segunda-feira, 23 de setembro de 2013

UMA CRISE QUE NINGUÉM RESOLVE

Warren Buffett, um dos homens mais ricos do mundo, disse um dia que os produtos financeiros derivados são na verdade verdadeiras “armas financeiras de destruição maciça”. E de facto, olhando para tudo o que se tem passado desde Setembro de 2008 na economia mundial e em cada um dos países, incluindo Portugal, só podemos dar razão ao investidor.
Hoje em dia somos todos os dias inundados com informação sobre esses derivados e sobre o que são “CDS’s” (Credit Default Swaps), “SWAP’s”, “Hedge Funds”, “Subprime”, etc, etc. Tudo nomes estranhos para designar coisas que na essência são mais simples do que parece e que têm uma característica em comum: colocam a finança no lugar da chamada economia real e têm dado por seu lado lugar a outra coisa que também tem um nome estranho: “bailout” ou mais prosaicamente, resgate. Também aprendemos todos que existem umas empresas que são “agências de rating”, nas mãos das quais os países colocaram a sua própria soberania! E aprendemos sobretudo que todos estamos a pagar estas coisas todas, dia a dia, com uma austeridade que não nos abandona e também desconfiamos que no fundo os problemas estão aí para ficar e que a pouca riqueza gerada cada vez mais vai parar a menos.
A chamada “financeirização” da economia transformou o dinheiro em pura mercadoria com benefício para quem o gere, isto é, a banca. A ideia de que a queda dos bancos traria consequências terríveis para o resto da economia, o tal efeito sistémico, mais não tem feito do que transferir fundos da economia real para a banca, incluindo claro está, no caso português, uma boa fatia do resgate da troica.
Nós não nos apercebemos imediatamente do significado e das consequências da transformação do dinheiro em pura mercadoria, mas penso que um exemplo simples que toda a gente conhece é sintomático disso mesmo. Esta semana soubemos do novo contrato de Cristiano Ronaldo com o Real Madrid, válido por vários anos. O jogador vai receber mais de 58.000 euros, diariamente, em todo esse período. Como é evidente, não se trata de um pagamento por um serviço prestado, dado não haver qualquer correspondência com a realidade. O valor tanto podia ser metade, como um décimo, ou mesmo o dobro, que o significado seria o mesmo. Estamos perante um puro “activo” financeiro, como tal tratado. É apenas mais uma prova de que a “bolha” financeira está aí e para durar, para mal dos pecados dos que são sistematicamente chamados a pagar os resgates.
Ao retardador, a onda de choque dos derivados acabou por chegar também ao nosso pequeno mundo político. Não é outro senão esse o significado do “lume brando” em que a ministra das Finanças tem estado a ser colocada na Assembleia da República, por causa dos “swaps” que também são produtos financeiros derivados inventados, imagine-se, para criar segurança aos empréstimos, neste caso, de empresas públicas.
Debaixo da crise que a maioria esmagadora de nós está a pagar e vai continuar a pagar, há uma outra, a séria e profunda, que deveria estar a ser devidamente tratada e que todas as indicações nos dizem não estar. A cultura da finança deve ser rapidamente restabelecida: a banca foi criada para servir a economia real e não o contrário como é evidente estar a suceder. E a actividade bancária praticada na escuridão deve ser trazida para a luz. Não se deverá continuar a meter mais e mais dinheiro na banca com a desculpa dos “riscos sistémicos” com a consequência de estrangular a economia real, enchendo as “bolhas” financeiras que poderão acabar por rebentar e acabar definitivamente com o mundo tal como o conhecemos hoje.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 23 de Setembro de 2013

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