Brasília foi construída do nada nos anos 50 e 60 do século passado, sob o
impulso do Presidente Kubitschek de Oliveira, segundo um plano urbanístico de
Lúcio Costa e tendo os edifícios mais marcantes a assinatura de Oscar Niemeyer.
Há poucos exemplos de cidades construídas assim apenas a partir de uma
ideia e de um terreno vazio. Teoricamente, têm tudo para dar certo. Quem já foi
a Brasília sabe que isso não é verdade. Para além do artificialismo e mesmo de
um formalismo demasiado pesado, para uma cidade com menos de 100 anos,
aparece-nos surpreendentemente velha e gasta. Mesmo os edifícios governamentais
que aparecem tão bonitos nas fotografias surgem já, quando vistos mais de
perto, com um ar sujo e pouco brilhante.
O que se dirá de uma cidade como Coimbra? Que é muito mais que o resultado
do sonho de um homem. Coimbra não nasceu ontem. Antes de o ser já era Aeminium.
Isso muito antes de um jovem rebelde ter resolvido pegar na História com as
suas mãos e, mal ou bem, ter separado para sempre o Condado Portucalense da
Galiza virando-se para Sul para construir um País, conquistando-o aos mouros.
O jovem que se fez Rei começando por lutar contra a própria Mãe, fez de
Coimbra a primeira capital do seu Reino e foi nesse preciso momento que a
História da nossa Cidade se começou a confundir com a História de um Portugal
então nascente.
Nós, os que cá estamos hoje, tenhamos ou não responsabilidades públicas,
somos apenas um momento fugaz na história da nossa Cidade. Isso não diminui o
nosso papel, antes pelo contrário. Torna-nos responsáveis por um legado
antiquíssimo que temos que transmitir aos que haverão de vir depois de nós. Da
forma como o melhorarmos ou não dependerá a qualidade de vida das futuras
gerações de conimbricenses.
Caímos muitas vezes na tentação de dizer que vamos definir o futuro,
falamos mesmo demasiadas vezes num “homem novo”, temos a arrogância de imaginar
que, com o poder, poderemos construir uma cidade nova.
Nada de mais errado, convenhamos, pelos desgraçados exemplos históricos que
conhecemos. Mas cair na posição contrária não é melhor. Uma veneração estática
do passado tantas vezes consequência de um conhecimento aprofundado pelo estudo
universitário, mas acompanhada por uma incapacidade de provocar mudança e evolução,
equivale a parar no tempo, transformando a cidade num museu de pedras mortas.
Isto é, construir uma cidade como Coimbra nos dias de hoje, exige, para
além de um respeito pelo passado baseado num conhecimento histórico
estruturado, uma compreensão do mundo actual e, fundamentalmente, uma grande
vontade de acompanhar as mudanças e capacidade para “Fazer”.
Coimbra nem pode ter vergonha de si mesma e do seu passado, nem pode deixar
de ter capacidade de se afirmar de uma forma orgulhosa por tudo o que de bom e
progressivo possui nos dias de hoje, impondo-se numa grande região beirã que só
espera isso mesmo de nós.
Aqui está a chave para a resolução de todos e cada um dos problemas
sectoriais da nossa Cidade, quer na área da Cultura e do Turismo, quer na área
do desenvolvimento sócio-económico, quer na gestão do território. O facto de
todo o país atravessar um momento particularmente difícil, só nos pode
encorajar a utilizar de forma consequente o legado do passado com os meios do
presente, encontrando novas soluções para problemas velhos.
Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 27 de Agosto de 2012