segunda-feira, 13 de junho de 2016

“Leva muito tempo tornarmo-nos jovens”


Picasso é um dos pintores mais conhecidos do séc. XX, estando algumas das suas pinturas entre as obras de arte mais significativas da História da Humanidade. O seu génio como pintor revelou-se muito cedo, tendo sido orientado nos primeiros anos pelo pai, ele próprio pintor, mas convencional e sem rasgo. Conta-se que, com menos de catorze anos, entrou directamente para o último ano de uma escola de pintura, tendo terminado num único dia um estudo sobre um nu que normalmente seria trabalho para um mês.
São conhecidos e sempre referidos os seus diversos períodos na pintura, como o azul, o cor-de-rosa ou o cubista. No entanto, há outros aspectos da sua vida artística que merecem atenção. A sua admiração pelos grandes pintores espanhóis é evidente. Não foi por acaso que pintou uma extraordinária versão de “Las meninas” de Velasquez. Tal como, ao observarmos a “”Guernica”, não podemos deixar de lembrar Goya e o seu “fuzilamento de Maio de 1808”. Quanto a El Greco, Picasso manteve uma admiração constante ao longo de toda a sua vida, com inúmeras obras inspiradas em quadros do extraordinário pintor nascido em Creta, mas que desenvolveu grande parte da sua vida artística em Espanha, depois de ter passado por Veneza e Roma.

Há poucas semanas tive a oportunidade de, mais uma vez, visitar o museu Picasso em Barcelona. Para nosso deleite lá está o seu “Las Meninas”, bem como muitos dos estudos que fez para esse quadro, além de outras obras-primas. Mas há algo que chama a atenção naquele museu e que é essencial para perceber como se desenvolveu a obra moderna de Picasso. Antes de se tornar no pintor vanguardista que tanto influenciou a pintura moderna do século XX, Picasso passou por todo um processo de aprendizagem, tendo retratos, paisagens e naturezas-mortas de uma qualidade clássica irrepreensível, como o comprovam as obras existentes no museu. Sentiu depois a necessidade de se libertar do academismo representativo da realidade como a vemos exteriormente, como que passando para dentro dessa mesma realidade e dando-nos a conhecê-la pelos diversos elementos que a constituem. A beleza da pintura deixou de ser estática, interpelando intimamente e de forma inquietante quem a observa e aí está o génio de Picasso. Da complexidade estrutural da pintura representativa clássica, evoluiu para uma “aparente” simplicidade quase infantil resultante da “explosão” dos diversos elementos integrantes do motivo do quadro e transformando-os em simples objectos geométricos.
Por isso Picasso brincava dizendo o que aparece no título desta crónica. Conta-se, a este propósito, a história de uma senhora que lhe pediu um retrato que o pintor executou com meia dúzia de traços e em poucos minutos. Quando lhe pediu a conta, a senhora exclamou que era muito dinheiro para tão pouco tempo de trabalho ao que o pintor respondeu que aquilo era o resultado do trabalho de uma vida inteira, pelo que até era barato.
Além do tempo que demora a ficarmos jovens, aqueles que ficamos, claro, é preciso reconhecer que isso dá muito trabalho. E, como é evidente, tal não sucede apenas na arte mas também na nossa vida. A simplicidade que advém do conhecimento interior da sociedade e das pessoas permite distinguir o que é essencial do que é acessório e o que é apenas revestimento artificial da realidade, escolhendo a verdade e excluindo a mentira.

Pablo Picasso deixou-nos no fatídico ano de 1973, em que a Humanidade perdeu três dos maiores artistas do século XX, todos chamados Pablo. 
Felizmente nos dias de hoje podemos dizer que os artistas ficam para sempre connosco. Através das gravações podemos continuar a ouvir Pablo Casals a tocar as suites de Bach no seu violoncelo e pelos livros lemos os poemas eternos de Pablo Neruda. 
Ambos com uma vantagem sobre Picasso: é que para apreciar verdadeiramente as pinturas de Picasso temos que nos deslocar perante elas como já fiz várias vezes com a Guernica, o que não sucede com a audição de Casals e a leitura de Neruda que podemos apreciar em casa. 

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