O ambiente político
de Coimbra anda agitado por causa da chamada “via central”. Há mesmo quem
defenda que se pergunte a opinião aos conimbricenses sobre a abertura da via,
através de referendo local. Mas será que sabemos todos de que se trata?
Nos anos noventa do
século passado, perante a iminência do fecho da Linha da Lousã a exemplo de
outros ramais por todo o país que foram encerrados por falta de rentabilidade,
surgiu a ideia do Metro do Mondego, posteriormente designado “Sistema de
Mobilidade do Mondego”. A sustentabilidade económica do sistema seria garantida
pelo trajecto urbano cujo eixo central uniria a linha ao longo do rio com os
Hospitais da Universidade, passando pela zona do “bota abaixo” e desembocando
na Rua da Sofia em frente à Caixa Geral de Depósitos. Como é sabido, as obras
de construção da linha do Metro Mondego avançaram, com aquisição e demolição de
prédios na baixa de Coimbra necessários à implantação da via, bem como as obras
de beneficiação da antiga linha do caminho-de-ferro até Serpins/Lousã.
Lamentavelmente, estas obras foram suspensas durante o governo Sócrates e
durante o governo Passos Coelho não foram retomadas, com a agravante de a
Sociedade Metro Mondego não poder sequer levar a cabo as obras de
reabilitação/renovação dos prédios frente à Rua da Sofia e na Rua Nova, nem ser
autorizada a entregar os prédios a outra entidade para realizar as obras.
O canal da
travessia entre a Av. Fernão de Magalhães e a Rua da Sofia foi objecto de uma
necessária DIA (Declaração de Impacte Ambiental) em 2004 que contemplava
condicionantes, entre as quais a de que a faixa rodoviária que acompanha as
duas ferroviárias apenas pudesse ser utilizada por veículos de emergência e de
carga e descarga. Com a candidatura da Universidade a Património Mundial que
incluia a Rua da Sofia, que já era no seu todo Monumento Nacional, esta rua passou
a ter uma importância patrimonial acrescida, pelo que se prevê para ela uma
diminuição da utilização rodoviária. A alternativa óbvia, perante a defesa do
bem patrimonial maior que é a Rua da Sofia e estando as demolições já
realizadas, é a utilização do canal da Metro pelo que a DIA foi alterada em
2010. A utilização rodoviária sem condições do canal do metro ficou autorizada,
na condição da libertação progressiva da Rua da Sofia do tráfego rodoviário,
começando pela eliminação de um dos sentidos de trânsito e alargamento dos
passeios.
O atraso de
decisões sobre a instalação do metro ligeiro de superfície está a ser
prejudicial para a Baixa de Coimbra aos mais diversos níveis. Desde logo, as
demolições realizadas são uma ferida no tecido urbano com consequências
nefastas a nível social, comercial e outras. Por outro lado, a renovação urbana
da Rua da Sofia só poderá avançar com a abertura do canal da Metro que dispõe
de um estudo de integração urbana da autoria do Arq, Gonçalo Byrne garantindo o
equilíbrio urbano entre a travessia rodo-ferroviária e os espaços e edificações
envolventes. Assinalo que a ligação viária entre a beira-rio e o interior da
Cidade é muito deficiente devido à orografia do terreno e ao fecho das Ruas Ferreira
Borges e Visconde da Luz ao trânsito rodoviário que não pode voltar atrás.
Essa abertura
implica naturalmente obras nos edifícios da Rua da Sofia onde o canal desemboca,
no edifício-ponte do meio e nos dois laterais que lhe darão o apoio estrutural
e os acessos, já que não terá ligação directa ao espaço público. O projecto
conjunto destes edifícios aprovado com os necessários pareceres do Ministério
da Cultura, que é de grande qualidade arquitectónica, é igualmente da autoria
do Arq. Gonçalo Byrne.
O actual Presidente
da Câmara assumiu os projectos que já vinham de trás e se encontravam parados,
tendo a Câmara desenvolvido um projecto provisório que contempla uma primeira
parte do futuro canal, incluindo a parte rodoviária, a que tem chamado “via central”,
completamente compatível com a futura utilização rodo-ferroviária.
Perante todos estes
dados, perguntar em referendo aos cidadãos se concordam com esta obra é, a meu
ver, o mesmo que perguntar a alguém que anda de cadeira de rodas se quer
caminhar sozinho, já que a alternativa é manter o que está e que é inaceitável.
Os diversos partidos e movimentos de cidadãos têm, naturalmente, todo o direito
a ter as suas próprias opiniões e opções. Mas neste caso concreto há um
partido, para além do que actualmente governa a Câmara, que tem
responsabilidades acrescidas e que é o PSD. Todos os projectos em causa se
iniciaram, ou foram mesmo totalmente desenvolvidos, nos anteriores mandatos da
sua responsabilidade e é claramente o interesse da Cidade que está em causa,
acima das contingências políticas imediatas. Só lhe ficará bem assumir
publicamente este projecto que iniciou e foi assumido pela actual Câmara,
apoiando a sua execução no mais curto prazo possível.