Das quase
certas surtidas dos Vikings nórdicos nos séculos VIII e IX pela costa atlântica
da Península Ibérica que hoje é portuguesa não reza a História. Haverá,
eventualmente, sinais indirectos de que o nome Lordemão no Concelho de Coimbra
poderá ser um deles, dada a semelhança com Lordemanos em Leão onde terá
existido uma colónia viking, como sugerem alguns autores. Já da passagem dos
Fenícios por estas paragens, muito tempo antes, há muitos vestígios de que um
exemplo é o porto que está debaixo da A 14 em Santa Olaia ao pé de
Montemor-o-Velho.
Povos dos
mais antigos que, viajando pelo Atlântico, entraram pela ria que então
existiria e subiram o rio que hoje chamamos Mondego e que ainda durante a Idade
Média se chamava Munda. As águas eram navegáveis até onde surgia o primeiro de
muitos montes, a montante do qual só embarcações mais pequenas podiam subir o
rio. Foi precisamente aí que, desde tempos imemoriais, se fixaram habitantes
que usando o porto fluvial ligado ao mar, tanto recebiam mercadorias trazidas
pelos barcos, como expediam produtos vindos das serranias do interior.
Ao longo dos
séculos e depois de conquistas e reconquistas por povos diferentes que iam e
vinham, a estabilização final chegou no século XI com a reconquista cristã
final por D. Fernando I o Magno, ainda antes da História de Portugal, que
entregou o governo da cidade e região ao moçárabe D. Sesnando cujo túmulo está
na Sé Velha.
Se a
existência da cidade de Coimbra começou por ser consequência das
características orográficas e hídricas da sua região, a própria cidade passou a
ser, a certa altura, actor de influência na região, no país e mesmo no mundo. Na
região, porque começando por ser a fronteira de onde partiram as conquistas a
Sul, determinou o surgimento de numerosas estruturas defensivas à sua volta. No
país, porque foi a primeira capital de Portugal, onde nasceram todos os reis da
primeira dinastia, havendo apenas dúvidas sobre o local de nascimento de D.
Afonso Henriques que, no entanto, aí tem o seu túmulo no Mosteiro de Sta. Cruz.
Abrigando a que durante muito tempo foi a única Universidade do país, a
influência de Coimbra foi fundamental na língua e na formação das elites do
país, tornando a cidade numa marca global ao ser fonte de emissão de ex-alunos
da sua Universidade para grande parte do mundo.
Como é
natural, a modernidade trouxe a abertura do Ensino Superior, levando-o à
maioria das outras cidades, o que provocou uma perda de influência da
Universidade de Coimbra e, em consequência, da cidade onde está instalada.
Nesse movimento inclui-se a própria Medicina, com a instalação de escolas
superiores em diversas cidades, incluindo na própria região Centro.
A
desindustrialização a que o país assistiu no fim dos anos setenta, acentuada ainda
pela globalização, ditou o fim das indústrias tradicionais de Coimbra, desde a
cerâmica à alimentação, incluindo o fabrico de cerveja. Foi possível manter e
mesmo, felizmente crescer, indústrias cada vez mais sofisticadas de produção de
medicamentos e de desenvolvimento de processos de fabrico de genéricos
exportados para todo o mundo. Surgiram algumas, poucas, empresas ligadas à
informática, mas de grande relevância e notoriedade, dado o mercado
internacional exigente em que operam e que mostram como a ligação da
investigação científica ligada ao ensino superior à actividade económica é
possível e pode servir de âncora ao desenvolvimento económico.
Durante a sua longa
existência, Coimbra passou de circunstância ditada pelos elementos naturais a
cidade viva e influente no mundo inteiro, tendo mesmo construído uma marca que
é imediatamente reconhecível de forma global. Se em determinadas alturas parece
diminuir de importância ou mesmo de prestígio, tem conseguido encontrar em si
as capacidades para ressurgir e se renovar. É o que tem que fazer de novo nos
dias de hoje que têm a grande vantagem de aliar o conhecimento que é cultura, à
capacidade de inovação que a investigação pode potenciar.
Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 2 de Novembro de 2020