O leitor sabe o que é o “centro de Portugal”? Talvez tenha uma ideia, mas na realidade não sabe, porque isso não existe. Mas sabe com certeza o que é Coimbra. Nesse conhecimento está aliás acompanhado por quase todo o mundo. No mundo globalizado em que as marcas dominam a vida económica, desperdiçar uma marca com o valor de Coimbra é, não só disparatado, mas um crime económico.
Dir-me-ão que esta é uma verdade lapalissiana que nada tem de novo e será verdade. Mas, pelos vistos, é necessário recordá-la permanentemente. Coimbra continua inundada de belos cartazes do Turismo de Portugal numa campanha com o lema “Descubra Portugal – um país que vale por mil”. Descontando a frase pateta, que é apenas publicidade sem sentido (vale por mil quê? mil países? mil euros? mil publicitários?) as três fotografias de Lisboa, Porto e Coimbra são de facto muito bonitas. Claro que sobre a foto de Lisboa está escrito “Lisboa e Vale do Tejo”, sobre a foto do Porto aparece escrito “Porto e Norte”. Já sobre a foto da nossa Cidade aparece “Centro de Portugal”. A palavra Coimbra parece ser proibida no “Turismo de Portugal”. Talvez por isso a capital do “Turismo da região Centro” tenha ido para Aveiro. Mas para a foto representativa, Coimbra já serve. É preciso ter lata para colocar estes cartazes em Coimbra!
Coimbra não precisa de se por em bicos de pés para se afirmar turisticamente. Apenas precisamos de aproveitar o que temos. Já em tempos referi aqui o valor turístico e económico da História de Coimbra, fundamentalmente no período em que se confunde em absoluto com a de Portugal que é a Primeira Dinastia.
Recorda-se o essencial. O nosso primeiro Rei poderá ou não ter nascido em Coimbra, mas foi aqui que estabeleceu a primeira Capital do Reino e é aqui que está sepultado. O seu filho Rei D. Sancho I cá nasceu e está sepultado como o Pai, na Igreja de Sta. Cruz. Cá nasceram os reis seguintes, D. Afonso II, D. Sancho II e D. Afonso III.
A nossa Rainha Santa (Isabel de Aragão) é uma figura de tal densidade e tão conhecida que dispensa mais comentários, estando sepultada em Coimbra. O seu marido, o Rei D. Dinis, fundou a primeira Universidade portuguesa em Coimbra através da “Magna Carta Priveligiorum”.
Aqui decorreram os amores de Pedro e Inês; na Quinta das Lágrimas está a “fonte dos Amores” e cá se passaram os actos trágicos da morte de Inês e subsequentes.
Foi nas “Cortes de Coimbra” de Abril de 1385 que o Mestre de Aviz foi proclamado Rei, encerrando-se a Primeira Dinastia, resolvendo-se a crise política de 1383/85 e dando-se início à Segunda Dinastia que projectou Portugal no mundo como ninguém na altura poderia supor.
Em Coimbra está a Sé Velha construída durante o reinado de D. Afonso Henriques, onde está sepultado D. Sesnando Conde de Coimbra e em Coimbra está também o Mosteiro de Sta. Cruz fundado pelo primeiro Rei e que é Panteão Nacional por lá estar o seu túmulo.
Em Coimbra estão o Mosteiro de Sta. Clara-a-Nova onde se encontra o túmulo da Rainha Santa, o Mosteiro de Sta. Clara-a-Velha que foi alvo de uma recuperação extraordinária e a Quinta das Lágrimas local do drama dos amores de Pedro e Inês. Em Coimbra está também a primeira universidade portuguesa ocupando aquele que foi o Paço de El-Rei onde decorreram as Cortes de Coimbra.
Em Coimbra existe o Convento de Celas fundado por D. Sancha, filha do segundo Rei de Portugal.
Com tudo isto, basta juntar as peças e organizar um programa turístico de carácter histórico-cultural sobre a Primeira Dinastia associado a Coimbra, para ter um produto concreto de altíssimo valor económico. Com ou sem Turismo do Centro. Nem é preciso construir nada. Software e não hardware, de novo.
Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 22 de Novembro de 2010