Depois de um período atípico em que duas segundas-feiras, dia de publicação dos “Visto de Dentro”, coincidiram com feriados em que não se publicou o Diário de Coimbra, estamos de regresso à normalidade.
Entrámos no ano em que se comemoram 50 anos sobre o 25 de Abril o que, para quem o viveu, parece mentira. Cinquenta anos já! Grande parte da população portuguesa, senão mesmo a maior parte, já nasceu depois daquela data e a esmagadora maioria não tem consciência de viver noutro regime que não o democrático.
Talvez por essa razão seja hoje possível assistir a tantas posições que desconsideram a Democracia, por não haver consciência das implicações de existência de polícia política, censura e, acima de tudo, de a soberania não residir no povo e na sua escolha livre de quem o deve governar em cada momento. Aqui reside a essência da Democracia que, se não significa que as escolhas do povo sejam sempre certas, é o único regime que garante a substituição de governos e partidos sem necessidade de revolução, apenas pelo exercício de eleições.
É certo que as Democracias passam de novo por um período difícil um pouco por todo o mundo fazendo lembrar, talvez, o que se passou há cem anos quando ideologias então nascentes deram origem a tremendas ditaduras como o fascismo, o nazismo e o comunismo que tiveram como consequência o sofrimento e morte de muitos milhões de pessoas.
Mesmo as democracias que se julgariam mais estabilizadas pela sua duração apresentam fracturas que deixam passar as mensagens populistas que abrem caminho à aceitação de soluções não democráticas. Na semana passada soube-se de uma sondagem nos EUA segundo a qual “50% dos inquiridos com idade entre os 18 e os 45 anos não acreditam que a democracia seja o melhor sistema”. Já entre os maiores de 65 anos 90% têm opinião contrária. O que significa que as camadas mais jovens não acreditam nas virtudes da democracia, certamente consequência das opções dos dois partidos americanos mais importantes, o Republicano e o Democrata. Olhando para a gerontocracia que actualmente está à frente dos dois partidos talvez se perceba melhor o que está a suceder, que é extremamente perigoso para os próprios EUA e, consequentemente, para o resto do mundo. Escuso de lembrar o que se passou no Reino Unido aquando do Brexit quando a classe política deixou à solta o populismo mais radical e até incompreensível numa democracia com centenas de anos.
Leva esta crónica no título uma pergunta a que se deve dar resposta. Na realidade, se a Democracia parece estar em crise, isso deve-se à sua própria essência. Porque, sem confronto de ideias e de práticas governativas aos diversos níveis, sem conflito, não há Democracia. Como é através dos partidos que as escolhas se fazem em Democracia, é da responsabilidade destes explicar ao que vêm sem ambiguidades e marcando claramente as diferenças entre uns e outros. A elevadíssima taxa de abstenção que tem vindo a verificar-se de eleição para eleição é indício seguro de que a confiança nas diversas forças partidárias anda muito por baixo, sendo esta a melhor altura para lembrar a quem não participa nas eleições que essa é a melhor maneira de entregar o poder a quem não o merece. Este é, pois, o período em que se espera que os partidos façam o que lhes compete antes de eleições, para que não seja a própria Democracia a ampliar o número daqueles que já não reveem nela ficando disponíveis para aceitar outra solução qualquer.
Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 8 de Janeiro de 2024
Imagens recolhidas na internet
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