Faz este mês duzentos anos que se travou a Batalha do Bussaco, um dos recontros militares essenciais para impedir que as tropas napoleónicas ocupassem Portugal. De facto, foi em 27 de Setembro de 1810 que as tropas francesas comandadas por Massena encontraram os exércitos português e inglês comandados por Wellington na Serra do Buçaco.
Era já a Terceira Invasão Francesa, depois das anteriores comandadas por Junot e Soult. Desta vez, no intuito de resolver as coisas em definitivo, Napoleão enviou como comandante o Marechal Massena, a quem Napoleão chamava o “filho favorito da vitória”. A derrota do exército francês no Buçaco, não tendo sido definitiva, atrasou a marcha para Lisboa permitindo melhorar a preparação da defesa da capital nas Linhas de Torres Vedras e quebrou o moral francês. Massena provou o sabor amargo da derrota, tendo perdido no Buçaco cerca de 4.500 soldados, entre os quais 5 generais.
As Invasões Francesas foram um período decisivo da nossa História, com repercussões que duraram muitos anos. A derrota dos franceses foi crucial para a continuação de Portugal como Nação. Recorde-se que pelo Tratado de Fontainebleau de 1807, na sequência do Bloqueio Continental, Portugal seria dividido em 3 reinos. A integração das invasões francesas na História Europeia é aliás fácil de perceber apenas pelas suas diferentes designações: para nós, foram as Invasões Francesas, para os ingleses foram a Guerra Peninsular e os franceses chamaram-lhe Guerra da Libertação!
A fuga da família Real para o Brasil no dia 29 de Novembro de 1808, um dia antes da chegada de Junot a Lisboa, viria a ter consequências históricas de grande importância. Desde logo, a saída do país de toda a família real, juntamente com grande parte da aristocracia, quebrou laços sociais e permitiu a expansão das novas ideias do liberalismo, quando o país se viu finalmente livre dos invasores franceses. Apesar da derrota dos franceses, parece hoje pacífico que o “antigo regime” acabou também nesta altura. Depois, criou as condições para que poucos anos depois o próprio D. Pedro IV desse o grito do Ipiranga que tradicionalmente é tido como o momento que marca a independência do Brasil.
Durante as Invasões Francesas, o território português foi varrido por numerosos exércitos. Lembra-se que nessa altura os exércitos invasores se alimentavam daquilo de que se apropriavam à sua passagem, deixando tudo destruído. Por outro lado, os defensores adoptavam políticas de terra queimada, para impedir os invasores de encontrarem víveres. Os próprios ingleses, nossos aliados, foram de extremo rigor nessa actuação, punindo muitas vezes com a morte quem não queimasse e destruísse todos os seus bens para que os franceses não se pudessem alimentar. Caso para dizer que para os desgraçados camponeses o remédio foi muitas vezes pior que a doença!
É sobejamente conhecido que os franceses pilharam tudo o que puderam durante as invasões. Desapareceram obras de Arte, mobiliário, peças de ouro e prata, ficando apenas as pedras nuas dos palácios e das igrejas. Os campos ficaram arrasados. Com a independência do Brasil, deixaram de vir as riquezas que costumavam vir. As chamadas “lutas liberais” que se seguiram impediram a recuperação económica do país depois das invasões francesas, tendo ainda contribuído para aumentar a pobreza nacional. A governação do resto do século XIX foi quase sempre uma desgraça. Portugal perdeu o comboio do desenvolvimento do resto da Europa que se verificou durante esse século, com tremendas consequências que entraram bem dentro do século XX.
O conhecimento mínimo da nossa História é uma condição para percebermos o que somos hoje. Relembrar momentos cruciais como foi a “Batalha do Bussaco” é de grande importância. No Convento de Santa Cruz do Buçaco onde Wellington pernoitou depois da Batalha, está neste momento uma colecção de excelentes fotografias de reconstruções históricas de batalhas das Invasões Francesas, da autoria do Coronel Ribeiro de Faria. Caro leitor, a mata do Buçaco pode não ter sido escolhida para ser uma das nossas dez melhores maravilhas naturais. Mas não é por isso que deixa de ser uma maravilha. Vá lá por estes dias e visite a exposição, que vale a pena.
Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 20 de Setembro de 2010