A resolução de
problemas financeiros pessoais ou empresariais tem um determinado tipo de
opções, desde que a honestidade, a ética e, mais prosaicamente a simples
decência, estejam bem arrumadas num qualquer local a recato de observações
incómodas. Tal como acontece com o próprio dinheiro arrecadado de uma forma
digamos, menos convencional.
Os chamados “Panama
papers” vieram avivar o interesse público pela utilização dos chamados
“offshores”, paraísos fiscais e zonas francas existentes um pouco por todo o
mundo e até mesmo, cá em Portugal. Curiosamente, a publicação a conta gotas
daqueles documentos, não veio trazer grandes surpresas no que diz respeito aos
portugueses envolvidos, que já estariam mesmo a ser objecto de investigações
por parte das nossas autoridades. Boa parte dos nomes incluídos seriam uma
surpresa mas ao contrário, isto é, se não estivessem na lista, quase como um
“noblesse oblige”. O mesmo não se dirá da inclusão de dirigentes chineses, a
começar pelo presidente, o seu irmão e vários outros altos cargos do partido
comunista chinês na lista dos detentores de empresas e contas bancárias
offshore, o que mostra bem que a ganância e a ética não têm cor política.
Nesta era em que,
pelos vistos, se dá tanto valor à amizade, os “Panama papers” vieram também
tornar pública a fortuna colocada em offshore de um grande violoncelista russo
que é um grande amigo de Vladimir Putin e é o feliz possuidor da singela maquia
de 2.000 milhões de dólares que o próprio também justificou como dádivas de
amigos e admiradores.
Lá está, costuma dizer-se que os amigos são para as
ocasiões e são tantas e tantas vezes a solução para problemas financeiros e não
só, que essa bela instituição da amizade se não existisse já há muito tempo,
teria que ser inventada de novo.
Claro que tudo o
que tenha a ver com bancos não tem, à partida, nada a ver com decência. Mas
resolver os problemas dos bancos portugueses que foram eles próprios a criá-los
com as suas escolhas empresariais ao longo dos anos através de um banco mau que
será com toda a certeza pago pelos contribuintes, é a prova disso mesmo. Quando
Portugal assinou em 2011 o famigerado “Protocolo de Entendimento” com a troika com
o empréstimo no valor de 78.000 milhões de euros visou apenas resolver os
problemas do Estado, deixando de lado o sistema bancário, que já na altura
necessitava de 30 a 40 mil milhões para se equilibrar.
A consequência foi os bancos,
um após o outro, serem objecto de resolução ou venda forçada ao primeiro que
aparecer, deixando de lado os “activos” mal parados para mais tarde resolver enviando
a conta aos cidadãos contribuintes. Alguém achará decente não deixar falir os
bancos, responsabilizando os donos/accionistas, protegendo-se apenas os
depositários até ao valor previsto na Lei? Porque já se sabe quem pagará a
conta dessa protecção e quem beneficia com isso.
E o que dizer de
altos responsáveis da Polícia Judiciária detidos por se terem deixado envolver
no tráfico da droga de cujo combate eram até há pouco tempo a cara? E dos
funcionários do Fisco que decidiram montar o seu próprio negociozinho privado
de venda de declarações falsas a empresários que delas precisavam? A boa
notícia é que as forças policiais funcionaram e não tiveram dúvidas em acabar
com o regabofe.
Tal como
anteriormente os responsáveis máximos dos serviços envolvidos na emissão de
Vistos Gold a estrangeiros foram detidos por suspeita de montarem o seu próprio
negócio co-lateral, envolvendo o próprio Ministro responsável por essa área
governativa.
Longe da decência
andará igualmente a proposta estapafúrdia de transformar as mulheres em mero
instrumento reprodutivo, através da proposta de aprovação das “barrigas de
aluguer”. Que diabo de direitos de terceiros podem justificar que as mulheres
possam ser legalmente reduzidas àquela condição?
Muitos milionários
colocam os seus haveres a bom recato de fiscos e outros olhares “incómodos”,
utilizando para isso os “offshores” que as autoridades deste mundo permitem e
até patrocinam. Mas tudo isto que vamos vendo e lendo por todo o lado mostra
que há algo que anda muito mais longe da vista e chama-se, apenas, decência.
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