Segundo os dicionários, a palavra «cidade» tem a sua origem no latim, vindo de «civitas» que significava «condição de cidadão» que era quem vivia em cidade, significando hoje muito mais do que isso, como sabemos.
Ao longo dos tempos as sociedades evoluíram e é hoje claro que as cidades são cada vez mais os locais de preferência da humanidade para viver. Segundo a OCDE, mais de metade da população mundial vive já hoje em cidades, prevendo-se que em 2030 essa percentagem seja de 60% e em 2050 de 70%. Estes números são impressionantes, indo já longe os tempos em que as cidades eram apenas pontos de segurança e de recolha e redistribuição dos bens agrícolas. Ainda segundo a OCDE os centros urbanos são hoje o motor do crescimento económico, contribuindo para cerca de 60% do PIB global.
O crescimento das cidades traz evidentemente novos problemas, principalmente num tempo em que a sustentabilidade passou a ser um factor crucial para a própria existência da Humanidade. As questões relacionadas com a escassez da água, com as necessidades de energia do actual modelo de desenvolvimento e com a mobilidade têm que ser vistas como desafios à imaginação e capacidade tecnológica dos nossos tempos e não meramente como algo negativo.
Também entre nós se verifica o fenómeno da deslocação das pessoas para as cidades, com uma influência cada vez maior das áreas metropolitanas de Lisboa e Porto, mas não só. No interior são as cidades médias que exercem um poder de atracção sobre os territórios vizinhos, como é o caso de Castelo Branco que como que suga a população dos municípios à sua volta. As cidades reflectem a evolução social. Por exemplo, em Coimbra, se a população aumentou cerca de 40% entre 1960 e os nossos dias, o número de famílias existente passou para quase o dobro, acompanhando o aumento de alojamentos; já o índice de envelhecimento calculado pelo número de idosos por cada cem jovens aumentou mais de seis vezes mas, claro, sem contar com os jovens que todos os anos procuram a Cidade para estudar aumentando em pelo menos um terço a população presente durante a maior parte do ano.
E é por estarmos tão habituados a ver as cidades como territórios de paz e progresso que se nos torna tão estranho que cidades, onde vivem milhares de pessoas de forma pacífica, possam ser objecto de violência militar como todos os dias podemos ver suceder nas cidades da Ucrânia, vítimas dos mísseis russos. Cidades esventradas, milhares de pessoas em fuga sem saber quando terão o azar de lhes entrar um míssil pela casa dentro e prédios inteiros que deixam de existir e passam a ser um buraco negro no meio dos sobreviventes. Claro que temos na memória as imagens de Londres e outras cidades inglesas a serem bombardeadas por aviões e pelas famosas V1 e V2 da Alemanha nazi, precursoras dos actuais mísseis, e da fuga das populações para os refúgios subterrâneos, mas não imaginaríamos poder assistir ao mesmo em nossas vidas: cidades e seus habitantes, homens, mulheres e crianças alvo de bombas assassinas de forma indiscriminada.
A cidade transforma-se no habitat natural da Humanidade, não só no aspecto físico ou geográfico. Entra também na nossa linguagem, ainda que não etimologicamente, mas de forma evidente. O leitor já reparou no número de palavras que contêm «cidade» como elemento morfológico? desde a publicidade à privacidade, da veracidade à capacidade ou da elasticidade à tenacidade, a cidade entra na nossa linguagem de forma quase permanente, o que é muito significativo dos tempos que vivemos.
Texto publicado originalmente no Dario de Coimbra em 17 de Outubro de 2022
Imagens recolhidas na internet
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