Realizou-se na semana passada, em Lisboa, a cerimónia que assinalou a entrada em vigor do Tratado de Lisboa. Apesar de neste semestre ser a Suécia que preside à União Europeia, faz sentido que tenha tido lugar em Lisboa, dado que o tratado tem o nome da nossa capital por a sua negociação ter sido concluída há dois anos pela presidência portuguesa.
O mundo está sempre em evolução, e quem não acompanha fica para trás. Isto é válido para pessoas e empresas, mas também para os países. Depois da implosão do chamado “socialismo real” com a queda do muro de Berlim e o desaparecimento do Pacto de Varsóvia, o mundo passou de bipolar a unipolar, tendo nessa altura os EUA passado a ser a única potência ao nível mundial.
Sendo inegavelmente uma grande potência económica, a Europa tem tido grandes dificuldades em afirmar-se ao nível político. Militarmente, a questão nem se põe, preferindo os europeus abrigarem-se no guarda-chuva da NATO.
Entretanto, a emergência de novas economias rapidamente crescentes ao nível global – China, Índia e Brasil – tem vindo a colocar em causa o lugar da economia europeia no mundo.
Uma alteração muito mais importante do que se supõe normalmente foi a emergência de Barack Obama como presidente dos EUA. Não propriamente pela mudança política, embora esta seja significativa, mas pela personalidade do presidente. Trata-se do primeiro presidente americano cujas origens estão viradas para o Pacífico, em vez do Atlântico. A recente viagem de Obama ao Oriente mostrou claramente que as suas prioridades estão naquela zona do globo, e não na Europa.
A União Europeia carecia claramente de instrumentos de decisão interna e de representação externa que lhe dessem capacidade de reacção em tempo útil e uma voz única perante as outras potências. O Tratado de Lisboa foi uma resposta a essas necessidades, dentro das limitações inerentes a uma União de países que não é uma federação, em que esses países continuam a gozar de extensa autonomia em grande número de áreas, mesmo na economia.
Um dos aspectos mais importantes do Tratado de Lisboa é a criação de representantes externos: o presidente do Conselho Europeu e um Alto Representante para a Política Externa. A partir de agora, o presidente americano, o presidente russo ou os seus congéneres chinês, indiano, brasileiro ou indiano teriam um interlocutor europeu único, para atender o telefone sempre que necessário. Digo teriam, porque a UE conseguiu o mais difícil: designou para aqueles lugares duas personalidades que, independentemente de serem certamente muito estimáveis pessoalmente, não acrescentam nada à UE por serem politicamente totalmente irrelevantes.
De facto, só por piada se imagina Obama a ligar para Van Rompuy ou Clinton para Catherine Ashton para resolver rapidamente uma qualquer emergência internacional.
Os equilíbrios internos da UE continuam a ser demasiado instáveis para permitirem soluções credíveis e eficazes para os problemas graves de um mundo que, efectivamente, é cada vez mais multipolar.
Publicado no Diário de Coimbra em 7 de Dezembro de 2009
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