Quando o leitor colocar o olhar sobre esta crónica, já conhecerá os resultados das eleições que ontem decorreram. Está em vantagem para com o autor destas linhas que as escreve no último dia da campanha e que, portanto, não pode adivinhar, nem o quer fazer, quais esses resultados. O que me coloca numa situação no mínimo curiosa, mas algo interessante. Por um lado, escrevo durante a campanha, por outro, a crónica só será lida depois das eleições. Acresce a vantagem de comentar sem correr o risco de ser acusado de tentar influenciar alguém já que só serei lido depois da escolha eleitoral dos concidadãos com a possibilidade de incidir sobre o que importa deixando de lado a espuma mediática.
No título apelidei a campanha de triste. E foi-o de facto. Era visível que ninguém queria estas eleições que surgiram em consequência da reprovação de uma moção de confiança apresentada pelo Governo depois do sucessivo chumbo parlamentar de duas moções de rejeição. E porque é que depois disto o Governo se viu na necessidade de colocar a moção de confiança? Pela simples constatação de que o primeiro-ministro se iria confrontar com uma comissão parlamentar de inquérito sobre a sua empresa familiar tornando a tarefa governativa uma impossibilidade prática. Contudo, no fim desta campanha eleitoral, o que é praticamente certo é que essa CPI existirá sempre, seja por iniciativa do PS, seja por parte do LIVRE. Embora a sua própria justificação legal seja, no mínimo, muito discutível, por não haver actos concretos governativos que a sustentem.
Pelo lado do PS a campanha foi errática. No início Pedro Nuno Santos ainda começou por tentar adoptar um novo estilo, mais calmo, menos agressivo. Mas na parte final surgiu de novo com a sua personalidade abrasiva característica, apelando ao voto útil da esquerda, mas piscando sempre o olho ao Bloco de Esquerda. E, com a maior desfaçatez, passou a exigir de um governo que durou onze meses, que tivesse obtido os resultados que os governos do PS, de que ele próprio foi uma figura muito relevante, não conseguiram em oito anos. A sua campanha baseou-se em meter medo sobre a governação da AD sem fazer verdadeiras propostas.
Dos partidos mais à esquerda não há grande coisa de novo a ressaltar. Actualmente o PCP tenta um discurso que mais parece social-cristão de apoio aos desfavorecidos, mas lá surge sempre a velha luta de classes por trás. Já o BLOCO DE ESQUERDA fez do problema da habitação o seu grande cavalo de batalha, esquecendo as questões fracturantes, hoje caídas em desgraça. Só que as soluções que apresenta para a habitação, problema real e dramático, só teriam a consequência de piorar o problema, por não resolver nenhuma das suas causas. O congelamento das rendas é algo que está provado ter como consequência a diminuição do mercado de arrendamento e a consequente subida das rendas. O LIVRE tentou uma imagem de esquerda mais fresca e actualizada face aos partidos congéneres europeus, mas frequentemente resvalou para a esquerda clássica com soluções mais do que comprovadamente ineficazes.
O CHEGA foi igual a si próprio. Frequentemente arruaceiro, tal como tem sido na própria Assembleia da República, as soluções que apresenta não o diferenciam dos restantes partidos, sobretudo à esquerda, com subsídios para tudo e despesas sem conta. Subtraídas que lhe foram pelo governo as questões da segurança/polícia e dos imigrantes, o protesto perde importância e diminui a sua atractividade.
No fim desta campanha, ficou um amargo de boca. Os verdadeiros problemas, puramente nacionais, ou consequência do ambiente internacional foram olimpicamente esquecidos pelos partidos. Designadamente pelo PSD e pelo PS e claro, pelo CHEGA. A Justiça, a Economia face ao ambiente externo, os gastos militares, a Educação, a Seg. Social, a Saúde, os transportes públicos, nada disso foi discutido.
Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 19 de Maio de 2025