segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Imperador da Língua Portuguesa



Está prestes a terminar o ano em que se comemoram os 400 anos do nascimento do Padre António Vieira.

Dada a vida e obra do padre jesuíta, as comemorações brasileiras foram muito mais significativas que as portuguesas, já que no país irmão se releva a sua acção em prol da cultura e dignidade dos índios brasileiros num tempo em que tal atitude era excepção à regra.

Na nossa Cidade, as poucas acções comemorativas havidas, embora de elevada qualidade e indiscutível interesse, não saíram dos muros da Universidade, razão por que a população em geral não terá dado por elas. Coimbra esteve representada nas Comemorações através do Prof. Doutor Aníbal Pinto de Castro na Comissão Científica e de dois Centros da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra na lista das Instituições Associadas, mas não houve exposições, conferências para o público em geral ou mesmo concursos escolares como se verificou um pouco por todo o país.

Não quero crer que a circunstância de a passagem do Padre António Vieira por Coimbra por volta de 1663 não ter sido muito feliz, ainda hoje se reflicta no tratamento da Cidade à sua memória. De facto, foi nessa altura que depois de anos de perseguição infrutífera a Inquisição o conseguiu encarcerar em Coimbra e o obrigou a responder às acusações que lhe vinha fazendo havia muito tempo.

A acção do Padre António Vieira e da Companhia de Jesus em defesa dos índios do Brasil e a sua luta persistente contra a escravatura valeram-lhe os ódios dos colonos do Brasil e da maior parte da nobreza. A proposta que fez a D. João IV, inusitada para a época, de serem abolidas as distinções entre cristãos novos e cristãos velhos veio ajudar a que o Santo Ofício se juntasse aos seus inimigos e perseguidores.

Para além de toda a polémica que rodeou a sua vida, há no entanto algo perene que nos legou e que leva a que muitos o considerem o “Imperador da Língua Portuguesa”, que são os seus muitos escritos.

Muitos deles contêm ensinamentos que ainda hoje são actuais e cujo conhecimento nos poderia ajudar na nossa vida.

Dos seus brilhantes sermões, um há de que não resisto a citar um breve trecho, que se chama “Sermão do Bom Ladrão”:

"Levarem os reis consigo ao Paraíso ladrões não só não é companhia indecente, mas acção tão gloriosa e verdadeiramente real, que com ela coroou e provou o mesmo Cristo a verdade do seu reinado, tanto que admitiu na cruz o título de rei. Mas o que vemos praticar em todos os reinos do mundo é tanto pelo contrário que, em vez de os reis levarem consigo os ladrões ao Paraíso, os ladrões são os que levam consigo os reis ao inferno."


Publicado no Diário de Coimbra em 8 de Dezembro de 2008

sábado, 6 de dezembro de 2008

Bom fim de semana

"We have all the time in the world"

AM VOX TRANSPONDER

Em especial para o amigo Léo do Brasil que percebe de Aston Martin's, aqui fica uma ligação da Jaeger-LeCoultre que, estou certo, apreciará:

Amvox Transponder

quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

As nossas ajudas

Os jornais de hoje anunciam medidas económicas do Governo que visam incentivar a troca de automóveis, para ajudar o sector automóvel.
Porquê o sector automóvel?
As outras áreas económicas não estão em crise?
No fim de semana passado soube-se que, pela primeira vez em vinte anos, os casinos estão a perder dinheiro. Não se arranjam por aí uns euros para ajudar os amigos dos casinos?
Agora a sério. Todo o país está ou vai estar em recessão. Esta obsessão de ir a correr atrás de sector em crise está a criar injustiças profundas e a cavar um buraco no défice que todos vamos pagar com línguas de palmo, muito em breve.
Lembram-se das consequências das nacionalizações do Vasco Gonçalves que andámos a pagar durante dezenas de anos?
Pois a continuar assim, num dia destes acordamos e o Estado é outra vez dono de mais de 50% do PIB.



terça-feira, 2 de dezembro de 2008

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

BIOMBOS

Quem tenha acompanhado a comunicação social nos últimos dias não poderá deixar de se ter admirado com o número de “notícias” e de comentários sobre dois protagonistas improváveis da nossa vida colectiva, atendendo ao momento crítico que se vive: a presidente do PSD, Dra. Manuela Ferreira Leite e o Presidente da República, Prof. Cavaco Silva.

A Dra. Ferreira Leite sofreu ataques de todos os lados, quer tenha falado, quer tenha ficado calada, quer tenha falado sério, quer tenha ironizado.

A líder do PSD não pode propor descida de impostos para enfrentar a actual crise, no que está bem acompanhada pela Comissão Europeia e pelo ex-ministro das Finanças Campos e Cunha, porque o controle do défice é que é necessário.

Não pode colocar em causa as decisões sobre os grandes projectos sem garantir a sua sustentabilidade e papel efectivo na competitividade, no que é igualmente acompanhada pelo Prof. Campos e Cunha, porque esses projectos serão necessários para a recuperação da economia, o que está ainda por provar.

Não se pode queixar do tratamento da comunicação social às suas intervenções, porque é queixinhas e não pode pretender condicionar a comunicação social.

Se fossem precisos exemplos para demonstrar que tem razão nessa queixa, os últimos dias deram-lhe inteiramente razão. A Dra. Ferreira Leite propôs há quase dois meses uma alteração no pagamento do IVA para ajudar as pequenas e médias empresas, passando essa entrega ao Estado a efectuar-se aquando do pagamento e não no momento da emissão da factura. Aqui d’el rei, que a Dra. Ferreira Leite é incompetente e não percebe nada disso, porque as normas da União Europeia proibiriam essa alteração. Pois bem, a semana passada a Comissão Europeia veio informar que não tem nada contra essa alteração. O leitor encontrou alguma referência na comunicação social a essa posição e ao facto de ir de encontro ao proposto pela Dra. Ferreira Leite?

Quanto ao Presidente da República, assiste-se igualmente a uma barragem de ataques enviesados com base em financiamentos que a sua candidatura recebeu de forma totalmente legal e na situação de um Conselheiro de Estado que ele deveria demitir, o que até lhe está vedado pela lei.

Isto é, a gravíssima crise financeira que também já é económica e a aproximação de uma série de actos eleitorais, parecem levar à criação de criar biombos artificiais que escondam a realidade.

Mas a realidade surge de todo o lado.

Só nos últimos dias, para além da revisão sistemática e quase semanal das previsões económicas em baixa, foram conhecidos relatórios que reflectem a gravidade do que se passa.

Assim, de acordo com o Instituto Nacional de Estatística, o indicador de clima económico caiu em Novembro pelo sexto mês consecutivo, para o nível mais baixo desde 1989, com especial intensidade na indústria transformadora; por outro lado, o indicador de confiança dos consumidores baixou para o nível mais baixo desde 1986.

Por mais biombos que se coloquem, a verdade é que a realidade da crise se está a impor com tal força que já não pode ser escondida, sendo crucial juntar esforços para a enfrentar e não escamoteá-la.


Publicado no Diário de Coimbra em 1 de Dezembro de 2008


domingo, 30 de novembro de 2008

Sermão do Bom Ladrão

Neste "ano vieirino" não há como recordar alguns dos melhores sermões do P. António Vieira.
Peço desculpa por não começar pelo "sermão aos peixes", mas este é particularmente adequado ao presente e os "reis" de hoje fariam bem em conhecê-lo:

"Levarem os reis consigo ao Paraíso ladrões não só não é companhia indecente, mas ação tão gloriosa e verdadeiramente real, que com ela coroou e provou o mesmo Cristo a verdade do seu reinado, tanto que admitiu na cruz o título de rei. Mas o que vemos praticar em todos os reinos do mundo é tanto pelo contrário que, em vez de os reis levarem consigo os ladrões ao Paraíso, os ladrões são os que levam consigo os reis ao inferno."

FURACÃO

Ouvi hoje a Dra. Cândida Almeida, directora do DCIAP, dizer que a Polícia Judiciária foi afastada da investigação da Operação Furacão, sem indicar as razões.
Esta afirmação, embora tenha adiantado grandes elogios à PJ, permite todas as dúvidas sobre a actuação da PJ, o que só pode provocar a maior perplexidade e desconfiança.
Ficou criada mais uma situação insustentável na sociedade portuguesa, precisamente numa área que necessita de calma, sobriedade e confiança de todos: a Justiça.

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Recessão

Vem aí a recessão. Da estagnação (essa palavra proibida) vamos passar à recessão.
Pior ainda: pode vir o ar gelado da estagflação.

terça-feira, 25 de novembro de 2008

MONEY

A canção do momento


Botas feitas para caminhar

Para caminhar é preciso botas (ou sapatos).
Ou de como a Nancy Sinatra até tinha mais mensagem do que parecia.


FUGA PARA A FRENTE

O Conselheiro de Estado.

Numa situação com a delicadeza da que se atravessa com o BPN, a fotografia tem que ficar composta, de modo que a confiança pessoal é agora reiterada e daqui a uma semana ou coisa parecida perante novos desenvolvimentos que certamente não deixarão de surgir, o próprio pede a renúncia ou suspensão, para não colocar minimamente em causa o Presidente.
No meio de tudo isto há outra entidade que parece ter descoberto um estranho gosto por sofrer em silêncio, que é o PSD. As solidariedades são para se ter perante quem as merece e, nesse caso, afirmam-se claramente.
Um partido, ainda por cima a menos de um ano de eleições, não pode ter a sua actual postura. Das duas uma: se desconfia que o seu antigo dirigente tem algo a apontar, distancia-se e afirma-se claramente quanto à questão; caso contrário, corre o risco e atravessa-se em sua defesa. Em qualquer caso, tem é que levantar rapidamente a cabeça, porque os seus militantes não têm culpa nenhuma do que está a acontecer. Diria mesmo: e muito menos culpa têm os restantes portugueses que necessitam de sentir uma alternativa política como de pão para a boca.
Para facilitar a análise da situação, aqui ficam duas citações:

1:

Do Estatuto do Conselho de Estado:



Artigo 5.º
(Termo de funções)

1. Os membros do Conselho de Estado a que se referem as alíneas a) a e) do artigo 2.º mantêm-se em funções enquanto exercerem os respectivos cargos.

2. O exercício do cargo dos membros do Conselho de Estado a que se referem as alíneas g) e h) do artigo 2.º cessa com o mandato do Presidente da República que os tiver designado ou com o termo da legislatura da Assembleia da República que os houver eleito, mas mantêm-se em funções os membros cessantes até à posse dos que os substituírem nos respectivos cargos.

3. As funções de membro do Conselho de Estado cessam ainda por renúncia, morte ou impossibilidade física permanente, nos termos e condições previstos nos artigos seguintes.


Artigo 14.º
(Inviolabilidade)

1. Nenhum membro do Conselho de Estado pode ser detido ou preso sem autorização do Conselho, salvo por crime punível com pena maior e em flagrante delito.


2:

Da TSF em 25 de Nov. de 2008:

"O Presidente da República afirmou, esta terça-feira, que mantém a confiança em Dias Loureiro, antigo administrador da Sociedade Lusa de Negócios, que detinha o BPN. Cavaco Silva disse que o conselheiro de Estado lhe garantiu não ter cometido qualquer ilegalidade no BPN."





segunda-feira, 24 de novembro de 2008

A FALTA QUE A VERGONHA FAZ




No primeiro livro da Bíblia, é descrito como, depois de praticarem o acto proibido, Adão e Eva tiveram vergonha e se sentiram nus.
A vergonha é, assim, um dos mais antigos e eficazes processos que a sociedade tem para prevenir a prática de actos considerados errados e condenáveis.
Ao longo de milhares de anos, a moral foi definindo critérios para determinar o que é ou não aceitável, tendo-se desenvolvido um quadro ético de relacionamento entre os indivíduos, entre estes e a sociedade, e mesmo entre todos e o Universo que nos rodeia.
Em simultâneo, a civilização humana foi desenvolvendo códigos e leis que regulam as nossas relações sociais e económicas. É assim que quem não tem grande respeito pelos valores éticos, tem pelo menos medo da punição pelos actos ilegais que venha a praticar.
Mas a vergonha social esteve sempre presente, ao lado do medo da Justiça.
A sociedade de hoje está a mudar todo este quadro.
Como se sabe, quer se goste, quer não, as religiões foram desde sempre o maior fornecedor de critérios morais às sociedades. A racionalização da sociedade ocidental está a levar a um acantonamento das religiões por parte dos Estados, pretendendo-se regular por lei todo o tipo de relacionamento entre as pessoas. Tende-se, assim, a considerar que os valores éticos dizem apenas respeito àqueles que seguem as suas religiões, não tendo os outros nada a ver com isso.
A consequência é um relativismo crescente que leva a considerar toda e qualquer posição como respeitável, dentro das normais definidas pela lei.
Por outro lado, a ligeireza introduzida pelos novos estilos de vida e pela inundação de informação, trazida primeiro pela televisão e depois pela internet, potencia o afastamento do pensamento profundo, da seriedade e mesmo da responsabilidade.
Uma das consequências desta evolução é claramente o desaparecimento progressivo de um quadro genericamente aceite de referências éticas e, portanto, do próprio sentimento pessoal de vergonha.
O sucedido há poucos dias, aquando da condenação de uma presidente de Câmara por três actos ilícitos, é bem a prova do que acima fica dito.
A senhora, ao ser proferida a sentença, apresentou-se como uma vencedora, porque não foi para a cadeia. Para ela, o único problema era esse. Como a vergonha desapareceu por completo do quadro mental, o que resta é a sanção judicial: não havendo prisão, ainda que haja condenação, o sentimento pessoal é de vitória e é isso que é transmitido.
Pior ainda, o tratamento dado ao caso pela comunicação social vai no mesmo caminho.
Uma sociedade que promove o desaparecimento do sentimento da vergonha, substituindo-o pela fria decisão judicial, vai por maus caminhos e só pode esperar um mau fim.

Publicado no Diário de Coimbra em 24 de Novembro de 2008