensarmos bem nisso, perfeitamente dispensável e apenas um peso para os descendentes que de tudo isso dificilmente poderão tirar algum valor.
É também sabido que, de toda a comida que produzimos nas nossas casas, um terço vai igualmente para o lixo, num desperdício gigantesco e socialmente intolerável em absoluto.
Não é mais possível continuar neste caminho. Por isso, lentamente, o conceito de sustentabilidade vai tomando um lugar cada vez mais importante, na economia em geral, mas também no nosso quotidiano.
O velho conceito linear de produzir, consumir e deitar fora está a ser substituído pelo circular que consiste em produzir, utilizar e reciclar para reutilizar, evitando o desperdício e a produção descontrolada de lixo.
Não se pense que se trata de um conceito vago ou abstracto que não nos diz respeito a todos nós em particular. Trata-se sim de tornar o nosso mundo sustentável, isto é, que seja possível entregá-lo sucessivamente às gerações seguintes melhor ou pelo menos igual ao que é recebido. Isto em relação às questões macro que respeitam aos países e grandes empresas globais, mas também a cada um de nós na nossa vida profissional e pessoal. Começando pelos nossos hábitos de consumo e acabando na cozinha e no destino aos excedentes vários que todos os dias produzimos. E atenção: o mundo está mesmo a mudar; mais do que nós vemos.
Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 30 Out 2023
Imagens recolhidas na internet