Na semana passada teve início a
segunda ronda de negociações entre a Grã-Bretanha e a União Europeia para se
chegar a acordo quanto à saída daquele país da EU.
Recordo que já passou mais de um
ano sobre o referendo decidido pelo antigo primeiro-Ministro James Cameron, num
dos maiores disparates políticos das últimas décadas, cujo resultado inesperado
ditou a saída da Grã-Bretanha da União e naturalmente, o desaparecimento de
Cameron da cena política, tendo sido substituído por Theresa May à frente do
Governo de Sua Majestade. Também já decorreram quase quatro meses sobre o
momento em que a Grã-Bretanha invocou o Art. 50 do Tratado da União Europeia, a
partir do qual começou a contagem do prazo final para a saída, que terminará em
30 de Março de 2019. Claro que, para haver sucesso nestas negociações, terá que
estar muito pronto antes dessa data, prevendo-se que o acordo deva ser
concluído antes de Novembro de 2018 para que a economia possa continuar sem
percalços de maior lembrando-se, por exemplo, as necessárias preparações das
companhias de aviação, dos bancos, etc.
Tendo em conta tudo o que se
soube da primeira ronda das negociações entre as equipas da Grã-Bretanha
liderada por Davis Davis e da União Europeia chefiada por Michel Barnier, será
muito difícil que estes prazos se venham a cumprir. Pelo que transparece das
negociações e pelas declarações públicas, especialmente do lado de responsáveis
governativos da Grã-Bretanha, este país está muito mal preparado para as negociações,
por vezes mesmo de uma forma difícil de acreditar pela falta de
profissionalismo e desnorte de objectivos que revela, de que a fotografia da
reunião inaugural é um símbolo: do lado britânico da mesa, três negociadores com
sorrisos abertos e sem qualquer papel à frente e do lado comunitário três
negociadores com ar muito mais sério e com grossos dossiers contendo o trabalho
prévio sobre a mesa.
A Grã-Bretanha dá hoje em dia um
triste espectáculo sobre estas questões, mantendo ainda nesta altura discussões
políticas sobre o caminho a seguir nas negociações, isto é sobre “soft brexit”
ou sobre “hard brexit”, como se ainda tivesse tempo para isso. Parece até que
muitos políticos desejariam um segundo referendo sobre a saída, embora o povo
britânico, goste-se ou não, tenha já optado pelo divórcio com a União Europeia.
E o ambiente político britânico não poderia estar mais crispado. Há poucos dias
James Chapman, o chefe de gabinete do responsável britânico Davis Davis até se
demitir em Junho passado, veio mesmo afirmar publicamente que o Brexit é uma
catástrofe e que, caso houvesse uma efectiva lei eleitoral, os defensores do
Brexit com Boris Jonhson à cabeça deveriam estar presos atrás das grades por
todas as mentiras que disseram ao povo britânico levando-o a decidir
maioritariamente pelo Brexit no referendo de Junho de 2016.
O actual clima político surge
muito em consequência do resultado das eleições pedidas por Theresa May
realizadas em Junho passado e que, ao contrário da maioria absoluta que pretendia,
a colocaram nas mãos de pequenos partidos retirando-lhe margem de manobra
negocial e colocando mesmo em causa a aprovação parlamentar do acordo a que
chegar com a União Europeia quando e, fundamentalmente se, chegar o momento
para tal.
Theresa May bem pode ir dizendo
que não vai pagar a conta a apresentar pela União Europeia de cerca de 60
milhões de Libras pelos custos da saída britânica mas sabe que, mais milhão
menos milhão, vai ter de pagar sob condição de não ter acordo nenhum até à data
fixada, o que seria trágico para o seu país, mas não para a União Europeia.
E depois há o próprio significado
do resultado de referendo que basicamente significou o desejo dos britânicos
“recuperarem” o controlo das fronteiras, das leis e do dinheiro que limita
fortemente o poder negocial do lado britânico. De facto, querer manter as
prerrogativas actuais para os seus cidadãos e para as suas empresas na União
Europeia e regressar às fronteiras no sentido oposto não é de forma nenhuma
aceitável para cada um dos países membros da União Europeia. Seria, como nós
portugueses costumamos dizer, ter permanentemente a chuva no nabal e o sol na
eira, o que é evidentemente irreal.
É por isso que apesar de, entre a
situação actual e a saída pura e dura sem acordo, haver diversas opções, na
realidade o caminho para alcançar um acordo vantajoso para ambas as partes está
a tornar-se muito estreito, resultado das perplexidades britânicas e
consequentes dificuldades negociais. Até porque do lado comunitário a delegação
negocial tem um mandato muito claro definido pelos governos dos países membros
sobre os termos do Art. 50 do Tratado, concretamente sobre os direitos dos
cidadãos comunitários na Grã-Bretanha, sobre como não voltar a haver fronteira
entre as duas Irlandas e sobre a tal conta do divórcio. Não tendo isto
garantido, a equipa dirigida por Michel Barnier está impedida de avançar grande
coisa negociações e, dessa forma, quem fica a perder é quem quer sair até
porque o Art. 50 do Tratado é leonino nesse aspecto talvez porque, na
realidade, nunca ninguém pensou que algum dia viesse a ser invocado.
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