Enquanto o PS inicia um terceiro mandato governativo consecutivo, desta vez com maioria absoluta, o PSD afundou-se numa baixíssima representação parlamentar, preparando-se agora para finalmente iniciar uma nova orientação política com uma liderança também nova que, eventualmente, o possa recolocar numa posição de vir a discutir eleitoralmente uma vitória com o PS. Enquanto a política tem horror ao vazio, a Democracia exige que os cidadãos disponham permanentemente de respostas alternativas a quem governa, com capacidade de não só proporem programas diferentes, mas também de apresentarem pessoas que se perceba serem capazes de os concretizar. No panorama partidário português, só um partido surge ainda hoje com essa capacidade, o PSD, embora tenha notoriamente perdido grande parte da sua capacidade de intervenção política, para além da diminuição do peso político eleitoral e consequente enfraquecimento a nível de lugares eleitos, local e nacionalmente.
Será, portanto, a altura certa para se fazer uma análise das razões que levaram à actual situação. Percebe-se que os candidatos à liderança venham a apelar à unidade partidária, colocando uma pedra sobre o passado e assim tentando evitar fracturas eleitorais que lhes possam ser prejudiciais mas a mudança, qualquer mudança seja em que sector da actividade for, não se faz nunca sem uma avaliação do passado que explique o presente para construir um futuro diferente.
E também em política as árvores se conhecem pelos seus frutos. A passagem de Rui Rio pela presidência do PSD teve como resultado duas derrotas eleitorais em eleições legislativas o que traduz, certamente, o juízo que o eleitorado fez da sua acção política. O número de deputados do PSD na Assembleia da República quedou-se, em 2022, em apenas 77 enquanto o PS soma 120 deputados. Mas não só. À direita do espectro político existem hoje a Iniciativa Liberal com 8 deputados e o Chega com 12 deputados, enquanto o CDS não está representado com nenhum deputado. É esta a consequência política muito concreta da acção do PSD nos últimos anos, depois de ter assumido a governação do país entre 2011 e 2015 nas condições ditadas pelo programa de ajustamento financeiro, vulgo troika, a que o governo socialista de José Sócrates sujeitou o país com a sua governação.
Na realidade, Rui Rio fugiu sempre de assumir aquela governação do PSD, ajudando à construção da narrativa socialista de que a «austeridade» tinha sido uma escolha desse governo e não uma obrigação ditada pela situação de pré-bancarrota do país. Durante o seu mandato à frente do PSD defendeu sempre que o PSD seria um partido de centro-esquerda, não percebendo que esse é o espaço natural do PS, ainda que eventualmente vá buscar apoios à extrema-esquerda, quando disso necessita, para de seguida a deixar cair, como hoje se vê. Nem a História do PSD e das suas vitórias com maioria absoluta como aconteceu com a AD de Sá Carneiro e Cavaco Silva lhe fizeram, e aos seus apoiantes, perceber como foram conseguidas. Com Rui Rio, e durante os períodos de governação socialista, o PSD demitiu-se do seu papel de oposição activa escudando-se em afirmações de uma suposta defesa do interesse nacional, para apenas aparecer nas campanhas eleitorais, quando as escolhas estão basicamente definidas. Chegou-se ao ponto de aprovar uma ida do primeiro-Ministro à AR apenas uma vez em cada dois meses em vez de duas por mês, porque o Governo tem que trabalhar, imagine-se. Como se, em Democracia, o papel da oposição não fosse esse mesmo, fazer oposição e afirmar-se como alternativa durante todo o tempo e não apenas nas campanhas eleitorais. Bem podem vir agora argumentar com a passagem de votos da extrema-esquerda para o PS como justificação da maioria absoluta, que isso apenas mostra como o PSD não foi capaz de suscitar apoio eleitoral onde dizia que o ia obter. E do outro lado, contribuiu para a eliminação do CDS na AR, ao não aceitar coligação e deu ainda espaço para que a IL e o Chega tivessem as votações que se conhecem.
Diria que pior seria impossível. Pelo resultado da sua actuação Rui Rio ficará na História do PSD como um dos piores presidentes que teve, se não o pior. Já na História de Portugal nem esse rodapé terá. Quem lhe suceder será, naturalmente, de outra geração, com outras prioridades mais conformes quer com o eleitorado natural do PSD desprezado nos últimos anos, quer com um país que entretanto evoluiu e que necessita de novas respostas para os seus problemas, os de sempre e os novos que estão a surgir.
Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 18 de Abril 2022
Imagens retiradas da internet
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