Os leitores recordam-se com certeza do vendaval que varreu o mundo islâmico nos primeiros meses de 2006, na sequência da publicação de umas caricaturas sobre Maomé num jornal dinamarquês.
Na altura, muitos políticos e comentadores ocidentais condenaram a publicação daquelas caricaturas, por ofenderem a religião muçulmana, manifestando mesmo a maior compreensão pelas violentas reacções que se seguiram e defendendo mesmo a proibição da sua reprodução.
Curiosamente, um concurso artístico realizado há poucos dias na Austrália teve como vencedora um fotografia manipulada que representa as faces de Jesus Cristo ou de Osama Bin Laden, conforme o ângulo de observação e que foi reproduzida em inúmeros meios de comunicação social.
Não é preciso ser cristão para reconhecer que Jesus Cristo é a imagem da paz e do amor, tendo a sua mensagem original revolucionado toda a humanidade ao pregar pela primeira vez, por exemplo, que todos os seres humanos são iguais perante Deus.
Já Bin Laden, que nem sequer é um líder religioso, é a representação viva do ódio e da violência, afirmação que me parece também indiscutível, observem-se as suas palavras e acções sob que ângulo for.
Fundir as suas imagens numa só é portanto, para além do mau gosto e provocação óbvios, uma manifestação concreta do relativismo que grassa na nossa sociedade de hoje, perante o qual tudo é admissível e tem o mesmo valor.
Mas aquilo que me parece ser mais importante nesta história é a diferença de atitude generalizada perante esta publicação, relativamente às reacções muçulmanas à publicação das caricaturas de Maomé.
Não se viu nem ouviu e muito bem, qualquer reacção destemperada de cristãos e muito menos de responsáveis da Igreja Católica.
Embora qualquer cristão se possa sentir pessoalmente chocado e até insultado com aquela imagem, reconhece-se à sua autora, a artista Joyce Bracks, a liberdade de se exprimir, dando aliás ensejo a que se discuta e comente pacificamente o seu significado, como é o caso desta pequena crónica.
Por esta atitude generalizada do mundo cristão se pode verificar, no concreto, por onde é que passam a tolerância e os valores civilizacionais nos dias de hoje.
Publicado no DC em 17 de Setembro 2007