segunda-feira, 19 de maio de 2025

UMA CAMPANHA TRISTE

 

Quando o leitor colocar o olhar sobre esta crónica, já conhecerá os resultados das eleições que ontem decorreram. Está em vantagem para com o autor destas linhas que as escreve no último dia da campanha e que, portanto, não pode adivinhar, nem o quer fazer, quais esses resultados. O que me coloca numa situação no mínimo curiosa, mas algo interessante. Por um lado, escrevo durante a campanha, por outro, a crónica só será lida depois das eleições. Acresce a vantagem de comentar sem correr o risco de ser acusado de tentar influenciar alguém já que só serei lido depois da escolha eleitoral dos concidadãos com a possibilidade de incidir sobre o que importa deixando de lado a espuma mediática.

No título apelidei a campanha de triste. E foi-o de facto. Era visível que ninguém queria estas eleições que surgiram em consequência da reprovação de uma moção de confiança apresentada pelo Governo depois do sucessivo chumbo parlamentar de duas moções de rejeição. E porque é que depois disto o Governo se viu na necessidade de colocar a moção de confiança? Pela simples constatação de que o primeiro-ministro se iria confrontar com uma comissão parlamentar de inquérito sobre a sua empresa familiar tornando a tarefa governativa uma impossibilidade prática. Contudo, no fim desta campanha eleitoral, o que é praticamente certo é que essa CPI existirá sempre, seja por iniciativa do PS, seja por parte do LIVRE. Embora a sua própria justificação legal seja, no mínimo, muito discutível, por não haver actos concretos governativos que a sustentem.

Pelo lado do PS a campanha foi errática. No início Pedro Nuno Santos ainda começou por tentar adoptar um novo estilo, mais calmo, menos agressivo. Mas na parte final surgiu de novo com a sua personalidade abrasiva característica, apelando ao voto útil da esquerda, mas piscando sempre o olho ao Bloco de Esquerda. E, com a maior desfaçatez, passou a exigir de um governo que durou onze meses, que tivesse obtido os resultados que os governos do PS, de que ele próprio foi uma figura muito relevante, não conseguiram em oito anos. A sua campanha baseou-se em meter medo sobre a governação da AD sem fazer verdadeiras propostas.

Dos partidos mais à esquerda não há grande coisa de novo a ressaltar. Actualmente o PCP tenta um discurso que mais parece social-cristão de apoio aos desfavorecidos, mas lá surge sempre a velha luta de classes por trás. Já o BLOCO DE ESQUERDA fez do problema da habitação o seu grande cavalo de batalha, esquecendo as questões fracturantes, hoje caídas em desgraça. Só que as soluções que apresenta para a habitação, problema real e dramático, só teriam a consequência de piorar o problema, por não resolver nenhuma das suas causas. O congelamento das rendas é algo que está provado ter como consequência a diminuição do mercado de arrendamento e a consequente subida das rendas. O LIVRE tentou uma imagem de esquerda mais fresca e actualizada face aos partidos congéneres europeus, mas frequentemente resvalou para a esquerda clássica com soluções mais do que comprovadamente ineficazes.

O CHEGA foi igual a si próprio. Frequentemente arruaceiro, tal como tem sido na própria Assembleia da República, as soluções que apresenta não o diferenciam dos restantes partidos, sobretudo à esquerda, com subsídios para tudo e despesas sem conta. Subtraídas que lhe foram pelo governo as questões da segurança/polícia e dos imigrantes, o protesto perde importância e diminui a sua atractividade.

No fim desta campanha, ficou um amargo de boca. Os verdadeiros problemas, puramente nacionais, ou consequência do ambiente internacional foram olimpicamente esquecidos pelos partidos. Designadamente pelo PSD e pelo PS e claro, pelo CHEGA. A Justiça, a Economia face ao ambiente externo, os gastos militares, a Educação, a Seg. Social, a Saúde, os transportes públicos, nada disso foi discutido.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 19 de Maio de 2025

segunda-feira, 12 de maio de 2025

HÁ 80 ANOS: FIM DA GRANDE GUERRA

 

Quando somos jovens, um ano demora muito tempo a passar e dez anos, esses então, são uma eternidade. Passados uns anos, ou melhor, umas dezenas de anos, essa sensação desaparece e passamos a ter uma noção da passagem do tempo completamente diferente.

Quando nasci tinha passado menos de uma dezena de anos sobre o fim da II Guerra Mundial. Mas, quando na adolescência tomei consciência desse terrível acontecimento, parecia-me que já estava lá para trás, que se tinha passado há muito tempo, tal como a I Grande Guerra. Mesmo quando os meus Pais me contavam sobre a experiência pessoal do racionamento de alimentos essenciais, não tinha nada a ideia de que tudo tinha acontecido há poucos anos. Quando lia sobre a IIGG, o que fazia com sofreguidão, era quase como se fosse um romance, não tendo a noção de quão próximo tudo aquilo tinha acontecido. Até que tomei consciência de que o meu primo mais velho, o Hélder Firmino, tinha nascido em 1 de Setembro de 1939, precisamente o dia em que a guerra começou oficialmente, com a invasão da Polónia pelas tropas nazis.

Desgraçadamente para a Polónia, passadas duas semanas a URSS declarava-lhe igualmente guerra. Por esse tempo, a Alemanha e a URSS eram aliadas, tendo assinado o chamado “Pacto Molotov-Ribbentrop” de que hoje se conhecem os protocolos secretos que mostram a verdadeira aliança estabelecida entre Hitler e Estaline, só conhecidos após o fim da União Soviética, agora publicados em língua portuguesa pela editora “Guerra e Paz”.

Em 1940 a Alemanha nazi invadiu e conquistou a França, a Bélgica e os Países Baixos numa operação relâmpago e ainda a Dinamarca e a Noruega. Não tendo nunca conseguido invadir a Inglaterra, esta tornou-se no único país europeu a verdadeiramente se opor à barbárie nazi.

Para grande surpresa de Estaline, Hitler invadiu a União Soviética em Junho de 1941, assim alastrando a guerra a toda a Europa. A Operação Barbarossa acabaria por ditar, após quatro longos e mortíferos anos de guerra, o fim de Hitler, já que os russos se defenderam de uma forma heroica, derrotando os exércitos alemães no cerco a Leninegrado. Em Dezembro de 1941 a guerra tornou-se mundial quando o Japão, aliado da Alemanha e de Itália no chamado Eixo, atacou a base americana de Pearl Harbour, fazendo os Estados Unidos entrar na guerra.

O fim da guerra na Europa só se começou a perceber pela invasão da Sicília e depois de Itália, e sobretudo com o desembarque aliado na Normandia em 6 de Junho de 1944. Mas a guerra na Europa continuaria ainda com muitas baixas até à conquista final de Berlim, vindos os exércitos aliados de ocidente e as tropas do Exército Vermelho de Leste. Após o suicídio de Hitler, a Alemanha rendeu-se sem quaisquer condições, sendo a data de 8 de Maio de 1945 considerada o fim oficial da guerra na Europa. A Itália já tinha sido tomada antes com a derrota dos fascistas e a morte do ditador Mussolini. Foi, portanto, há oitenta anos que terminou a II Grande Guerra na Europa. A guerra com o Japão continuaria ainda, com o Império a recusar render-se e a prometer lutar até à morte de todos os japoneses. O lançamento de duas bombas atómicas, arma até então desconhecida com consequências horríveis, sobre as cidades de Hiroxima e Nagasaqui, acabou por obrigar o Japão a render-se em 2 de Setembro de 1945.

Sabemos hoje que a II Grande Guerra continuaria pelo século XX fora sob o nome “Guerra Fria”. Mas essa é já outra questão. Ditou a morte de mais de 65 milhões pessoas. Muitas dessas pessoas morreram porque os nazis decidiram que não tinham direito à vida, apenas por serem, sobretudo judeus, mas também homossexuais, deficientes ou apenas diferentes do “ideal de pureza ariana”. Algo que o mundo nunca tinha visto até então. Comemorar o dia 8 de Maio torna-se, assim, numa obrigação civilizacional e numa homenagem aos milhões que caíram sob o mal absoluto do jugo nazi.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 12 de Maio de 2025

segunda-feira, 5 de maio de 2025

APAGÃO…DO BOM SENSO

 

Há decisões políticas com consequências pesadas, que só por pura sorte não são trágicas, que relevam muito mais da falta de bom senso dos governantes do que da incompetência que também revelam. A passagem do modelo de produção de energia eléctrica para as energias sustentáveis é um caminho justificado pela necessidade de descarbonização. Contudo, como em tudo na vida, o simples bom senso ditaria que passar de sistema complexo com muitos anos para um completamente novo não deveria ser feita sem extremo cuidado. Quando a política pretende andar à frente da realidade técnica, as probabilidades de algo correr muito mal são muito grandes.

O apagão eléctrico que tivemos no passado dia 28 de Abril não foi causado em Portugal, mas sim em Espanha. Mas nem por isso os portugueses deixaram de ficar sem energia e, consequentemente, sem funcionamento de muitos serviços como as telecomunicações. A vida normal de todos nós foi afectada com grandes prejuízos económicos e um stress generalizado entre os portugueses.

Todos nós procurámos informação sofregamente na comunicação social para tentar perceber as razões do que se passou. Foi assim que soubemos que, na altura do apagão, estávamos a importar de Espanha cerca de 30% da energia eléctrica que estávamos a consumir. Significa isso que o mercado eléctrico ibérico, o MIBEL, estava a trabalhar como normalmente. Mas esse facto levou a que importássemos também o problema.

A duração do apagão poderia ser maior, como inicialmente se temeu, mas também poderia e deveria ter sido muito menor do que foi. Na realidade, descobrimos agora que Portugal apenas dispõe de duas centrais de arranque sem apoio energético externo, as chamadas “black start”, na Tapada do Outeiro e em Castelo do Bode. Neste último caso, até foi necessário ir buscar um gerador que não estava no local. Quer isto dizer que, quando o governo de António Costa decidiu fechar as centrais de Sines e do Pego não cuidou de instalar sistemas de “black start” noutras para garantir uma capacidade mínima de reposição do sistema energético nacional. Claro que foi avisado por técnicos, mas a falta de bom senso, muito mais do que a incompetência, levou como habitualmente a que se seguisse em frente de olhos fechados.

Em consequência, na segunda-feira passada os técnicos da REN viram-se aflitos para voltar a colocar a rede em funcionamento. A potência inicial era muito reduzida, as centrais ligavam e desligavam e foi necessária muita capacidade técnica para ir encontrando soluções que, lentamente, fossem alargando a rede funcional a partir das duas centrais, até se cobrir todo o território nacional.

As quase dez horas sem electricidade mostraram muitas das nossas fragilidades. Felizmente, os geradores dos hospitais funcionaram, mas descobriu-se que alguns não tinham os depósitos cheios de gasóleo, enquanto outros não tinham capacidade para um período de funcionamento tão longo. Mas as críticas à ministra respectiva não tardaram como se aqueles aspectos não fossem da responsabilidade das administrações dos hospitais. E, de novo, perante uma emergência nacional como nos fogos de 2017, lá voltámos a ouvir falar de falhas do malfadado SIRESP.

O que mais impressionou neste apagão foi a falta de telecomunicações e de televisão, o que, não fora a velha e fiável rádio, nos teria deixado sem quaisquer hipóteses de saber o que realmente se passava. Bem hajam os velhos sistemas analógicos que continuam a funcionar mesmo quando toda a panóplia digital se apaga. Este apagão acabou por ser um teste que mostrou fragilidades de cuja existência não se desconfiava, muito fruto de investimentos públicos não executados. Haja esperança de que os responsáveis tenham o bom senso de prevenir futuras situações semelhantes, fazendo agora o que já devia estar feito para nossa segurança.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 5 de Maio de 2025