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quarta-feira, 26 de abril de 2017
segunda-feira, 24 de abril de 2017
Aventuras impossíveis, tornadas realidade
A década de sessenta do século XX está ainda na memória de muitos de nós, naquilo que teve de negativo ou mesmo de perigos para a Humanidade, mas também nos grandes feitos conseguidos. Vivia-se um tempo de “guerra fria” entre dois blocos políticos armados até aos dentes, que foram tendo umas guerras “de teste”, normalmente em zonas periféricas. Foi o caso da guerra do Vietname que marcou tragicamente essa década com consequências que demoraram décadas a esbater-se na sociedade americana.
Foi a década da
grande aventura da exploração espacial. Depois da URSS enviar o primeiro homem
ao espaço Yuri Gagarin, o presidente Kennedy estabeleceu a meta americana de
pousar um homem na Lua e trazê-lo de volta à Terra, precisamente antes da
década terminar. O que foi conseguido com a Apolo XI no dia 20 de Julho de
1969, feito que está firmemente marcado na minha memória com a transmissão
directa na televisão a preto e branco.
A década que
vivemos está também a ser marcada por acontecimentos marcantes, como o
terrorismo global, a guerra na Síria, o ressurgimento dos nacionalismos de tão
má memória, as crises financeiras globais, o medo das consequências da
intromissão da cibernética em todos os aspectos da nossa vida, as alterações
climáticas.
E no entanto….a
aventura humana continua no espaço, embora a comunicação social esteja quase
completamente alheada do facto. No próximo mês de Setembro vai acontecer o clímax
daquilo a que os cientistas da NASA chamaram o “Grande Final” da missão Cassini
ao planeta Saturno, aquele planeta gigante do nosso sistema solar, conhecido
pelos seus anéis, no que foi a maior e mais complexa missão espacial até aos
dias de hoje.
Terminando a sua última missão científica, no passado sábado dia
22 a nave espacial alterou a sua trajectória, dando início às últimas orbitas
em redor de Saturno que culminarão num mergulho na atmosfera do planeta dos
anéis em 15 de Setembro que ditará a sua destruição programada, levando também ao
desaparecimento de alguma espécie de vida da Terra que ainda possa conter, a
fim de evitar qualquer contaminação daquele planeta.
Ao contrário da
missão Apollo de 1969 em que a ida da Terra à Lua demorou apenas 4 dias, na
altura sentidos como muito longos, a missão Cassini começou há 20 anos, em
Outubro de 1997 e só a viagem desde a Terra até entrar na órbita de Saturno durou
7 anos, tendo para lá chegar usado os impulsos gravitacionais de duas voltas a
Vénus, uma à Terra e uma a Júpiter. No fim do ano de 2004, a nave Cassini enviou
a sonda Huygens que pousou nos primeiros dias de Janeiro de 2005 na superfície
de Titan que, sendo uma das luas de Júpiter, é maior que o planeta Mercúrio. A
Huygens começou de imediato a enviar informações sobre esse planeta para a
Terra. Assim se ficou a saber que Titan tem chuva, rios, lagos e mares, sendo a
sua atmosfera rica em azoto, tal como se pensa que terá sido a atmosfera da
Terra em tempos muito antigos.
A quantidade de
informação obtida pela missão Cassini ultrapassou em muito aquilo que estava
inicialmente previsto já que, originalmente, o seu fim ocorreria em 2008 mas
foi possível prolongá-la em várias fases que ampliaram a sua duração.
A missão Cassini representou
um esforço técnico e financeiro gigantesco e foi tornada possível pelo trabalho
conjunto da NASA, da Agência Espacial Europeia e da Agência Espacial Italiana.
Em concreto, a sonda Huygens que poisou na superfície de Titan foi projectada e
construída na Europa e fica a marcar um feito extraordinário, por ser o
primeiro artefacto humano a pousar num planeta do sistema solar exterior e daí
enviar mensagens para a Terra.
Quer a missão
Apollo, quer a missão Cassini são a prova da capacidade humana mas, acima de
tudo, a demonstração de que ao contrário do que se possa vulgarmente pensar,
mesmo em tempos conturbados e perigosos a Humanidade ainda é capaz de
surpreender pela positiva, transformando sonho em realidade.
segunda-feira, 17 de abril de 2017
Aprender a ser corrupto (desde bem cedo)
A regularidade com
que certos acontecimentos se repetem é de tal forma semelhante à dos eventos
astronómicos, que já não deveriam criar qualquer admiração quando surgem. É o
caso das tropelias dos jovens nas suas viagens de finalistas. Todos os anos há
notícias de comportamentos lamentáveis em hotéis e estâncias de turismo que
servem às mil maneiras para a hipocrisia nacional manifestar o seu escândalo,
para paizinhos mostrarem quanto gostam dos seus filhinhos a ponto de os
desculparem de todos e quaisquer disparates e para hoteleiros de baixa
categoria mostrarem como estão disponíveis para ganhar dinheiro à custa
criminosa de “bares abertos” disponíveis para jovens com menos de vinte anos.
Este ano não houve
nada de diferente do que infelizmente se passa neste tipo de viagens há dezenas
de anos, a não ser nenhum estudante ter morrido por se atirar de uma varanda
não acertando na piscina, vá lá, do mal o menos, que tudo o resto tem cura.
Mas houve alguma
informação que escapou para o exterior neste caso e que, essa sim, embora
silenciada pela comunicação social, é verdadeiramente merecedora de atenção. E
o simples facto de ter passado incólume diz bem da categoria do moralismo vesgo
que grassa pela nossa sociedade.
No meio da
discussão sobre as relações entre hoteleiros e organizadores de viagens
especializados em excursões de estudantes, lá se ficou a saber que estas (ou,
pelo menos, algumas delas) “agências de viagens” patrocinam listas para associações
de estudantes que, depois de eleitas, lhes “adjudicam” a organização dessas
viagens.
A corrupção tem
sido uma matéria que, em especial nos últimos tempos mercê da notoriedade de
alguns dos arguidos, acusados e mesmo condenados, tem lugar garantido na
comunicação social e nas preocupações de cidadãos honestos e preocupados com o
que se passa na sociedade. Até há uns tempos, em matéria de corrupção Portugal
surgia dentro da média dos países em termos mundiais, mas nos três primeiros
lugares dentro da União Europeia. Hoje em dia, perante a evidência das ligações
espúrias ou mesmo criminosas que se foram estabelecendo entre banca, grandes
empresas e personalidades políticas de grande relevância, a sensação
generalizada é de que, entre nós, a corrupção se tornou um verdadeiro flagelo.
E quem sofre com esta situação é sempre quem trabalha e paga os seus impostos a
tempo e horas, sem lhes tentar fugir, mal imaginando que, há algum tempo, o
Banco Mundial dizia que, sem corrupção, o nosso rendimento per capita
triplicaria, colocando-se ao nível do da Finlândia.
A corrupção
funciona como um estado paralelo, que desvia dinheiro para o bolso de alguns,
em vez de servir para pagar funções do Estado, saúde, educação, dívida pública,
etc. Por isso, para além das questões éticas, uma simples posição de
consideração racional sobre a economia do país e sobre justiça social deveria
criar um forte espírito de condenação social da corrupção. Ao contrário, o que
se nota é a ideia generalizada de que só não rouba quem não pode e que o
verdadeiro problema é ser apanhado. A única sanção social sensível passou a ser
ir para a cadeia: quem é condenado a sanções que não incluem prisão não é visto
como criminoso e pior, continua a agir socialmente como se nada se tivesse
passado.
Mais uma vez,
estamos perante um problema de educação. Se a corrupção não for genericamente
considerada como um grave mal social, a sua desculpabilização é automática. Se
esta noção, que parece bem simples, não for transmitida aos jovens com
eficácia, resta o medo da aplicação da Lei, o que é bem pouco.
O facto de as
campanhas eleitorais para as associações de estudantes serem financiadas por
agências de turismo que, mais tarde, vão organizar as viagens dos estudantes,
significa apenas que nas próprias escolas se aprende vício e corrupção sem
qualquer penalização. Para esses estudantes, a corrupção torna-se a normalidade
e não a excepção, algo que lhes ficará para a vida toda, já que se sabe bem
que, em corrupção, o mal está em começar.
Inacreditavelmente,
não se ouviu um comentário, uma crítica que fosse a estas actividades, quer das
associações de pais, quer do ministério da Educação. Mais uma razão para os
jovens em formação de personalidade concluírem que, se de facto muita gente se
escandaliza com a destruição de bens, toda a gente admite como aceitável a
circulação de dinheiros ente associações de estudantes e agentes económicos que
lhes prestam serviços. Apetece dizer: depois admirem-se que a corrupção alastre
a todos os níveis da sociedade.
segunda-feira, 10 de abril de 2017
Ferida antiga que resiste a sarar: a escravatura
A consideração de
que “Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos”
é de 1948 e constitui o texto do Artigo 1º da Declaração Universal dos Direitos
Humanos.
A escravatura é,
talvez, uma das chagas mais profundas, impressivas e duradouras da Humanidade,
ao longo da sua História e das que mais fazem sentir a necessidade da afirmação
primeira da Declaração dos Direitos Humanos.
Se no início surgiu
como uma das consequências das guerras, em que os sobreviventes do lado dos
derrotados eram quase sempre feitos escravos ao serviço dos vencedores, evoluiu
posteriormente para outras formas, mais ligadas ao racismo e ao poderio político/económico.
Quando os
portugueses navegaram pela costa africana até atingir as Índias foram
estabelecendo pontos de comércio que rapidamente incluiu os escravos que lhes
eram trazidos na sequência de lutas tribais no interior, negócio até aí detido
pelos árabes que dirigiam os escravos para o norte de África e daí para a
Europa. Desde o século XV até meados do século XIX, o negócio da escravatura na
costa africana desenvolveu-se de uma forma impressionante, calculando-se que
nesse período saíram dali cerca de 12 milhões de homens e mulheres para as
Américas. As condições de transporte nos navios eram de tal ordem que, daquele
total, dois milhões saíram de África, mas nunca chegaram à América.
As rotas eram
várias, usando como pontos principais de embarque da mercadoria humana a Guiné
com passagem por Cabo Verde, a Mina através fortificação de S. João da Mina construída
pelos portugueses mas depressa tomada pelos holandeses, Angola de onde se
estima que, juntamente com o Congo, terão saído 40% dos escravos idos como
mão-de-obra para as américas e Moçambique de onde foram levados muitos
africanos para o Rio de Janeiro, no Brasil.
Não se pense que os
portugueses estiveram sozinhos nesta actividade vergonhosa que, durante vários
séculos, forneceu com mão-de-obra escrava os campos de algodão, açúcar e café
das américas. Estiveram bem acompanhados por ingleses, franceses, espanhóis e
holandeses.
O comércio de
escravos só viria a ser internacionalmente abolido em 1836, depois de uma
primeira condenação no Congresso de Viena, em 1815. A Inglaterra aboliu a
escravatura em 1833, compensando financeiramente os donos dos escravos. Em
Portugal a escravatura foi abolida na década de 1850 por um decreto do Marquês
da Sá da Bandeira, mas a sua extinção só ocorreu oficialmente em 1878. Mas na
década de 1940 ainda se discutia entre nós um “Estatuto do Indigenato” que
denuncia, para além de um tratamento dos africanos obviamente derivado de
atitudes racistas, uma organização específica do seu trabalho que não andava
muito longe da escravatura.
Hoje em dia permanecem várias formas de escravatura, que têm
sido denunciadas como “escravatura moderna”. O papa Francisco tem sido muito
veemente na denúncia das novas formas de escravatura causadas pela pobreza,
pelo subdesenvolvimento e pela exclusão, combinadas com a falta de acesso à
educação, apontando os exemplos da prostituição e do tráfico de órgãos. Não se
podem esquecer igualmente os “refugiados” que nas suas viagens sofrem a fome,
se vêem despojados da liberdade e dos seus bens e são vítimas de abusos físicos
e sexuais.
Instituições que se dedicam à denúncia das novas escravaturas,
apontam para a existência, em 2016, de quase 46 milhões de pessoas nessas
condições nos 167 países constantes do “The Global Slavery Index”. Felizmente
Portugal, juntamente com a quase totalidade dos países europeus, encontra-se
nos últimos 20 lugares dessa lista de países em que, nos infames lugares
cimeiros absolutos, surgem a Índia, a China, o Paquistão, o Bangladesh e o
Uzbequistão. Em termos percentuais juntam-se-lhes a Coreia do Norte, o Camboja
e o Qatar. Não nos podemos distanciar deste problema, desde logo por princípio,
mas também porque vários destes países fornecem a mão-de-obra barata que produz
bens consumidos na Europa, na América do Norte, no Japão e na Austrália.
Para vergonha da Humanidade, a escravatura existiu e existe
ainda hoje. Muitas pessoas não estarão conscientes do que significou no passado
e, muito menos, das formas de que se reveste ainda hoje. Nenhum de nós é
responsável pelo que os nossos antepassados fizeram há centenas de anos, mas já
o somos pelo que acontece ao nosso lado ainda hoje, virando a cara e seguindo
em frente como se não tivéssemos nada a ver com isso.
segunda-feira, 3 de abril de 2017
Comemorar 60 anos
Se sessenta anos é um período de tempo bastante curto no que
respeita à vida dos países, já o mesmo não se pode dizer quanto à duração de
períodos de paz e de prosperidade.
É hoje uma moda generalizada desfazer na União Europeia e
considerá-la responsável pelos problemas com que se debatem diversos países da
União, esquecendo tudo o que de positivo trouxe durante a sua existência e as
extraordinárias potencialidades que ainda contém, pesem embora os erros
evidentes que têm sido cometidos.
Há sessenta anos, em 25 de Março de 1957, os representantes
plenipotenciários de seis países europeus, a França, a Alemanha Ocidental, a
Itália, a Bélgica, a Holanda e o Luxemburgo sentaram-se à mesa numa sala magnífica
do “Pallazo dei Conservatori” na “Piazza del Campidoglio” em Roma, para assinar
uma declaração conjunta, que ficou conhecida como o Tratado de Roma. Assim
nascia a Comunidade Económica Europeia que estabelecia uma união económica e um
mercado comum. Foi aí que surgiram instituições como a Comissão Europeia, o
Conselho de Ministros, o Parlamento Europeu e o Tribunal Europeu de Justiça,
hoje bem conhecidos de todos nós.
Aquele acto fundacional não surgiu, contudo, do nada. As duas
grandes guerras europeias da primeira metade do século XX que, pela sua
dimensão acabaram por ser tornar mundiais, haviam sido tão terríveis e tinham
criado feridas tão profundas, que aqueles países europeus decidiram escolher um
caminho novo que evitasse novos conflitos bélicos europeus. Fundamentalmente a
Alemanha e a França, a que se vieram a juntar os outros 4 países, tinham que
ultrapassar velhos e graves sentimentos de ódio e enterrar rivalidades,
encontrando caminhos comuns de paz e progresso. Assim, logo em 1951, escassos
anos após o fim da guerra, os seis países começaram por assinar em Paris a
criação da Comunidade Europeia do Carvão e do Aço com o objectivo declarado de
obter uma paz duradoura através da colaboração, como sintetizou o ministro francês
Robert Schuman na sua afirmação feliz e célebre: “tornar a guerra, não só
impensável, mas materialmente impossível”. Logo aí ficou estabelecido que a paz
e a prosperidade no continente europeu exigiam a perda de alguma soberania
nacional a favor de instituições comuns, com integração económica e política.
A CEE foi evoluindo e crescendo. O primeiro alargamento deu-se
em 1973 com a entrada do Reino Unido, da Irlanda e da Dinamarca. Em 1986,
Portugal entrou juntamente com a Espanha e em 1993 a CEE passou a ser a União
Europeia. O alargamento continuou e os últimos países a entrar na UE foram a
Bulgária e a Roménia em 2007 passando para um total de 28, havendo neste
momento vários países na fase de transição para entrarem. O sonho da criação de
uma moeda única, objectivo oficial da CEE desde 1969, concretizou-se em 2002,
com o início da circulação do Euro em substituição das moedas nacionais dos
países que aderiram à zona euro.
O Reino Unido não entrou na CEE no seu início fazendo-o apenas
em 1973, nunca tendo aderido ao Euro, mantendo a Libra como a sua moeda
própria. A relutância da participação do Reino Unido foi sempre evidente, tendo
terminado agora com o pedido definitivo de saída, formulado quase
simbolicamente em 29 de Março de 2017, quatro dias depois da celebração dos 60
anos da União Europeia.
Como se imagina, a governação de uma união internacional que
agora ficou com 27 países nunca poderá ser uma tarefa fácil. A integração
económica e monetária sem uma profunda cooperação financeira dificulta as
coisas, quando da união fazem parte países com características tão diferentes
como Portugal e a Suécia, por exemplo. Daí o desafio, que não pode ser
transformado numa cedência a nacionalismos que mais não significam que o
regresso a um passado sombrio que tanta desgraça trouxe aos povos europeus. Um
pormenor que não devemos esquecer é que, dos actuais países que constituem a
União Europeia, apenas 12 eram democracias aquando da fundação em 1957.
Apesar das diferenças entre os 27 países, qualquer um deles é uma miragem de sonho para os cidadãos da maior parte do mundo e daí vem uma boa parte das dificuldades actuais. Aos nossos jovens deixo aqui apenas um desafio: sejam exigentes com os políticos e não se deixem enganar por palavras encantatórias que apenas pretendem trazer um passado que era solo fértil para todos os extremismos políticos e imaginem o que seria voltar a uma Europa em que tivessem de parar e mostrar passaporte em fronteiras restabelecidas.
Apesar das diferenças entre os 27 países, qualquer um deles é uma miragem de sonho para os cidadãos da maior parte do mundo e daí vem uma boa parte das dificuldades actuais. Aos nossos jovens deixo aqui apenas um desafio: sejam exigentes com os políticos e não se deixem enganar por palavras encantatórias que apenas pretendem trazer um passado que era solo fértil para todos os extremismos políticos e imaginem o que seria voltar a uma Europa em que tivessem de parar e mostrar passaporte em fronteiras restabelecidas.
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