Chegámos finalmente a um ponto em que já todos percebemos de que forma o caminho da nossa economia está traçado; sabendo isso, devemos ter consciência de que a vida tem muito mais para além das dificuldades económicas que nos esperam por muitos e bons anos, para que a nossa satisfação interior seja alcançada, o que é essencial para o equilíbrio das pessoas, mas também das sociedades.
De entre outras, é essa uma das razões por que a Cultura tem hoje em dia, e deverá continuar a ter no futuro, uma grande importância social e até económica. Os cortes em despesas, tantas vezes cegos, não deveriam pois atingir de forma insensata a cultura, tão importante para a sociedade.
Uma das áreas culturais mais importantes em todo o mundo é a chamada música erudita. Importante, porque define claramente o nível cultural de um povo. Importante, porque permite aos jovens, que a ela têm acesso, adquirirem uma postura social completamente diferente daqueles que infelizmente não têm essa oportunidade.
Contra ventos e marés, apenas com o apoio permanente e possível da Câmara Municipal de Coimbra e de alguns patrocínios, a Orquestra Clássica do Centro que sucedeu à Orquestra de Câmara de Coimbra, tem vindo a afirmar-se em toda a região Centro, com dezenas e dezenas de concertos e centenas de presenças em acontecimentos diversificados. Isto para além de proporcionar condições para formação musical de crianças e jovens. Com nove anos de existência, a OCC desde há dois que ocupa o Pavilhão Centro de Portugal no Parque Verde do Mondego.
Pessoalmente, já por diversas vezes referi nestas páginas a relevância cultural da actividade da Orquestra Clássica do Centro. Tenho ainda dado conta da mágoa sentida por muitos, pelo facto de o Ministério da Cultura não apoiar a OCC como pareceria ser sua estrita obrigação, escudando-se muitas vezes com desculpas esfarrapadas e mesmo injustas, como a acusação de falta de qualidade, ou por apoiar já outra orquestra clássica na região, que na realidade é uma formação mais pequena e com uma actividade pública bem mais reduzida. Se a Cultura apoia, e porventura bem, numerosas companhias teatrais na mesma região, porque não o fará com a música clássica? Estará a música erudita condenada a ser sempre o parente pobre da Cultura entre nós? Acaso entenderão os responsáveis políticos pela área da Cultura que a Música não ajuda à formação dos jovens? Ou será mesmo porque está sedeada em Coimbra?
Coimbra deve muito à Direcção da Orquestra Clássica do Centro e ao Maestro Virgílio Caseiro, como é já sobejamente conhecido. Muitos não saberão, no entanto, que há mais pessoas sem as quais os resultados já alcançados não seriam possíveis. Desde logo, o presidente da Câmara, Dr. Carlos Encarnação, sem quaisquer dúvidas. Mas há outro responsável que aqui deve ser referido. O Prof. Linhares Furtado é bem conhecido pela sua extraordinária relevância no campo da Medicina não apenas em Coimbra, mas em todo o mundo. Para além do pioneirismo das suas cirurgias e das técnicas sofisticadíssimas que desenvolveu nessa área que passaram a ser praticadas em hospitais um pouco por todo o lado, é conhecido por ser um Médico, para além de cirurgião. Isto é, para ele os doentes existem muito para além das mesas cirúrgicas, em toda a complexidade do ser humano que sofre.
Este humanismo não podia deixar de ser transportado para outras áreas. Foi assim que a certa altura o Prof. Linhares Furtado, grande amante e conhecedor da música erudita ou clássica, como muitos lhes chamam, se dedicou de alma e coração à obra da Orquestra Clássica do Centro. Certamente que sem a sua acção e apoio discreto, mas decisivo, a OCC não seria o que é hoje. Coimbra teve a sorte de acolher este Açoriano de origem que, para além de uma vida inteira como Médico e Cientista do melhor que há no mundo, tanto tem feito em prol da Cultura na nossa cidade. Saibamos merecer.
Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 14 de Junho de 2010