Na sequência dos esforços para trazer
investimento externo para Portugal do então Primeiro Ministro Cavaco Silva e do
seu Ministro da Indústria Mira Amaral, a fábrica Autoeuropa, então uma
joint-venture da VW e da FORD, entrou em funcionamento em Maio de 1995,
produzindo os modelos Sharan (VW) e Galaxy (Ford). Quatro anos depois, a
Autoeuropa já produzia meio milhão de veículos num só ano atingindo o milhão
poucos anos depois, em 2003.
Trata-se do maior investimento estrangeiro de
sempre, em Portugal. A fábrica, instalada em Palmela, ocupou uma área de cerca
de dois milhões de metros quadrados e o valor do investimento foi de 1.970
milhões de euros, incluindo o custo do desenvolvimento dos modelos monovolume
com que começou a laborar. A fábrica é uma das mais modernas da Europa, com
padrões ambientais e de segurança que respeitam as normas mais exigentes, tendo
quatro zonas principais: prensagem, construção de carroçarias, pintura e linha
de montagem. Junto da fábrica nasceu um parque industrial onde se instalaram
alguns dos seus fornecedores. A sua importância na economia nacional é enorme:
neste momento tem mais de 3.000 pessoas empregadas, assegura 10% das
exportações e representa, por si só, 1% do PIB nacional. Isto directamente, porque
a montante deu origem a muitas empresas que lhe fornecem materiais e
equipamentos; algumas dessas empresas começaram a produzir para a Autoeuropa,
especializaram-se, e hoje são elas próprias exportadoras.
Depois da Autoeuropa, Portugal nunca mais conseguiu
atrair algum investimento estrangeiro que se pudesse comparar a este. Hoje
temos consciência de que se aproveitou uma janela de oportunidade provavelmente
irrepetível. O momento da formação da “joint venture” entre a VW e a Ford para
a construção da Autoeuropa ocorreu em 1991, tendo a decisão sido tomada pouco
tempo antes.
O fim das ditaduras comunistas que se seguiu à
queda do muro de Berlim em Novembro de 1989 e a implosão da União Soviética em
Dezembro de 1991 veio alterar todo o quadro político europeu. A Alemanha
Oriental e a República Federal da Alemanha assinaram o “Tratado de
Reunificação” em 31 de Agosto de 1990 e a reunificação tornou-se oficial em 3
de Outubro desse ano. Os países que pertenciam ao Pacto de Varsóvia ficaram
livres para escolherem o seu destino e viraram-se para a União Europeia. O
centro da Europa deslocou-se irreversivelmente para Leste, a Alemanha, agora
reunificada, tornou-se maior, mais importante do ponto de vista económico e
reatou as históricas relações com os países vizinhos “do outro lado”. Em
consequência, Portugal ficou mais periférico, com menos capacidade para
competir economicamente com os parceiros da União, viu ruírem os seus sonhos de
crescimento económico através da industrialização e vira-se hoje para o turismo
como atividade económica relevante dentro das exportações, restando-nos a
Autoeuropa, em termos de indústria transformadora pesada.
Infelizmente, a Autoeuropa anda desde há meses
nas notícias por más razões. O que era uma boa notícia está a transformar-se
rapidamente numa bomba ao retardador que pode mesmo vir a acabar, a prazo, com
a Autoeuropa. Tendo a fábrica portuguesa conseguido ser a escolha da VW para o
fabrico de um novo modelo, o T-Roc, foi feito um investimento de quase 700
milhões de euros para instalação de uma nova multiplataforma multimodal. Mas a
paz sindical existente na Autoeuropa desde o seu início, com acordos alcançados
ao longo dos anos entre a Administração e a Comissão de Trabalhadores foi
quebrada. Assistiu-se mesmo a uma greve em Agosto deste ano e é patente uma
guerra sindical teleguiada pela Intersindical de recusa de novas condições
laborais perfeitamente legais que, segundo a Administração, são necessárias
para garantir a produção prevista do novo modelo. Nos últimos meses, vários
acordos conseguidos entre Administração e Comissão de Trabalhadores foram
rejeitados em plenários de trabalhadores, com orientação evidente dos
sindicatos/Intersindical que, até há pouco, nunca haviam conseguido destruir a
paz sindical de trinta anos da empresa.
A situação é grave e perigosa para os próprios
colaboradores da Autoeuropa e para o país. Sabe-se que o grande investimento
feito há pouco tempo na fábrica condiciona as alternativas da VW alemã, mas há
outras fábricas do grupo a quererem produzir o novo modelo e com capacidade de
o fazer a médio prazo. A deslocalização da produção dos modelos da Autoeuropa
para outro país seria uma tragédia económica que se repercutiria em cascata por
outros sectores da economia. Para além do sinal negativo que daria a possíveis
investidores internacionais. É por isso que a situação na Autoeuropa tem de ser
acompanhada com o máximo cuidado pelas autoridades nacionais. Até porque já
conhecemos o exemplo da saída da Opel do Carregado em 2006, alguns dos protagonistas
são os mesmos e já demonstraram não se preocupar minimamente com o
desenvolvimento económico do país.
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