segunda-feira, 4 de abril de 2022

E QUANTO À ECONOMIA?

 


Finalmente, dois meses depois das eleições de finais de Janeiro, tomou posse o Governo saído da nova Assembleia da República, o XXIII Governo Constitucional. Trata-se de um governo de maioria absoluta e não será pela memória do Governo de Sócrates com essa característica que as vantagens de poder aplicar por completo um programa sufragado pelo eleitorado saem diminuídas. Claro que um governo de maioria absoluta pode sempre cair na tentação do poder absoluto, mas em Democracia lá virão as eleições no fim do mandato parlamentar e aí o povo soberano salda as contas. Mas, «aqui que ninguém nos ouve», é de longe preferível para o país que o Governo não tenha que negociar com o PCP, o BE, ou com ambos.

Ao observar-se a composição e a estrutura do Governo saltam à vista alguns aspectos próprios e diferentes relativamente aos anteriores governos de António Costa. Claro que as circunstâncias nacionais decorrentes da crise económica provocada pela pandemia de que ainda não recuperámos totalmente, a que veio agora juntar-se o regresso da inflação, exigem nova abordagem da problemática governativa. Mas também e talvez sobretudo, a crise internacional e muito europeia causada pela invasão russa da Ucrânia, traz problemas muito sérios que estão aí para durar, independentemente do fim mais ou menos próximo do conflito militar.

Percebe-se assim que os Negócios Estrangeiros apareçam em terceiro lugar na estrutura governamental e a Defesa em quarto. Aproveito para referir que, embora seja novidade em Portugal, devemos encarar com a maior normalidade o facto de a Defesa ser entregue a uma mulher, o que não vejo como cumprimento de quotas de sexo, mas antes como reconhecimento de competência da pessoa escolhida, que é isso que nos deve verdadeiramente interessar como cidadãos. Claro que a entrega da parte da chamada resiliência da economia do PRR ao ministro com o segundo lugar, no caso a Ministra Mariana Vieira da Silva, é em si significativo, tal como o é, e muito, o facto de o Primeiro Ministro ter reservado para si a parte da digitalização do mesmo programa. Talvez ainda mais importante seja o facto de António Costa ter levado para o seu gabinete as relações com a União Europeia, o que é uma novidade absoluta. Pelo contrário, o facto de a Coesão Territorial ser relegada para o décimo sétimo lugar na estrutura do Governo é também significativo, mas pela negativa. A organização territorial, com a litoralização excessiva da população e principalmente da actividade económica produtiva, associada aos graves problemas demográficos, aconselharia um papel mais significativo na estrutura governativa, mas na realidade esta situação é apenas a continuação do que tem sucedido nas últimas décadas.

Mas verdadeiramente significativo, e a meu ver lamentável, é o lugar ocupado pela Economia, o nono lugar. Isto porque está à vista a evolução lamentável da economia portuguesa desde há pelo menos duas décadas, sem que se veja qualquer capacidade nem mesmo vontade de efectuar as tais reformas fundamentais que toda a gente sabe quais são, referidas pelo próprio Presidente da República na tomada de posse do Governo, mas detestadas por António Costa que já uma vez disse que fica com pele de galinha quando ouve falar delas. Recordo que o Eurostat informou na semana passada que «o PIB per capita português medido em paridades de poder de compra desceu para 74% da média europeia quando era de 79% em 2019 e mais de 80% em 2000». Temos andado, portanto, para trás e fomos agora ultrapassados pela Polónia e pela Hungria, o que deverá suceder a curto prazo também, incrivelmente direi, pela Roménia. O novo ministro responsável pela Economia é publicamente defensor de mais Estado na Economia o que, atendendo a que esse peso é já evidentemente excessivo, só pode ser um mau augúrio. E faz-nos recordar a célebre frase de Bill Clinton ao opor-se a George W. Bush: «it’s the economy, stupid»!

Quando um novo Governo toma posse, só podemos desejar-lhe os maiores sucessos, que serão também os do povo. Mas não podemos também deixar de ter em conta a realidade e de sermos exigentes e responsáveis na nossa cidadania, evidenciando o que achamos de errado na governação, independentemente de partidarites.

Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 4 de Abril de 2022

Sem comentários: