Embora este ano esteja tudo mais calmo porque o actual Governo se apoia numa maioria absoluta no Parlamento, nesta altura do ano é habitual assistir-se a acesas discussões políticas que têm como objecto a aprovação do Orçamento de Estado.
De que se trata? O Orçamento de Estado está previsto na nossa Constituição e é um documento crucial para a governação. Apesar de todos os procedimentos em contrário a que já vamos estando acostumados, como é o caso das cativações, trata-se fundamentalmente de se garantir transparência no que respeita aos impostos cobrados e à forma como são gastos os dinheiros públicos. O Orçamento de Estado, que inclui o orçamento da segurança social, é apresentado pelo Governo à Assembleia da República, assim se garantindo a participação directa dos representantes eleitos pelo povo e é constituído por três documentos: a Lei do Orçamento do Estado, o Relatório descritivo e os Mapas de previsões. Ainda de acordo com a Constituição, «o Orçamento prevê as receitas necessárias para cobrir as despesas, definindo a lei as regras da sua execução, as condições a que deverá obedecer o recurso ao crédito...». Resulta assim da lei que o Orçamento reflecte as prioridades políticas governamentais, sendo analisado e promulgado pelo Presidente da República após a aprovação pela Assembleia da República.
Estes os princípios legais que enformam a elaboração e aprovação do Orçamento de Estado, mas não se deve esquecer que, na sua base, estão prioridades e objectivos políticos, pelo que a discussão da sua substância é não só um direito de cidadania, mas também uma obrigação já que nos diz respeito a todos. Isto porque todos colaboramos para as suas receitas através do pagamento de impostos, além de sermos beneficiários de equipamentos e serviços públicos diversos incluídos nas despesas.
O Orçamento de Estado para 2023 prevê uma despesa de 113.233 milhões de euros. As prestações sociais são a maior fatia com 45.000 milhões, seguida das despesas com pessoal no montante de 27.212 milhões e outras despesas entre as quais 6.257 milhões de juros da dívida acumulada.
Para pagar esta despesa estão previstas receitas no montante de 111.027 milhões de euros de que sobressaem 92.500 milhões de euros de impostos e contribuições sociais para além de outras pequenas receitas diversas e muito aleatórias. O défice continua lá, no montante de 2.207 milhões, a cobrir com nova dívida.
Como suporte das previsões há aqueles pressupostos que, como nas letras pequeninas dos contratos, definem tudo o resto como por exemplo as taxas de juro e o valor da inflação que, se não se vierem a corresponder à realidade, alteram todos os valores dos quadros constantes dos Mapas de Previsão. Os governos podem aqui ser prudentes ou ambiciosos, caindo as consequências sobre a carteira e a vida dos cidadãos. É algo que os portugueses já aprenderam à sua custa por diversas vezes, através da necessidade de resgate externo como aconteceu em 2011.
Por outro lado, é frequente ouvir governantes referirem-se ao Orçamento como uma mera autorização para realizar despesas. Nada de mais errado, já que o Orçamento é um contrato com os portugueses mediante o qual o Governo se compromete a realizar o que lá fica plasmado, com a limitação de custos definida na despesa aprovada. Sendo assim, o recurso sistemático às cativações e a uma permanente execução orçamental deficitária no investimento público pode ser um instrumento financeiro, mas é uma falta de respeito pela lei e pela própria proposta aprovada pelos representantes do povo na Assembleia da República.
O nível de vida dos portugueses é muito influenciado pelos orçamentos de Estado e pela sua execução, ao longo dos anos. Infelizmente, os governantes caem frequentemente na armadilha de querer resolver todos os problemas dos portugueses com recurso ao Orçamento, mesmo aqueles que deveriam ser deixados à sociedade, aumentando desmesuradamente a despesa sem obter os resultados anunciados. É assim que a carga fiscal suportada pelos portugueses é uma canga que retira o dinheiro do investimento privado, tendo como consequências imediatas a falta de capital crónica da nossa economia e um produto muito baixo face às médias dos nossos parceiros comunitários. Mas também os políticos das oposições parecem não conhecer outras propostas para além das que aumentam a despesa, porque se convencem de que assim ganham os favores da população e os consequentes votos. Nada de mais errado, como penso que os próximos anos vão demonstrar.
Publicado originalmente no Diário de Coimbra em 14 de Novembro de 2022
Fotografias retiradas da internet
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