sábado, 13 de novembro de 2010

O ESTADO (SEM) DA VERGONHA

Vasco Pulido Valente escreveu sobre a vergonha que é a PGR pedir denúncias anónimas, coisa que incrivelmente é saudada por muita gente (enquanto não lhes baterem à porta, claro):

«O Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP) instalou na Internet um site (de que os jornais se apressaram a dar o "endereço") para denúncias de "casos de corrupção e fraude" e, pior ainda, para os denunciantes seguirem passo a passo o resultado do seu honroso "trabalho" e, se necessário, acrescentarem um ou outro pormenor que faça falta. A dra. Cândida de Almeida, directora do DCIAP, explicou a posição oficial: o Ministério Público quer "interagir" com os facínoras que apontam o próximo à polícia para os tranquilizar sobre a eficácia do seu imprescindível civismo e para, eventualmente, lhes pedir ajuda. Antigamente, havia regimes que usavam "caixinhas" para a carta anónima. Hoje a Internet permite o mesmo anonimato e uma cooperação mais sofisticada. Qualquer cidadão que deteste a prima, a tia ou cunhada, ou que se queira livrar de um concorrente, pode com uma simples "visita" ao site da DCIAP meter a criatura num enorme sarilho, com a paternal protecção da autoridade. O que sucede às vítimas aparentemente não interessa ao Ministério Público. Elas, por assim dizer, que se arranjem. A dra. Cândida de Almeida sabe com certeza que a mais leve suspeita chega para arruinar uma reputação. E que uma reputação arruinada nunca ou quase nunca se recompõe. Mas não parece que esse pequeno facto a perturbe. Como certamente não a comove convidar os portugueses (principalmente, o funcionalismo e os trabalhadores do "sector empresarial do Estado") à baixeza sem nome da denúncia. É preciso que a noção de "serviço público" se tenha degradado a um ponto difícil de imaginar para que se ache natural - e até louvável - recorrer a métodos como o site da DCIAP. A dra. Cândida de Almeida responderá talvez que se limita a lutar contra a corrupção e a fraude, sem perceber que o seu site corrompe o carácter da cidadania e, em última análise, também ele indirectamente promove a fraude. Acabámos por chegar a isto.»

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