segunda-feira, 31 de outubro de 2016

Afinal a solução ou a solução final?




 Um dos maiores problemas da actual civilização é a energia. De facto, as exigências de funcionamento de tudo o que nos rodeia desde a produção económica até ao conforto doméstico passando pelos transportes e pela infinidade de serviços só podem ser respondidas com energia. Cada vez mais energia. E o homem tem sido incansável na busca e exploração de tudo o que possa fornecer energia. Começando com o carvão e os diversos hidrocarbonetos naturais e acabando na fissão nuclear, tudo tem servido como fonte de energia, porém com uma característica comum: todas estas fontes energéticas produzem produtos que, na sua totalidade, são ecologicamente insustentáveis para o nosso planeta. Razão para que, nos últimos anos, tenham surgido as chamadas energias verdes ou limpas, alternativa às fontes clássicas. O aproveitamento do vento, das barragens e da energia solar tem crescido de forma assinalável mas à custa de tarifas eléctricas cada vez mais elevadas: a chamada energia verde sai muito cara aos consumidores, como todos nós podemos verificar pela análise das facturas de electricidade que pagamos todos os meses.
Há dezenas de anos que os cientistas perseguem uma energia que, potencialmente, poderia resolver todos os problemas da humanidade nessa área, de forma praticamente limpa e a um custo muito baixo: a fusão nuclear.

Toda a energia que utilizamos tem, de forma mais próxima ou mais longínqua, a mesma origem: o Sol, que é uma gigantesca esfera de matéria em permanente fusão nuclear. O que os cientistas querem é precisamente replicar na Terra o que se passa no Sol, de forma controlada para que a energia libertada possa ser utilizada. Como se pode imaginar, não se trata de tarefa fácil. Desde há muito que nos meios académicos corre mesmo uma piada acerca disto: “a fusão comercial estará conseguida dentro de 30 anos, e sempre assim será”.
A fusão nuclear consiste em obter energia através da fusão de deutério (que é um isótopo pesado de hidrogénio) e de e de trítio (que é outro isótopo ainda mais pesado de hidrogénio). A vantagem do processo é que quer o deutério, quer o trítio, são materiais fáceis de produzir e de forma barata. Dessa fusão resulta hélio juntamente com um neutrão e muita, imensa energia.
Dito assim, parece uma tarefa fácil. Não é. Para que a fusão possa acontecer, é necessário criar uma espécie de sopa com os núcleos atómicos do deutério e do trítio e electrões a que se chama plasma, que constitui o combustível da fusão. E, para que a fusão se verifique, é necessário que o plasma esteja sujeito a uma pressão altíssima atingindo uma temperatura de cem milhões de graus centígrados e que esteja a flutuar livremente no interior de uma espécie de contentor circular sem tocar nas paredes, o que se consegue através de campos magnéticos, tudo isto trabalhando de forma contínua.
Até hoje foram desenvolvidos dois tipos de equipamentos que se mostraram com potencialidades para vir a conseguir a fusão nuclear controlada; o “Tokamak” e o “Stellarator”.
No passado dia 3 de Fevereiro de 2016, a Chanceler Federal Alemã Ângela Merkel carregou no botão do Wendeelstein 7-X, do tipo stellarator, que levou o plasma no interior do equipamento à temperatura de 80.000 graus centígrados durante um quarto de segundo, num ensaio experimental que provou que o equipamento poderá vir a ter sucesso (ainda que apenas experimental e não comercial). O equipamento custou 370 milhões de euros pagos pela Alemanha e pela União Europeia e os componentes foram fabricados um pouco por toda a Europa.
Nos últimos dias fomos favoravelmente surpreendidos pela notícia da participação de Portugal no projecto de construção de um equipamento do tipo tokamak, mas desta vez em França em Cadarache, pretendendo-se que esteja operacional a partir de 2027. Trata-se do ITER (International Thermonuclear Experimental Reactor), cujo custo se estima actualmente em pelo menos 13 mil milhões de euros, prevendo-se que só produzirá energia comercial em meados do século.
Estes projectos impressionantes estão a decorrer na Europa, mas nos EUA também se trabalha na mesma área. Curiosamente, os grandes projectos estatais americanos de fusão nuclear foram abandonados e actualmente trabalha-se em projectos privados de escala mais reduzida com ligação às mais importantes universidades tecnológicas, mas mais económicos e eventualmente com maior rentabilidade.
Como tantas vezes tem sucedido na História, mais uma vez a humanidade desenvolve tecnologia pacífica depois de já a usar para fins militares. A fusão nuclear é a base das actuais bombas H (de hidrogénio) que são dezenas de vezes mais potentes que as antigas bombas nucleares de fissão, como as de Hiroshima e Nagasaki. Serve para fins militares, mas pode ser num futuro relativamente próximo a resposta para os principais problemas da humanidade: a energia limpa e disponível de forma económica em grande quantidade para todos.

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