segunda-feira, 13 de agosto de 2012

Banca, para que te queremos



Passaram agora cinco anos sobre o desastre do Banco Northern Rock. O Freddie Mac e o Fannie Mae foram intervencionados no mês seguinte, em Setembro de 2008, mês que viu igualmente a falência do Lehman Brothers. Vista à distância, causa espanto a absoluta incompreensão do que se passava debaixo da superfície calma da economia, por parte dos responsáveis de então, que em boa parte são ainda hoje os mesmos. A cegueira política, irresponsabilidade ou mesmo incompetência então manifestadas continuam a ser a imagem de marca desta União Europeia a que pertencemos. Nessa altura a U. E. celebrava com o célebre “porreiro, pá” a montanha de inutilidades do chamado Tratado de Lisboa, lembrando o baile do Titanic enquanto afundava. Ainda a semana passada o presidente do BCE Mário Draghi com o nosso bem conhecido Vítor Constâncio ao lado, voltou a usar a técnica do duche gelado depois do banho quente das promessas impossíveis de cumprir; deixou tudo na mesma ou pior, já que condicionou a compra de dívida portuguesa a ainda mais reduções generalizadas de salários, numa nova demonstração grotesca da solução Goldman Sachs para tudo.
A banca espanhola, ainda há pouco tempo apresentada como um caso de sucesso a nível mundial é agora uma dor de cabeça gigantesca. Pelo menos 20% já foi nacionalizada, com alguns exemplos de falta de qualidade de gestão e mesmo de abusos gritantes de utilização indevida de fundos por parte de muitos gestores. O chamado resgate à banca espanhola com fundos europeus está ainda em andamento, prevendo-se que o Estado venha a ficar com uma parcela da banca ainda maior nas suas mãos.
Em Portugal considera-se geralmente que o problema com a banca que se verifica em Espanha, largamente associado à chamada “bolha imobiliária” não tem uma relevância tão grande. Mas as notícias não são animadoras, com reflexos na economia pela falta de financiamento. Nos últimos dias soube-se de alguns projectos gigantescos que foram por água abaixo. Curiosamente, ambos eram considerados PIN, valiam mais de mil milhões de euros cada um e corriam com apoio massivo do Estado: a RPP Solar e o Parque Alqueva. Em ambos os casos os promotores desistiram quando lhes foram pedidos documentos de responsabilidade essenciais ou garantias pessoais, como acontece quando qualquer pessoa vai ao banco pedir dinheiro para investir. Isto é, a banca, neste caso a Caixa Geral de Depósitos, mudou de agulha e resolveu acabar com o amiguismo à custa de todos nós e tratou os projectos privados como devem ser tratados: ou têm viabilidade por si ou não há dinheiro. Tivesse a banca trabalhado assim ao longo dos últimos anos e não estaríamos certamente como estamos em termos de economia.
Assim, temos o Estado a resgatar também os nossos maiores bancos, usando parte do financiamento acordado com a Troika para o efeito. Entre nós o Estado não está a entrar directamente no capital dos bancos, mas a utilizar a figura dos “CoCos” que são obrigações subordinadas convertíveis em capital, caso o banco entre em incumprimento no respectivo pagamento. Só o BPI receberá um financiamento deste tipo no montante de pelo menos 1,3 mil milhões de euros, podendo o valor ser ainda superior. Já o Millennium BCP recebe pelo menos 3 mil milhões de euros em CoCos. Resta dizer que os bancos vão ter que pagar estes montantes em cinco anos, com uma taxa de juro que evolui de 8,5% no primeiro ano até mais de 10% no último ano.
Isto é, se os bancos fecharam a torneira ao financiamento da economia, no que aliás são elogiados pelo próprio Governador do Banco de Portugal, preocupado com a solvabilidade da banca e deixando as outras preocupações para o ministro da Economia, ainda vão ter de arranjar maneira de cumprir o contratado. Deixo as conclusões para o leitor, bem como a adivinha sobre o que acontecerá aos bancos nesta situação dentro de cinco anos. Mas uma coisa é certa: com aquelas taxas de juro, daquele dinheiro não vai passar nem um cêntimo para as empresas ou para as famílias.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 13 de Agosto de 2012

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