segunda-feira, 14 de dezembro de 2020

Eleições presidenciais

 


Daqui a pouco mais de um mês vamos escolher o presidente da República para os próximos cinco anos. Mas esta eleição tem características muito próprias já que, na realidade se trata de uma reeleição por duas razões concretas: em primeiro lugar, todos os presidentes da presente República foram reeleitos e em segundo lugar porque quem se recandidata é Marcelo Rebelo de Sousa.

Muito pessoalmente, estas eleições surgem numa altura da minha vida, interesse isso a quem interessar, em que considero a independência pessoal, a todos os níveis, um bem demasiado valioso para ser desperdiçado. Em consequência nada nem ninguém me influencia hoje nas minhas opiniões e tomadas de posição no espaço público, em que incluo estas crónicas semanais que o Diário de Coimbra me publica desde há 15 anos.

Depois, a situação do país é de uma complexidade verdadeiramente extraordinária, com factores que fogem completamente ao controlo de quem tem que assumir responsabilidades. Essa circunstância decorrente da pandemia do COVID-19 exige, ou deveria exigir, uma atitude de rigor e absoluto respeito pela verdade, em todas as vertentes da governação e mesmo da actividade política, desde o Governo às Juntas de Freguesia. E exige, também, que quem cuida dos portugueses e da coisa pública seja capaz de enfrentar dificuldades impensáveis há escassos dez meses.

Deveremos ter ainda em conta o fenómeno da abstenção em Portugal. Nas últimas presidenciais de 2016, foi de 51.34% isto é, a votação obtida pelo vencedor e actual presidente que foi de 2.411.925 votos correspondentes a 52% dos votos expressos, na realidade correspondeu à vontade de um pouco menos de 25% dos portugueses inscritos como eleitores que eram 9.741.377. A dimensão da abstenção significa que mais de metade dos portugueses não querem, não podem por qualquer motivo ou não estão para se maçar para participar num acto cívico tão importante como escolher o Presidente da República por cinco anos. A representatividade real dos eleitos perante o universo dos portugueses é muito baixa. E isso deveria levar os eleitos, quer Presidente da República, quer Deputados, a questionar-se e a tudo fazer para que os portugueses se sintam realmente representados por eles.

E é tendo em conta estas circunstâncias que, como qualquer português comum, me coloco perante as diversas candidaturas já apresentadas que tudo indica serão as definitivas, não havendo outras hipóteses de escolha que não estas. Em primeiro lugar há as candidaturas saídas de partidos. Estão nesta situação João Ferreira do PCP, Marisa Matias do BE, André Ventura do Chega e Tiago Mayan Gonçalves da Iniciativa Liberal

As duas candidaturas à esquerda buscam marcar terreno por parte dos respectivos partidos tentando segurar os respectivos eleitores habituais. Embora possam almejar conseguir algum apoio exterior fruto das características pessoais de João Ferreira e Marisa Matias, na realidade não trazem nada de novo, mesmo com a candidata do BE a afirmar-se surpreendentemente como social-democrata. O caso de André Ventura é diferente, dado que o Chega é um partido construído à sua volta, muito personalizado: o objectivo será obter mais votos que mais tarde venham a ampliar os resultados eleitorais para a assembleia da República, dando continuidade à sua cruzada contra pobres e desfavorecidos da sociedade. Quanto a Tiago Gonçalves a sua intervenção pública pessoal ainda não deu para se perceber ao que vem, para além de também tentar marcar terreno do partido.

E depois há Ana Gomes e Marcelo Rebelo de Sousa.

Com o voluntarismo que se lhe reconhece, Ana Gomes avançou de forma independente do seu partido, o PS. É evidente ter consigo uma parte da família socialista que, ou não se sente bem com António Costa, ou não admite que socialistas votem em Marcelo. A questão da vacina contra a gripe que se passou já depois de ser candidata presidencial não deverá ser uma grande ajuda para a candidata: tratou do seu problema pessoal com expedientes, ultrapassando a lei e pior, colocando em causa terceiros como as farmácias e o próprio governo, com uma hipocrisia impossível de se aceitar e incompreensível em alguém que protagoniza uma candidatura presidencial.

Marcelo teve um primeiro mandato em que tentou e conseguiu estabelecer uma ligação directa afectiva com os portugueses, mantendo-se equidistante perante os partidos. É evidente que a sua formação jurídica superior lhe permitiu que a sua acção fosse sempre irrepreensível do ponto de vista constitucional e não caindo em tentações a que alguns dos seus antecessores não conseguiram fugir. Mas Marcelo candidato tem duas dificuldades essenciais para ultrapassar. Não lhe é possível provar que a mão que Marcelo Presidente deu a António Costa e aos seus governos de esquerda, a daria a um governo vindo da direita, curiosamente a sua área política de origem. Claro que pode sempre argumentar que a realidade lhe impôs essa situação no passado e não outra, não sendo da sua responsabilidade se o centro-direita não se conseguiu afirmar nos últimos anos. E não deixará de ter razão. Por outro lado, por mais bazucas que a EU mande para cá, será cada vez mais difícil esconder o fracasso da recuperação económica dos governos Costa. Com Marcelo a Presidente.
Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 14 de Novembro de 2020

Portugal à frente.....na desgraça

 E é isto. Média de ordenados por hora na Europa. Em 2018, agora não está melhor.


 


sábado, 12 de dezembro de 2020

Incompatibilidades para Juizes

A Associação sindical dos juízes  defende que, depois do exercício de determinados cargos, designadamente políticos, os juízes não possam voltar ao exercício de funções judiciais. Concordo e digo isto há muito tempo:

https://expresso.pt/sociedade/2020-12-10-Associacao-sindical-propoe-alargar-prazo-de-suspensao-de-juizes-envolvidos-em-corrupcao

"A ASJP considera ainda fundamental haver uma alteração nas práticas dos Conselhos Superiores sobre a nomeação de juízes para comissões de serviço não judiciais «em cargos que impliquem o estabelecimento de relações de confiança ou dependência de interesses de natureza política, económica, empresarial, desportiva ou outra, incompatíveis com a percepção pública de independência e imparcialidade da justiça», defendendo que seja proibido o regresso a funções judiciais após o exercício de certos cargos políticos"

sexta-feira, 11 de dezembro de 2020

Títulos enganadores

 O Estado não subsidia as empresas. Devolve-lhes o que lhes tira. Com o aumento do salário mínimo, as empresas vêem os seus custos salariais aumentar, sendo esse aumento estimado em 74 milhões. É esse montante que o Estado devolve, não é subsídio.



quarta-feira, 9 de dezembro de 2020

Investimento público em Portugal

 Formidável.

Portugal tem a taxa de investimento público mais baixa da OCDE. Devemos agradecer a toda a geringonça com Costa à cabeça.



segunda-feira, 7 de dezembro de 2020

Sobre obras públicas

 


Uma das obras públicas de que ouvimos falar desde os anos 60 do século passado é o «novo aeroporto de Lisboa», já previsto nos Planos de Fomento do antigo regime e que é de novo notícia nos jornais. Parece que, como agora já não há pressa para o construir porque o turismo foi ao fundo com a pandemia, abre-se a possibilidade de o aeroporto do Montijo ser afinal sujeito a uma avaliação de impacte ambiental estratégica. Isto é, os estudos ambientais deverão incluir uma avaliação ambiental comparativa com outras hipóteses de localização, o que antes foi considerado desnecessário. Algo que parece evidente, para que a escolha do local seja a mais correcta, surge apenas como possível em consequência da pandemia, significando que, em 2020, ainda se anda aos papéis com a escolha da localização do novo aeroporto de Lisboa. De tal forma assim é, que até aparecem uns iluminados a propor Beja como solução de novo aeroporto para Lisboa assim se tentando resgatar, com outro disparate, a má despesa pública que aquele aeroporto significou.

Felizmente, também entre nós já se fazem estudos de custo/benefício que justifiquem novas obras públicas. Contudo, mesmo assim, ainda andamos frequentemente por maus caminhos. Desde logo, no que diz respeito aos benefícios, já que são muitas vezes habilmente exagerados de propósito, para justificar a vontade de obra dos decisores políticos, embora os autores coloquem sempre umas letrinhas pequenas no fim, com os pressupostos utilizados, assim se livrando de responsabilidades futuras. O caso mais evidente é o das auto-estradas cujo tráfego real é muitas vezes inferior ao previsto nos estudos económicos que justificaram a sua construção.

Mas há ainda a questão dos custos previstos. Não me refiro aos custos de instalação/construção que tantas vezes ultrapassam de longe os custos previstos, como aconteceu na ponte Rainha Santa que veio a custar mais do dobro do valor adjudicado quando o então ministro das obras públicas tinha garantido que seria uma obra modelo, «nem mais um dia, nem mais um tostão». Refiro-me a algo que em Portugal é ainda uma pecha nas obras públicas, provavelmente porque quem as manda fazer não está minimamente preocupado com isso, já que não terá a ver com essa responsabilidade.

Refiro-me, em concreto, à questão da manutenção. Há países em que, desde há muito, o custo da análise de oportunidade inclui obrigatoriamente os custos de manutenção durante a vida útil da obra. O que qualquer engenheiro sabe perfeitamente que pode ser decisivo para fazer ou não a obra, ou mesmo na escolha da solução técnica a adoptar. E há dois tipos de manutenção: aquela que é necessária para o correcto e contínuo funcionamento do equipamento e aquela outra que tem a ver com a segurança que pode por em causa a sua existência.


Para ilustrar o que acima digo, vou utilizar um exemplo de uma obra que todos os conimbricenses conhecem bem: o Estádio Cidade de Coimbra, construído há quase vinte anos. Para além da manutenção diária que tem a ver com limpeza, higiene, e alguns equipamentos correntes como elevadores, há outros aspectos da manutenção muito importantes a ter em conta. O sistema de iluminação do campo permite que se jogue à noite com transmissão televisiva. Se falhar a electricidade da rede existe um gerador que deverá estar perfeitamente activo em cerca de 20 segundos e, para que não se note qualquer falha de iluminação, existe um sistema sofisticado e caríssimo de unidades de UPS com baterias que asseguram a iluminação contínua até o gerador passar a garantir o mesmo. Trata-se de algo que, se não funcionar, não coloca o edifício em perigo, apenas não permite a sua utilização em pleno: a sua manutenção é muito importante, mas não crucial. Já o mesmo não se pode dizer da cobertura das bancadas sujeita ao peso próprio, mas também ao vento. Trata-se de uma estrutura mista aço/betão em que as forças de tracção são conduzidas por tirantes às vigas de betão que, por sua vez e como é natural, funcionam à compressão. O sistema exige manutenção, não diária, mas de dez em dez anos, com verificação da tensão de aperto de todos os parafusos (e são muitos) além de controlo das pinturas das peças metálicas: aqui já se trata de uma manutenção que visa a própria estabilidade estrutural do edifício. Numa obra pública desta dimensão, com um custo inicial da ordem dos 40 milhões de euros, a manutenção é uma parte essencial do investimento e não pode ser descurada em momento algum, de acordo com as regras estabelecidas aquando da construção, o que estou certo ser feito com profissionalismo e diligência.

Como se vê, através do exemplo apresentado, há toda uma cultura de rigor na análise das diversas opções técnicas das obras públicas, para além das decisões políticas, que deve continuar a ser implantada no país, para que os impostos dos portugueses sejam sempre aplicados com a maior eficiência. E o custo da manutenção, seja em estádios, seja em pontes ou mesmo estradas, é crucial para a determinação dos custos totais de investimento.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 7 de Novembro 2020