Não é a primeira vez que abordo a questão da demografia em Portugal, e não será certamente a última, dada a gravidade de que se reveste e das consequências trágicas que pode vir a provocar na sociedade nas próximas décadas.
As análises da evolução demográfica indicam que os portugueses se estão a transformar num povo em risco de extinção a curto prazo. Em 1960, nasciam 214.000 portugueses e morriam 95.000. Em 1980, já só nasceram 158.000 para 94.000 óbitos. Em 2008, nasceram 104.500, tendo falecido 104.200. Embora ainda não haja dados oficiais, no ano passado o n.º de nascimentos terá sido inferior a 100.000, tendo morrido mais pessoas do que aquelas que nasceram, pela primeira vez. Chegámos verdadeiramente ao inverno demográfico.
Como resultado desta evolução, verifica-se que o índice sintético de fecundidade diminui em Portugal para valores à volta de 1,3, quando o valor que garante a renovação é de 2,1. As mulheres portuguesas têm cada vez menos filhos, e mais tarde. A descida da natalidade é acompanhada por um aumento da longevidade da população portuguesa, tendo, em escassos dez anos, duplicado a importância relativa da população com 80 ou mais anos de idade, enquanto o n.º de pessoas com 65 ou mais anos de idade por cada 100 pessoas em idade activa passou de 19 para 26. Estima-se que nos próximos 25 anos o número de idosos poderá ultrapassar o dobro do número de jovens.
As consequências desta evolução demográfica que acompanha, aliás, o que se passa no resto dos países desenvolvidos, são muitas e variadas.
Os custos da segurança social disparam, colocando claramente em risco a sua sustentabilidade e o próprio modelo social, por falta de contribuintes líquidos face ao elevado número de reformados.
Os custos da saúde aumentam também de forma acentuada: os custos de saúde de uma pessoa com 65 anos são, em média, cerca de três vezes os custos com pessoas entre os 30 e os 50 anos.
O número de alunos nas escolas diminui, eliminando muitos postos de trabalho ligados à Educação.
A própria competitividade das nossas sociedades, face aos países emergentes em época de globalização, é colocada permanentemente em causa: esses países são muito mais jovens, com as vantagens inerentes. No mundo do trabalho, as consequências são também importantes. O aumento da esperança de vida vai adiando o momento da reforma, com implicações na produtividade das empresas. Mas, como acontece muitas vezes, são as próprias empresas que mostram ter capacidade de adaptação às diferentes condições que estão a desenvolver-se com o aumento da idade média dos trabalhadores. Muitas empresas pelo mundo inteiro estão preocupadas com este assunto, e desenvolvem estratégias para o enfrentar.
A HBR (Harvard Business Review) de Março conta-nos como o fabricante de automóveis alemão BMW se prepara activamente para enfrentar o facto de que, enquanto hoje a média de idade dos seus trabalhadores é de 39 anos, daqui a escassos dez anos será superior a 47 anos. Foi constituída uma unidade piloto, com a média de idades prevista de acordo com esta previsão e dando atenção a cinco factores: gestão de saúde, competências, ambiente do posto de trabalho, políticas de reforma e mudança de processos de laboração. O sucesso da experiência, levada a cabo com a participação dos trabalhadores que propuseram mais de 70 pequenas alterações aprovadas foi de tal ordem que a própria produtividade da unidade subiu 7% num ano. Isto é, para além de promover a integração de trabalhadores mais velhos, ainda se obtiveram ganhos produtivos. A empresa está neste momento a promover alterações semelhantes nas suas fábricas pelo mundo inteiro.
Este é um exemplo a estudar com atenção e a replicar onde for possível. É socialmente muito mais justo do que mandar os trabalhadores para casa só por causa da idade, ou mesmo mudar em massa trabalhadores para trabalhos mais leves, dentro das unidades produtivas.
Publicado no Diário de Coimbra em 19 de Abril de 2010
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