segunda-feira, 21 de agosto de 2023

Aprender com a História

 


Que aprendemos muito pouco com a História é uma verdade quotidianamente provada, nas mais diversas áreas, incluindo a Guerra.

Quando o Marechal Massena iniciou a terceira Invasão Francesa a Portugal fez publicar uma proclamação em que afirmava: “Não entrámos no vosso território como conquistadores. Não viemos para vos dar guerra, mas para combater aqueles que vos obrigam a guerrear”. Assim começava a mais destrutiva das invasões ordenadas por Napoleão. Com uma justificação, ou desculpa conforme lhe quisermos chamar, gasta de tanto uso mas ainda utilizada nos nossos dias. Basicamente foram as palavras de Putin em Fevereiro do ano passado quando mandou invadir militarmente um país soberano, a Ucrânia.

A proclamação de Massena espelhava uma preocupação pela resistência que os civis portugueses pudessem opor à invasão, cujo objectivo era tomar Lisboa e instalar no país um regime dominado por Napoleão à semelhança do já sucedido noutras paragens. Mas pretendia também usar alguma revolta popular contra a atitude dos aliados ingleses, que mais faziam Portugal parecer um protectorado inglês. A proclamação surgia necessária depois de uma surtida pelo território do marquês de Alorna, um português ao serviço dos franceses, que verificou por si mesmo a revolta dos camponeses contra os franceses obedecendo, ainda que contra vontade, às directivas de Wellington que impunham a destruição de tudo o que pudesse interessar aos franceses. O que era importante para Massena, já que naquele tempo os exércitos sobreviviam daquilo que encontravam e pilhavam nos locais por onde passavam.

Foi em Agosto de 1810 que os exércitos franceses de Massena cercaram a praça-forte de Almeida, depois de tomada Ciudad Rodrigo. Ao fim da tarde do dia 27 desse mês uma terrível explosão do paiol de pólvora de Almeida surpreendeu sitiados e sitiantes, matando cerca de 600 soldados de artilharia e 200 artilheiros, bem como cerca de 500 civis. Massena tinha o caminho livre para entrar em força em Portugal, apenas sendo detido nas Linhas de Torres, já perto de Lisboa, embora sofresse percalços pelo caminho como aconteceu no Bussaco, consequência de más opções suas.

A terceira invasão foi terrível em termos de perdas de vidas, mas também de destruição de terras e património. Depois da retirada dos franceses em Abril de 1811 pouco ou nada restava do Portugal anterior, exaurido e faminto, com hordas de banditismo a dominar o interior do país. As elites que anteriormente governavam o país tinham praticamente desaparecido, deixando lugar a que novas surgissem, assim abrindo caminho ao liberalismo, mas essa já é outra história.


 Neste mês de Agosto de 2023 ao prestar tributo aos portugueses de há 213 anos que resistiram contra o invasor com tanta bravia mas sobretudo sofrimento não podemos deixar de estabelecer comparações com a invasão da Ucrânia pela Rússia e não só pelas razões apresentadas, mas também pela destruição sistemática de um país. As armas podem ser diferentes, mas a relação de dimensões do atacante e do invadido é semelhante. Tal como o é a completa falta de consideração para com os civis apanhados no caminho dos exércitos, com massacres perpetrados contra homens, mulheres e crianças sem culpa nenhuma do que acontece. E como o é a resistência patriótica de um povo contra quem o invade, contra todas as probabilidades e apesar da traição de tantos que pertencendo a elites privilegiadas pensam apenas nos seus interesses imediatos.

Se Putin e os seus oligarcas de serviço se dedicassem por uma vez que fosse a estudar os clássicos ocidentais em vez de insultarem sistematicamente o nosso modo de vida e os valores liberais, poderiam aprender alguma coisa com Aldous Huxley quando escreveu: "(…) Que os homens não aprendem muito com as lições da História é a mais importante de todas as lições que a História tem para ensinar (…)”. Mas não tenho essa esperança.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 21 de Agosto de 2023

Imagens recolhidas na internet

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